As decisões extemporâneas emanadas das “canetadas monocráticas”, de um Superministro do STF tem suscitado questionamentos por parte de juristas e especialistas na área do direito em todo o pais, dentre eles do bacharel em Direito pelo Centro Universitário do Distrito Federal e pesquisador nas áreas de Direito Penal, Processual Penal e Constitucional, Marcelo Carneiro Pereira .
Em um dos segmentos do seu texto opinativo publicado pela Revista Consultor Jurídico dessa quinta-feira(12), sobre a decretação da prisão preventiva do ex-comandante-geral do DF, Fábio Augusto Vieira, o eminente advogado faz crítica a decisão do magistrado conforme transcrição “ipsis litteris” abaixo:
"Ao
decretar a prisão preventiva do ex-comandante-geral, o ministro Alexandre de
Moraes enfatizou os requisitos indispensáveis à segregação cautelar — fumus
commissi delicti (indícios de autoria e materialidade) e periculum
libertatis (perigo da liberdade). Ao argumentar pela existência do fumus
commissi delicti, o ilustre ministro destacou a "aparente
conivência de parcela da corporação com os atos terroristas ocorridos,
inclusive com escolta dos criminosos” e a “previsibilidade da conduta dos
grupos criminosos e pela falta de segurança que possibilitou a invasão dos
prédios públicos".
No
tocante ao periculum libertatis, o ínclito julgador apontou que "a
manutenção do agente público no respectivo cargo poderia dificultar a colheita
de provas e obstruir a instrução criminal, direta ou indiretamente por meio da
destruição de provas e de intimidação a outros servidores públicos".
Inobstante
a argumentação despendida pela distinta autoridade, não estão suficientemente
preenchidos os requisitos autorizadores da prisão preventiva. Um dos motivos
ensejadores da prisão, mormente no aspecto do periculum libertatis, foi a
possibilidade de o ex-comandante da PM-DF "dificultar a colheita de provas
e obstruir a instrução criminal", tendo o julgador, portanto, frisado a
conveniência da instrução criminal como a premissa central para a restrição
cautelar da liberdade do investigado.
Sobrevém
que, com a intervenção federal na segurança pública do DF, o interventor
nomeado, Ricardo Capelli, anunciou no dia seguinte (9/1) aos ataques à
democracia a nomeação do coronel Klepter Rosa Gonçalves para o cargo de
comandante-geral da PM-DF, substituindo Fabio Augusto antes mesmo que o mandado
de prisão preventiva fosse cumprido — foi cumprido apenas em 10/1 — ou sequer
fosse de conhecimento público, visto que a requisição do Diretor-Geral da PF
tramitava em sigilo.
Aliás,
suficientemente seria a imposição de medidas cautelares diversas da prisão
previstas no artigo 319, do CPP, especialmente a prevista no inciso VI, que
viabiliza o afastamento do agente da função pública (determinação aplicada ao
governador do DF) e definitivamente restringiria a obstrução da instrução pelo
investigado ou ainda a reiteração dos crimes em apuração. Diante disso, de
plano, insubsiste um dos requisitos indispensáveis à decretação da segregação
cautelar, qual seja o periculum libertatis do acusado.
Quanto
ao fumus commissi delicti, segundo Aury Lopes Jr., a sua existência
pressupõe sinais externos, com suporte fático real, extraídos dos atos de
investigação levados a cabo, em que por meio de um raciocínio lógico, sério e
desapaixonado, permita deduzir com maior ou menor veemência a comissão de um
delito [6].
Nos
ensinamentos do premiado autor, é indispensável a persistência de um juízo de
probabilidade e não apenas de possibilidade. O juízo de probabilidade
reveste-se de um predomínio de razões positivas, de atributos da tipicidade,
ilicitude e culpabilidade, e do dolo, uma vez que a imputação de crime culposo
não é compatível com o cárcere processo-instrumental.
Todavia,
a decisão em comento não destaca com precisão o tipo penal incidido pelo
ex-comandante-geral (há menção abstrata aos artigos 2ª, 3º, 5º e 6º, da Lei nº
13.260 — Lei antiterrorismo; aos artigos 163 — dano, 288 — associação
criminosa, 359-L — abolição violenta do Estado Democrático de Direito e 359-M —
golpe de Estado, todos do CP) e nem especifica as condutas criminosas
incididas, mas apenas alerta para a sua potencialidade, evidenciando um
distanciamento do juízo de probabilidade e aproximando-se do de possibilidade.
No
decorrer da fundamentação, por algumas vezes, há menção de conivência da PM-DF
com os atos antidemocráticos, sendo citada a escolta da polícia aos criminosos
e a inércia quanto aos acampamentos instalados na frente do QG do Exército.
Acontece que a Polícia Militar é órgão executor de políticas, projetos e ações
atinentes à segurança pública propostos pela Secretaria de Estado de Segurança
Pública do DF.
Em
que pese a missão constitucional de preservação da ordem pública, a PM-DF é
órgão subordinado ao governador do Distrito Federal, não detendo autonomia
administrativa e gerencial. A coordenação e supervisão das ações da PM-DF é
exercida pelo governo do Distrito Federal, o qual organicamente se materializa
através da Secretaria de Segurança Pública.
De
outro modo, indispensável anotar a segurança proporcionada pela PM-DF para a
posse do presidente Lula, o esforço da PM-DF para desmobilizar o acampamento em
frente ao QG e o atrito com o Exército [7],
os registros da tentativa de contenção dos manifestantes por parte dos
policiais — com registro de feridos, inclusive o ex-comandante-geral [8] —
e, por fim, a efetiva prisão de mais de uma centena de criminosos na Praça dos
Três Poderes, mesmo diante de conflito com o Exército [9].
Aliás,
informações preliminares emitidas pelo próprio interventor nomeado para assumir
a segurança pública do DF durante o mês de janeiro dão conta de que a Secretaria
de Segurança Pública teve mudanças profundas no comando durante a última semana
e de que o então secretário de Segurança Pública, Anderson Torres, estava em
viagem pelos Estados Unidos, o que teria dificultado a coordenação dos órgãos
da pasta. O interventor defendeu veementemente que "o problema não
estava nos oficiais da Policia Militar e na corporação" [10].
A
governadora interina do Distrito Federal igualmente indicou uma falha dentro da
Secretaria de Segurança Pública, pois mudou o planejamento e sequer informou a
Casa Civil [11],
reforçando a ausência de elementos ínsitos à PM-DF que pudessem pressupor
omissão dolosa por parte do comandante da corporação à época.
O
instituto da prisão cautelar é demasiadamente excepcional e somente pode ser imposta
quando vislumbrado elementos mínimos de autoria e materialidade e o periculum
libertatis em concreto e não por conjecturas, nem mesmo a gravidade
abstrata [12],
o que não está claramente delineado no caso sub examine.
As
responsabilidades penais, civis e administrativas devem ser minunciosamente
apuradas a partir do procedimento adequado, contudo o recolhimento preventivo
não pode ser adotado como uma ferramenta genérica e desmedida do Judiciário
para a elucidação de crimes, sejam eles quais forem, sob pena de dar vida ao
conhecido dilema de "prender primeiro para depois apurar a presença de
conduta criminosa" [13].
A
privação da liberdade, ainda que aplicada provisoriamente, carrega consigo
inúmeras consequências, tanto de caráter social quanto de natureza processual.
Logo, para a sua adequada implementação, o magistrado deve equilibrar o impacto
da medida para o investigado com os elementos coligidos na investigação aptos à
sugerirem o cárcere antecipado.
Por
toda a explanação grafada alhures, a prisão preventiva do ex-comandante-geral
da PM-DF poderia ter sido postergada, ou substituída por medidas cautelares
diversas à prisão, até a elucidação mais objetiva das circunstâncias em que se
deram as investidas criminosas dos extremistas aos prédios públicos, com o
intuito de evitar uma prisão deficiente de indícios de autoria e materialidade.
Paralelamente, o decreto prisional teve a sua função de preservação da
instrução processual esvaziada pela troca política no comando-geral da
corporação, situação que poderia ter sido judicialmente imposta por medidas
diversas da prisão (artigo 319, VI, do CPP), em sintonia com o afastamento
determinado ao governador eleito do Distrito Federal." (Fonte).
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