Da Redação
A morte ou a morte!
Um marco na história mundial foi o ataque às torres gêmeas, ocorrido no dia 11 de setembro de 2001. Esse dia fatídico vitimou quase 3.000 cidadãos, entre eles bombeiros que realizaram o combate às chamas. Eles salvaram inúmeras vidas em Nova York. Foram 343 bombeiros mortos.
Apesar de já ter passado 20 anos, até os dias atuais pessoas morrem em virtude da inalação da fumaça tóxica que pairava no local. Estima-se que cerca de 200 bombeiros morreram nos anos posteriores ao ataque.
"Era
um dia qualquer em Nova York", começa Richard Drew, hoje com 74 anos.
Fotógrafo
desde os 19 anos, o experiente Drew, então com 54 anos, havia acabado de cobrir
o torneio de tênis US Open, no bairro do Queens, em Nova York. Naquela
terça-feira, 11 de setembro, ele cobriria a Semana de Moda de Nova York - mais
especificamente, o primeiro desfile de moda de maternidade, com modelos
grávidas de verdade. Drew acompanhou o desfile no Bryant Park, bem no centro de
Manhattan, ao lado de um cinegrafista da CNN.
Enquanto
conversavam, o câmera da CNN colocou a mão no ponto eletrônico que estava em
seu ouvido. "Houve uma explosão no World Trade Center", ele disse. E
então: "Um avião atingiu o World Trade Center."
Na
mesma hora, o celular de Drew tocou. Era seu editor mandando ele correr para o
local. Drew pegou sua câmera e saiu correndo para a Times Square. De lá, tomou
o metrô em direção às Torres Gêmeas.
Quando
emergiu das escadas sob o solo, viu uma imagem inesquecível: as duas torres
destruídas, pegando fogo. Começou a fotografar as pessoas chocadas com o caos
ao redor, o FBI já nas ruas isolando a área, os sedimentos na rua.
"Então
percebi que a fumaça estava soprando do oeste para leste, e dei a volta para
evitá-la. Fiquei ao lado das ambulâncias, entre uma socorrista e um
policial", conta.
A
socorrista foi a primeira a se dar conta. Apontando para cima, gritou:
"Meu deus, tem pessoas caindo do prédio!", lembra Drew.
O
fotógrafo apontou sua câmera. "Tirei o máximo de fotos que pude das
pessoas caindo do edifício", diz ele à BBC News Brasil.
"Eu
não sei se estavam pulando por escolha própria ou se foram forçados a pular
pelo fogo ou pela fumaça. Não sei por que fizeram o que fizeram. Só sei que eu
tinha de registrar aquilo."
O
serviço forense de Nova York declarou depois que as pessoas que pularam dos
edifícios não poderiam ser chamadas de "suicidas" porque elas foram
forçadas para fora do prédio pela fumaça, fogo ou explosões. A causa da morte
de todos os que perderam a vida com a queda das Torres Gêmeas, atacadas pela
Al-Qaeda naquele dia, foi classificada como "homicídio" nas certidões
de óbito.
Em
uma reportagem de 2002, o jornal USA Today calculou, por meio de fotos, vídeos
e entrevistas, que 200 pessoas morreram desta maneira na tragédia do 11 de
setembro. Pelas fotos, o jornal The New York Times estimou 50 pessoas.
Segundo
relatos de sobreviventes, ter visto pessoas saltando do prédio ao lado pode ter
salvado a vida de centenas de pessoas que, ao ver o tamanho do desastre,
correram para evacuar seu local de trabalho. Ao deixar os prédios, elas também
viam corpos nas áreas ao redor das torres.
Enquanto
fotografava, Drew experimentava algo sinistro: ele ouvia o barulho dos corpos
atingindo o chão. "Alguns dizem que fui frio. Não é isso. Sou um
jornalista treinado. Você mergulha no momento e só fotografa o que está
acontecendo, em piloto automático", diz.
"Quando
alguém começava a cair, eu mirava com meu visor. Como eu estava trabalhando com
uma câmera digital, ao segurar o dedo no botão da câmera, ela tirava uma série
de fotos. E, assim, eu ia seguindo as pessoas que iam caindo do prédio."
Às 9:41, ele registrou para sempre os últimos momentos daquele homem.
Quando
Drew voltou para a Redação e foi verificar suas fotos, ele soube
instantaneamente que aquela era a mais forte delas. "Ele estava na
vertical, com a cabeça para baixo, entre as duas torres. Tinha uma simetria
ali. Mas ele só ficou assim durante um instante. Fosse outro momento, ele
estaria em outra posição", diz.
"Muita
gente não gosta de ver essa foto. Acho que as pessoas se identificam, e têm
medo de ter de enfrentar a mesma decisão que ele algum dia."
Para
ele, a imagem é representativa do que aconteceu naquele dia - "é uma das
poucas que de fato mostram alguém morrendo no ataque mais grave que já sofremos
nos EUA", diz. Apesar de ser uma foto sobre a morte, avalia Drew, ela é
uma foto "silenciosa". "Não é como outras fotos violentas de
mortes que ocorreram em guerras."
Quando
voltou para a casa naquela noite, Drew e um colega que não havia conseguido
voltar para a sua casa sentaram e conversaram sobre tudo, menos sobre o que
haviam visto naquele dia. Sua esposa conta, diz Drew, que ele se levantou de
madrugada querendo aspirar a casa toda. "O estresse pós-traumático vem
depois", comenta ele. "Falar sobre o que aconteceu ajuda. Aquele foi
um momento da minha história, assim como foi um momento da história."
Outro
momento da história e de sua história: quando tinha 21 anos e morava em Los
Angeles, em 1968, Drew foi um dos quatro fotógrafos presentes em outro momento
histórico - a morte do senador Bobby Kennedy, irmão do ex-presidente John F
Kennedy.
"Eu
estava no palco atrás dele para fotografá-lo quando ele estava discursando.
Fiquei com sede e fui para a cozinha tomar água", conta Drew. "Ele
saiu pela cozinha, então eu o segui. Quando ele foi atingido, eu subi numa mesa
perto dele e o fotografei no chão."
"Eu
só estava fazendo meu trabalho, assim como só estava fazendo meu trabalho anos
depois, no 11 de setembro."
Quem
é esse homem?
O
fotógrafo do "O Homem Caindo" diz já ter refletido um pouco sobre
quem era o homem que registrou pulando de uma das torres gêmeas, mas nunca
"tão a fundo".
"Ele
foi uma entre as quase 3 mil pessoas que morreram naquele dia. Eu não sei seu
nome, nem sei sobre a decisão que ele teve de tomar. Sei que ele caiu de um
prédio e eu estava lá para capturar aquele momento."
Mas
o mistério ao redor de sua identidade inquietou outras pessoas.
Uma
delas, o jornalista americano Tom Junod. Dois anos depois do 11 de setembro,
Junod escreveu uma reportagem de capa para a revista "Esquire"
cunhando o nome "The Falling Man" para a foto e tentando identificar
o homem na imagem.
Junod
chegou a dois nomes: Norberto Hernandez, um chef do restaurante Windows on the
World, que ficava no 106o andar da Torre Norte. Mas os familiares de Hernandez
disseram que não poderia ser ele por causa das roupas que ele estava usando.
O
segundo homem era Jonathan Briley, um engenheiro de som de 43 anos que também
trabalhava no restaurante. Os irmãos de Briley disseram pensar que, de acordo
com as roupas e o corpo do homem, poderia ser ele na foto. É possível que seja
ele - mas não há como ter certeza.
Em
2006, o diretor americano Henry Singer fez um documentário baseado na
reportagem de Junod, usando outras imagens capturadas naquele dia.
Avião
em Cabul
Escolher
entre a morte e a morte parece ter sido também o que aconteceu há três semanas
no Afeganistão, quando, em total desespero para deixar o país, homens se
penduraram na fuselagem de um avião americano.
As
duas imagens são como duas pontas terríveis dessa história que se uniram 20
anos depois.
Quase
um mês após os ataques às Torres Gêmeas, o então presidente americano George W.
Bush anunciou a guerra contra o Afeganistão. Os Estados Unidos tirariam do
poder o Talebã, que abrigava a Al Qaeda, autora dos atentados, no território
que controlava.
Vinte
anos depois, quando o atual presidente americano Joe Biden conduziu os Estados
Unidos ao fim da guerra, retirando as tropas americanas do Afeganistão, o mundo
viu o Talebã voltar ao poder em um tempo extraordinário.
Foi
o desespero de ficar em um país novamente controlado pelo Talebã que fez os
afegãos se segurarem às asas e à fuselagem de um avião. O avião decola, e
corpos são gravados ao despencarem para o nada - assim como despencaram no 11
de setembro. Restos mortais foram encontrados no trem de pouso depois que uma
aeronave aterrissou no Catar. Um jovem jogador de futebol de 19 anos, Zaki
Anwari, morreu ao tentar fugir dessa maneira.
O
fotógrafo de "O Homem Caindo" não quis comentar sobre o Afeganistão
nem sobre política. Hoje, Drew fotografa a emoção dos "brokers" na
Bolsa de Valores de Nova York, bem perto de onde ficavam as Torres Gêmeas -
atualmente um memorial para as vítimas do 11 de setembro.
Texto: Juliana Gragnani - @julianagragnani Da BBC News Brasil em Londres
Para ler mais acesse, www: professortacianomedrado.com
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