Por Oya Celasun, Florence Jaumotte, e Antonio Spilimbergo
Enquanto
a pandemia de Covid-19 continua a devastar o mundo, a mudança climática –
uma crise que pode causar destruição ainda maior – se aproxima. Todas as crises
nos ensinam lições, mas a pandemia foi mais longe: ela nos lembrou do poder da
natureza. Uma recente pesquisa da Ipsos conduzida globalmente para o FMI aponta
que 43% das pessoas entrevistadas estão mais preocupadas com a mudança
climática agora do que antes da pandemia, e apenas 7% disseram estar menos
preocupadas. A conscientização sobre os perigos da mudança climática sem
controle torna o momento atual muito importante para que sejam implementadas
reformas ousadas. Mas muitos
desafios ainda estão por vir.
Primeiro,
vamos observar algumas das semelhanças entre a Covid-19 e as mudanças
climáticas. O comportamento humano é fundamental para ambas as crises. O vírus
Sars-Cov2 se espalha entre as pessoas diretamente, exigindo distanciamento
social para contenção. A mudança climática é causada principalmente pelas emissões
de gases de efeito estufa da atividade humana, exigindo que usemos
menos energia e de fontes mais limpas.
Ambas
as crises são globais, economicamente devastadoras e provavelmente afetarão
desproporcionalmente os mais pobres, aprofundando as desigualdades existentes.
A pandemia deixou milhões de pessoas desempregadas, o que pode deixar
cicatrizes duradouras na economia. Da mesma forma, espera-se que a mudança
climática não controlada cause danos econômicos substanciais,
prejudicando desproporcionalmente os mais pobres e potencialmente desencadeando
a migração de pessoas em grande escala.
Ambas
as crises exigem soluções globais. A crise da Covid-19 não será resolvida até
que todos os países controlem a pandemia por meio de vacinação em massa, e a
crise climática não será resolvida até que todos os emissores entrem em ação,
reduzindo as emissões
globais a zero.
Algumas
das observações que fizemos no ano passado são motivo de grande preocupação.
O
primeiro é a visão de curto prazo. Nenhum país estava preparado para a
pandemia, apesar dos vários surtos devastadores na última década (por exemplo,
MERS, SARS, Ebola, Zika) e os vários avisos dos cientistas. Pior: com o golpe
da Covid-19, alguns governos não quiseram reconhecer o perigo até que fosse
tarde demais, ignorando o conselho de especialistas em saúde pública e agindo
apenas depois de incorrer em grandes custos humanos e econômicos. Isso
certamente levanta a questão: se era difícil reagir a um perigo que surgia a
algumas semanas de distância, então como seremos capazes de responder a um
perigo que hoje está a algumas décadas de distância?
A
segunda preocupação é a cooperação insuficiente. Embora a colaboração entre os
cientistas não tivesse precedentes, a cooperação entre os governos para
distribuir as vacinas de maneira equitativa vacilou no início, e a maioria dos
países recuou no nacionalismo das vacinas. De fato, nenhum país aceitaria uma
distribuição interna da vacina com base em dinheiro e poder. Porém, todos os
países aceitaram uma distribuição internacional com base nesses mesmos
critérios, não obstante a notável exceção da iniciativa COVAX e recentes pedidos
de compartilhamento de vacinas e patentes excedentes a fim de atingir também as
nações mais pobres.
O
poder da ciência
Também
houve surpresas positivas no último ano que nos permitem ser mais otimistas no
futuro.
A
resposta à pandemia mostrou que um esforço científico combinado pode fazer
milagres. Afinal, o desenvolvimento de uma nova vacina normalmente leva de 5 a
10 anos, de acordo com a Universidade Johns Hopkins, e até hoje ainda não
existem vacinas contra a malária e o HIV/AIDS. No ano passado, a maioria dos
especialistas estimou que a administração de uma vacina eficaz contra Covid-19
levaria pelo menos de 12 a 18 meses, e alguns duvidaram que isso pudesse ser
feito. No entanto, graças à colaboração espetacular entre cientistas,
financiamento generoso de governos e engenhosidade do setor privado, as vacinas
foram aprovadas apenas nove meses depois que a OMS (Organização Mundial da
Saúde) declarou uma pandemia.
Também
nas mudanças climáticas, novas tecnologias são cruciais – embora não sejam
suficientes – para lidar com o desafio de reduzir as emissões de carbono ao
zero líquido até 2050. Pense em armazenamento de bateria em escala industrial,
hidrogênio verde, captura de carbono ou tecnologias de emissão negativa.
Avanços são necessários para reduzir os custos dessas tecnologias limpas e
ampliar sua adoção. Os rápidos avanços na tecnologia de painéis solares e uma
queda de 80% nos preços na última década sugerem que um grande progresso pode
ser alcançado rapidamente se recursos suficientes forem comprometidos.
Lições
para mitigação das mudanças climáticas
Primeiro,
precisamos de uma estratégia para superar a visão de curto prazo desde o
início. A visão de curto prazo é motivada por temores de empregos perdidos e
meios de subsistência ameaçados. A melhor maneira de derrotá-la é comunicar
políticas coerentes e confiáveis para garantir uma “transição justa”. Se
feito da maneira certa, mitigar as mudanças climáticas – com o uso de precificação
de carbono – pode ajudar os governos a aumentar as receitas que podem
ser usadas para criar empregos e proteger as famílias mais pobres, o que deve
ajudar as sociedades a manterem uma visão de longo prazo e assim impedir a
mudança climática antes que seja muito tarde.
Em
segundo lugar, precisamos reconhecer que os governos desempenham um papel
fundamental para dar fim a grandes crises sistêmicas. Os governos protegeram os
mercados financeiros durante a crise financeira global, por exemplo, e mais
recentemente forneceram capital de risco para o desenvolvimento de vacinas
contra a Covid-19. Da mesma forma, os avanços necessários no desenvolvimento e
na adoção de tecnologias verdes virão apenas com o apoio dos governos para
pesquisa básica e infraestrutura.
Finalmente,
a colaboração entre os países será fundamental. O Acordo
de Paris sobre o clima encorajou alguns países a ampliar sua ambição.
Mesmo assim, muitos países estão deixando de cumprir suas promessas voluntárias
de reduzir as emissões, que coletivamente ainda não são ambiciosas o suficiente
para manter o aquecimento global abaixo de 2 ° C. Um acordo suplementar entre
os principais emissores – com a adoção de um piso diferenciado para o preço do
carbono para auxiliar no monitoramento e limitar as preocupações com a
competitividade – poderia ajudar os países a se coordenar.
O
ímpeto sem precedentes em direção à mitigação das mudanças climáticas em uma série
de emissores hoje não deve ser desperdiçado, mas sim consagrado em um acordo
coletivo que pode atrair mais participantes ao longo do tempo. Outra prioridade
importante é que a comunidade global forneça financiamento climático e
transferências de tecnologia para as economias em desenvolvimento para
ajudá-las a aprimorar seus esforços de mitigação e adaptação. Que melhor
momento para fazer isso do que em face da mobilização da saúde pública mais
consequente em um século?
Artigo publicado no site A Referência .
Para
ler mais acesse, www: professortacianomedrado.com
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