Por: : Adriana Ferraz, Beatriz Bulla e Levy Teles/ Estadão
O
esvaziamento dos atos do 1.º de Maio, com a presença do presidente Jair
Bolsonaro e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), resultou
da falta de uma mensagem positiva para o eleitor, do desgaste da beligerância
na política e do desarranjo na organização, dizem especialistas ouvidos
pelo Estadão. As redes sociais refletiram também a baixa adesão nas ruas,
e os engajamentos no ambiente digital ficaram aquém dos registrados em outros
atos tanto à direita quanto à esquerda.
Os
discursos dos eventos se voltam mais para o passado do que para o futuro, disse
o cientista político Marco Antonio Teixeira. Bolsonaro, por exemplo,
endossou manifestações em Brasília e São Paulo contra ministros do Supremo
Tribunal Federal (STF) e em favor do deputado Daniel Silveira
(PTB-RJ), condenado pela Corte e perdoado pelo presidente. Lula fez discurso
focado em sua base mais fiel, a sindicalista.
“A
única possibilidade que vejo em levar ou manter o povo na rua é oferecer
esperança, possibilidades, sobretudo naquilo que é mais caro hoje para
sociedade hoje. De um lado, pensar no futuro, conter a precarização das
condições de vida, passando pelo emprego e controle de preços. Do outro, ter um
mínimo de civilidade. Talvez o que o povo queira é um pouco mais de respeito,
além de perspectiva de futuro”, disse Teixeira, que é professor do Departamento
de Gestão Pública da FGV-SP.
Para
ele, as retóricas dos líderes das pesquisas de intenção de voto na disputa pelo
Planalto neste ano sinalizam hoje para uma candidatura com seguidores fanáticos
e outra marcada por gafes quase cotidianas, em referência a Bolsonaro e Lula,
respectivamente. “E foi um domingo ensolarado, bonito e absolutamente
convidativo a qualquer tipo de manifestação cívica”, disse. De acordo com
Teixeira, ao menos desde 2013 as redes sociais conseguiram mobilizar as ruas,
mas agora as plataformas repercutem menos nas ruas e mais de forma endógena, ao
promover debate mais centrado nos internautas.
MOBILIZAÇÃO
Com
as ruas vazias, as redes também estiveram mais calmas. No YouTube, por
exemplo, o vídeo mais assistido do 7 de Setembro, quando Bolsonaro xingou
ministro do STF, foi uma cobertura geral que teve 3,5 milhões visualizações. A
publicação de 1º de Maio mais vista, também de desdobramentos do dia,
acumulou 1,4 milhão (40% do líder de visualizações do ato anterior).
Nas
redes sociais, de forma mais ampla, o 1º de Maio gerou menos de 30% de menções
do que o 7 de Setembro. Anteontem, 322 mil citações aos eventos foram
feitas ante os 1,18 milhão do Dia da Independência, segundo dados levantados
pelo Bites a pedido do Estadão. “É uma manifestação muito menos relevante, que
mostra muito menos poder nas ruas”, disse André Eler, diretor-adjunto do
Bites.
Leonardo
Nascimento, coordenador do Laboratório de Humanidades Digitais, da Universidade
Federal da Bahia (UFBA), que monitora articulações da extrema-direita no
Telegram, apontou que os atos revelam como há interdependência entre o mundo
real e o digital. De acordo com ele, houve uma maior movimentação nas
plataformas digitais nos dias antecedentes aos atos.
No
caso do Telegram, a maior troca de mensagens e de campanhas de
financiamento em favor dos atos pró-Bolsonaro se deram nos dias antecedentes ao
evento. Houve pedido de apoio para a mobilização de militantes em diferentes
regiões do País com ônibus fretados, mas, ainda assim, a mobilização foi
inexpressiva. “Há uma ação de muitas campanhas digitais porque eles querem
estar com campanhas na rua, e talvez não estejam conseguindo”, disse
Nascimento. “E, por não estarem conseguindo, estão investindo em algo mais
barato que são as plataformas digitais.”
ORGANIZAÇÃO
Petistas
próximos a Lula minimizaram o fato de o ato não agregar público significativo.
Primeiro, porque dizem que não era um evento sobre o ex-presidente, mas a
comemoração típica de 1.º de Maio. Com isso, afirmam que não é possível
mensurar o tamanho do apoio ao ex-presidente, uma vez que o evento foi
organizado pelas centrais sindicais. Também disseram que as pessoas perderam o
hábito de ir a atos políticos durante a pandemia. Nos últimos dois anos, o
evento das centrais foi online.
Segundo
fonte próxima a Lula, o ex-presidente já imaginava que não seria um evento
cheio, o que o levou a atrasar sua chegada. Sindicalistas presentes culparam
ainda o local escolhido, a Praça Charles Miller, na frente do Estádio
do Pacaembu. O local não tem estação de metrô nem trem próximas, disseram.
Aliados do presidente Jair Bolsonaro, mesmo diante da baixa adesão nos eventos em Brasília e São Paulo, procuraram manter o discurso otimista. Para o deputado federal Pastor Marco Feliciano (PL-SP), as ruas mostram que o presidente está, “de fato, na frente na corrida presidencial”.
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