O
segundo turno das eleições presidenciais na França, marcado para o próximo dia
24 de abril, se desenha como uma espécie de reprise do pleito de 2017, quando
Emmanuel Macron bateu a candidata da direita radical Marine Le Pen.
Desta
vez, contudo, a vitória de Macron não parece que virá tão fácil.
As
projeções para os resultados do primeiro turno, que aconteceu no último domingo
(10/4), mostram como o voto útil reescreveu o mapa eleitoral.
Os
eleitores se reuniram em três grandes campos: Macron, a direita radical e a
esquerda radical. Nos últimos dias de campanha, muitas pessoas que estavam
considerando outros candidatos decidiram apoiar um dos favoritos.
Houve,
assim, uma grande transferência de votos de Éric Zemmour - da direita radical
nacionalista - para Marine Le Pen. É possível que alguns dos eleitores
conservadores do Partido Republicano conservador tenham feito o mesmo.
À
esquerda, muitos dos eleitores se convenceram de que nem a socialista Anne
Hidalgo nem o ecologista Yannick Jadot poderiam chegar ao segundo turno.
Resolveram, então, dar o voto a Jean-Luc Mélenchon, ainda que não fosse seu
candidato favorito, na tentativa de manter um nome da esquerda na disputa.
Entre
os eleitores de centro, muitos franceses que em outras condições teriam
escolhido Valérie Pécresse, de Os Republicanos, resolveram dar voto ao atual presidente.
Por quê? Porque estavam genuinamente com medo de que Le Pen e/ou Mélenchon
ganhassem muita força nas urnas.
Lembrem-se
de que, no sistema eleitoral da França, apenas os dois primeiros colocados no
primeiro turno se qualificam para o segundo, e uma pequena margem pode fazer
grande diferença. A perspectiva de um segundo turno entre Le Pen e Mélenchon
não era totalmente impossível.
O
resultado das urnas significa duas coisas.
Uma
delas é a devastação total enfrentada pelos dois partidos tradicionais que
vinham se revezando no governo francês desde 1958 - a direita conservadora e a
esquerda socialista. Este foi um processo iniciado por Macron há cinco anos,
mas que agora se viu totalmente concluído.
Os
candidatos de ambos os partidos - e certamente Anne Hidalgo dos socialistas -
podem inclusive não ter atingido o limite mínimo de 5% que qualifica um partido
para pedir reembolso dos custos da campanha. O valor será alto, de milhões de
euros, mas pior é a humilhação pública. Podemos esperar sérios conflitos
internos nas siglas.
Macron
operou de tal forma que a divisão na política francesa é agora definitivamente
a que ele buscava: entre seu próprio "centrismo realista" e
"abertura ao mundo" e o "extremismo" de seus oponentes. O
"extremismo nacionalista" de Le Pen e o "extremismo
utópico" de Mélenchon.
Essa
divisão o havia beneficiado até agora, permitindo-lhe agregar as chamadas
forças "responsáveis" da esquerda e da direita, esmagando a oposição.
A
segunda lição deste primeiro turno, entretanto, deve ser-lhe motivo de
preocupação.
É
que as chamadas forças "irresponsáveis" dos extremos - sua oposição -
estão cada vez mais fortes.
Como
o comentarista político veterano Alain Duhamel disse na noite de domingo,
"os partidos anti-sistema agora têm a lealdade da maioria dos
franceses".
Se
você adicionar o voto de Marine Le Pen ao de Éric Zemmour e de Nicolas
Dupont-Aignan, também da direita radical, verá que esse polo recebeu 33% dos
votos - sete pontos percentuais a mais do que em 2017.
Se
somarmos os votos da esquerda radical - para Mélenchon e para os trotskistas
Philippe Poutou e Nathalie Arthaud - ao total de votos dados a todos os
"partidos anti-sistema", esse número supera 50% dos votos válidos.
Muitas
dessas pessoas acabarão votando em Macron no segundo turno, pela mesma razão
que o fizeram em 2017 - porque, para eles, ver a direita radical no poder é
inconcebível. Haverá outros, porém, que deverão se abster, votar em branco ou
em Le Pen.
A
verdade é que o voto anti-Le Pen e o voto anti-Macron estão convergindo; o
primeiro diminuindo e o segundo, crescendo.
É por isso que, desta vez, o segundo turno não deve trazer a mesma vitória confortável para Macron.
Com informações da BBC News
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