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Famílias que têm dependentes com TEA (Transtorno do Espectro Autista)
têm conseguido na Justiça o direito de sacar o saldo do FGTS (Fundo de Garantia
do Tempo de Serviço). O transtorno não está entre as hipóteses previstas na lei
que autorizam o trabalhador a usar o fundo, mas os tribunais entendem que é
possível retirar o dinheiro para ajudar nas despesas para cobrir o
acompanhamento profissional.
No
início de março, o TRF-3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região), que atende
São Paulo e Mato Grosso do Sul, confirmou uma sentença neste sentido. A decisão
foi unânime e determinou que a Caixa Econômica Federal, gestora do FGTS,
liberasse o saque para o pai de um menino autista.
Quando
entrou com a ação, em 2019, o trabalhador tinha R$ 119 mil no FGTS, somando
depósitos de quatro empregos desde 2011. Ele alegou que precisava do dinheiro
para pagar um tratamento multidisciplinar para o filho, diagnosticado com TEA
quando tinha dois anos.
Como
de praxe nestes casos, o pedido de saque do FGTS foi negado pela Caixa. Tanto
nos requerimentos administrativos quanto nos processos judiciais, o banco alega
que não pode liberar a movimentação do saldo fora das hipóteses listadas na
legislação federal.
Embora
o dinheiro pertença ao trabalhador, a lei permite o acesso ao fundo em casos
específicos. Além de demissão sem justa causa e compra da casa própria, há
situações relacionadas à saúde do trabalhador ou do dependente. Entre elas
estão os portadores de HIV, pessoas com câncer ou com doença grave em estágio
terminal.
A
rigor, o autismo não se enquadra em nenhum caso.
Na
ação judicial que chegou ao TRF-3, o trabalhador trouxe laudos médicos que
comprovam o diagnóstico de TEA e a necessidade de acompanhamento especializado
para a criança.
Em
primeira e segunda instâncias, a Justiça Federal entendeu que o trabalhador
tinha o direito de sacar o FGTS, citando outros precedentes do próprio TRF-3
relacionados a casos de autismo. Cabe recurso.
A
defensora pública federal Luísa Ayumi afirma que o ideal seria uma mudança na
lei ou uma decisão judicial em ação coletiva que determinasse a autorização do
uso do FGTS a todas as famílias com dependente autista. Enquanto isso não
acontece, a Caixa é obrigada a negar os pedidos, com base na interpretação
literal da legislação.
"A
Caixa consegue liberar administrativamente apenas nas hipóteses previstas na
lei. Em outros casos, não previstos expressamente, a solução é entrar com ação
judicial, para buscar uma interpretação de acordo com os fins sociais do
programa", diz Ayumi.
O
entendimento do TRF-3 não está isolado. Todos os cinco tribunais regionais
federais têm decisões autorizando o saque do FGTS para famílias com dependente
autista. O STJ (Superior Tribunal de Justiça), responsável por uniformizar a
jurisprudência federal, não tem julgamento específico sobre casos envolvendo
FGTS para dependente autista, mas já decidiu que a lista de doenças trazida na
lei é apenas exemplificativa —e, portanto, admite situações não descritas.
O
coordenador de sistema Ricardo Rockenbach Nascimento, 40, entrou com uma ação
na Justiça Federal do Paraná em maio de 2020 para pedir o acesso a R$ 99 mil
que ele tinha no FGTS à época. Ele é pai de Felipe, que hoje tem 4 anos,
diagnosticado com TEA aos 2.
Por
meio de laudo médico, Ricardo comprovou que o filho tem autismo de intensidade
nível dois (existem três níveis, que avançam conforme a gravidade dos sintomas)
e precisa de tratamento contínuo por tempo indeterminado. Mais tarde, Maria
Clara, gêmea de Felipe, receberia diagnóstico de autismo nível 1.
O
processo demorou oito meses até que a a juíza condenasse a Caixa, mas o
dinheiro só foi liberado após o tribunal confirmar a sentença, três meses
depois.
Carina
Nascimento, 39, mãe dos gêmeos, diz que só o tratamento de Felipe inclui
sessões de psicoterapia, fonoaudiologia e terapia ocupacional que custam, ao
todo, R$ 1.200 por semana. Somam-se outros gastos, como brinquedos pedagógicos
especializados, necessários para estimular as crianças em casa, e medicamentos.
"Os
pais de autistas não deveriam ter que ficar explicando por que precisam [do
FGTS]. É um dinheiro nosso de direito e que nos ajudou muito", diz Carina.
O casal enfrenta agora outra disputa judicial, desta vez contra o plano de
saúde, para cobrar o reembolso das despesas com o tratamento dos gêmeos em
Guaratuba (PR), onde moram.
COMO
ENTRAR COM AÇÃO PARA PEDIR A LIBERAÇÃO DO FGTS
Ações
para pedir a liberação do saque do Fundo de Garantia são de competência da
Justiça Federal.
A
DPU (Defensora Pública da União) atende gratuitamente famílias com renda mensal
de até R$ 2.000 ou que comprovem a incapacidade de pagar um advogado. Confira
neste link os pontos de atendimento e contatos da DPU.
Se
o valor total pedido na ação for de até 60 salários mínimos (R$ 72.720), é
possível entrar com o pedido diretamente no Juizado Especial Federal, sem a
necessidade de advogado. Acima desse valor, é preciso entrar em uma vara da
Justiça Federal, sempre com advogado.
Priscila
Zangiácomo, especialista em relações trabalhistas e sindicais, diz que não é
recomendado fazer o pedido judicial sem a orientação de advogado, devido a
particularidade e complexidade do procedimento.
Segundo a advogada, são necessários os seguintes documentos para entrar com a ação:
-
Documento de identidade (RG ou CNH, incluindo CPF)
-
Carteira de trabalho (pode ser a versão digital)
-
Comprovante de residência atualizado (ideal que seja de, no máximo, três meses)
-
Extrato do FGTS (que pode ser obtido no site da Caixa ou no aplicativo FGTS)
-
Cópia dos exames médicos, laudos ou dados clínicos que tenham sido informados
no formulário "Relatório Médico de Doenças Graves para Solicitação de
Saque do FGTS"
VEJA AS
DOENÇAS QUE GARANTEM A LIBERAÇÃO DO FGTS:
-
Alienação mental
-
Cardiopatia grave
-
Cegueira
-
Contaminação por radiação, com base em conclusão da medicina especializada
- Doença
de Parkinson
-
Espondiloartrose anquilosante (espondilite anquilosante/ancilosante)
- Estado
avançado da Doença de Paget (osteíte deformante)
-
Hanseníase
-
Hepatopatia grave
-
Nefropatia grave
-
Paralisia irreversível e incapacitante
-
Tuberculose ativa
-
HIV/Aids
- Câncer
- Doença
em estágio terminal
Com informações do FolhaPress
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