Se
confirmar a pré-candidatura a deputado federal, Sergio Moro (União) pode
ameaçar em São Paulo a eleição de pré-candidatos alinhados ao discurso
lava-jatista e anticorrupção do ex-juiz.
Moro
caminha para uma pré-candidatura à Câmara dos Deputados, após ter sido barrado
pelo partido de Luciano Bivar (PE) na disputa pelo Palácio do Planalto. O
próprio Bivar foi lançado como nome da legenda à Presidência e tenta compor
chapa com a senadora Simone Tebet (MDB).
Além
disso, a União Brasil estuda lançar para o Senado o nome do presidente da
Câmara Municipal de São Paulo, Milton Leite. Com isso, restaria a Moro
concorrer a uma vaga como deputado federal, como a legenda deixou claro desde
que o ex-ministro migrou do Podemos no fim de março.
Na
União Brasil (resultado da fusão de PSL e DEM), Moro é visto com potencial para
ser um dos mais votados em São Paulo, ao lado do deputado Eduardo Bolsonaro
(PL-SP) e de Guilherme Boulos (PSOL), coordenador do MTST (Movimento dos
Trabalhadores Sem Teto).
Internamente,
o partido calcula que o ex-juiz tem potencial para puxar em torno de cinco
deputados. Sem Moro, a União faria de 10 a 12 deputados em São Paulo. Com o
ex-juiz, chegaria a 17.
A
legenda quer que sejam beneficiados os candidatos de meio de chapa --aqueles
que receberiam entre 60 mil e 70 mil votos, abaixo do quociente eleitoral do
estado, que deve ser de 270 mil a 300 mil.
Os
chamados puxadores de voto ajudam na eleição de colegas de partido porque, no
atual sistema, a distribuição das 513 cadeiras de deputado federal não se dá
simplesmente seguindo a lista dos mais votados. É levado em conta o total de
votos dados a todos os candidatos do partido.
Ou
seja, legendas que reúnam muitos candidatos bem votados, ou puxadores de voto,
tendem a eleger mais parlamentares, mesmo que alguns deles tenham recebido
menos votos do que concorrentes de outras siglas que, no conjunto de seus
candidatos, tenham obtido menos votos.
Ao
mesmo tempo em que ajudaria a aumentar a bancada da União Brasil, a pré-candidatura
de Moro a deputado federal poderia impactar votações de colegas de partido e de
adversários em outras legendas que compartilham o mesmo discurso anticorrupção
e em defesa da Operação Lava Jato.
Dentro
da União, um nome que poderia ser afetado é o do deputado Kim Kataguiri. Em
2018, ele foi o quarto mais votado no estado, com 465.310 votos. A perspectiva
é que parte desses eleitores migre para o ex-juiz, mas sem comprometer a
reeleição do congressista.
Kataguiri
é um dos nomes que o partido considera "eleitos" e que não
precisariam do efeito puxador de votos. Isso porque ele mantém uma base sólida
de apoiadores do MBL, movimento do qual foi um dos fundadores.
Na
avaliação de parlamentares ouvidos pela reportagem, haveria impacto também em
candidaturas que carregam a bandeira anticorrupção, como a de deputados do
Novo, por exemplo. Em 2018, o parlamentar do partido que recebeu mais votos foi
Vinicius Poit, com 207.118. Atualmente, ele é pré-candidato ao Governo de São
Paulo e aparece com 2% na última pesquisa Datafolha.
Os
outros dois deputados do partido, Adriana Ventura e Alexis Fonteyne, tiveram
votação bem menos expressiva --64.341 e 45.298, respectivamente.
Parlamentares
com discurso pró-Lava Jato também poderiam ter parte dos votos transferida ao
ex-juiz.
Seria
o caso do deputado Alex Manente (Cidadania), que recebeu 127.366 em 2018. Em
discurso em junho do ano passado na Câmara, o congressista qualificou Moro de
"juiz fundamental para o Brasil para que tivéssemos um marco no combate à
corrupção e à impunidade" e fez elogios à operação.
Eleita
com 1.078.666 votos, a deputada Joice Hasselmann (PSDB) também seria afetada
pela eventual entrada de Moro na disputa. A parlamentar, que já foi líder do
governo no Congresso, perdeu parte de seu eleitorado após o racha no PSL que
opôs aliados do presidente Luciano Bivar e bolsonaristas --ela ficou ao lado
bivarista.
Defensora
da Lava Jato, a deputada já declarou na tribuna respeitar a operação. "E
quero que muitas outras Lava Jatos ocorram neste país", disse em discurso
feito em julho de 2020.
"Quero
deixar aqui o meu relato de profundo respeito ao nosso eterno juiz da Lava
Jato, o Sergio Moro, ao nosso procurador Deltan Dallagnol [pré-candidato a
deputado pelo Podemos] e a todos os outros procuradores e juízes que fizeram
parte dessa operação."
A
participação de Moro também poderia prejudicar candidaturas de bolsonaristas
que tiveram votação menos expressiva em 2018 --alguns inclusive permaneceram no
União, como Guiga Peixoto.
Reservadamente,
alguns congressistas ouvidos pela reportagem levantam dúvidas sobre a
possibilidade de Moro concordar em sair candidato a deputado federal. O ex-juiz
dá sinalizações de que não desistiu da Presidência, enquanto seus aliados
continuam montando uma agenda nacional para preservar seu status de
presidenciável.
"A
possibilidade [de ser deputado] existe se a gente convencê-lo. Mas não é o
desejo dele. Eu tenho trabalhado no partido para que o Moro fique com toda
estratégia, estrutura, e a gente vai fazer agendas grandes com ele agora, por
todo o território nacional, para que ele tenha o status de presidenciável
sempre preservado", afirma o deputado Junior Bozzella (União Brasil-SP).
"Porque
se amanhã ele sair a qualquer candidatura que não a de presidente, ele seja
realmente um excelente puxador de voto, seja no Senado, com o Rodrigo [Garcia],
para servir ao palanque do Bivar, seja para ser um candidato a governador, seja
para ser um deputado federal com 3 milhões de votos", acrescentou.
"Mas
o Moro considera também não ser candidato a nada e apoiar o projeto do
Bivar", diz.
Após
retornar de uma temporada nos Estados Unidos, Sergio Moro se filiou ao Podemos
em novembro do ano passado, com a intenção de disputar a presidência da
República. A permanência no partido, no entanto, durou pouco.
O
ex-juiz decidiu migrar para a União Brasil, às vésperas do fechamento da janela
partidária, que foi o período de um mês em que os parlamentares puderam trocar
de legenda sem risco de perder o mandato por infidelidade.
Na
ocasião, disse que abria mão momentaneamente de se lançar candidato ao
Planalto, mas pouco depois começou a articular novamente em favor de seu nome,
desagradando caciques do partido. A cúpula da União Brasil então decidiu lançar
Bivar, movimento que pode enterrar de vez o pleito do ex-juiz.
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