Prof. Taciano Medrado
Durante a pandemia causada pelo coronavírus, os
médicos que atuam nas dez ambulâncias de Suporte Avançado de Vida (SAV) do
Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e os do Grupo de Resgate e
Atenção às Urgências e Emergências (Grau) da capital paulista passarão a
atestar mortes naturais, indefinidas e causadas pela Covid-19 ocorridas fora
dos hospitais.
Os profissionais do Samu foram avisados sobre a
nova função em reuniões ocorridas nesta semana com a coordenação do serviço,
mas ainda não há uma data para iniciarem o trabalho. A reportagem teve acesso
ao conteúdo discutido nos encontros.
A nova medida é baseada no decreto 64.880 do
governo de São Paulo e em resolução da Secretaria Estadual da Saúde – ambos
publicados na sexta-feira (20).
O decreto delega às secretarias de Saúde e de
Segurança Pública de São Paulo a adoção de medidas necessárias para que as
atividades de manejo de corpos e de necrópsias, no contexto da pandemia do
Covid-19, não constituam ameaça às equipes de saúde e à população, além de dar
carta branca para a tomada de decisões por parte dos secretários.
A resolução define apenas que os profissionais das
unidades de saúde deverão emitir a Declaração de Óbito dos casos relacionados à
Covid-19 e o seu procedimento.
Por enquanto, a atuação do Samu para atestar mortes
ocorridas fora de ambiente hospitalar está sendo tratada no âmbito da
coordenação do serviço com as secretarias municipal e estadual da saúde. A
função ainda é de responsabilidade dos médicos do Serviço de Verificação de
Óbitos (SVO).
Hoje, em caso de morte sem assistência médica, a
família vai à delegacia e faz boletim de ocorrência de morte natural. O
delegado manda o serviço funerário retirar o corpo e levá-lo ao SVO para
necrópsia. Depois, o mesmo é liberado para velório .
O Samu, assim que iniciar na função, examinará o
corpo, fará o teste para Covid-19, se necessário, e preencherá uma autópsia
verbal, que ficará no serviço.
Se a morte ocorrer por Covid-19, o atestado será
alterado com a confirmação.
A reportagem ouviu profissionais do órgão, que
estão preocupados. "Uma vez que o médico do Samu não fará uma autópsia
completa, se for obrigado a emitir o atestado deverá colocar como causa da
morte apenas o provável, o que pode levar tanto a uma supernotificação como a
uma subnotificação de mortes pela Covid-19. De qualquer forma, ainda que se
faça teste nos casos de morte possivelmente por coronavírus, as demais causas
serão subnotificadas", afirma um médico que preferiu não se identificar.
"Isso destrói as estatísticas usadas para
políticas de gestão em saúde. Os falecimentos por infarto, derrame, aneurisma,
etc. serão classificados como causa indeterminada ou Covid-19."
O médico Wagmar Barbosa, conselheiro do Conselho
Regional de Medicina do estado de São Paulo, acha que é a melhor medida a ser
tomada neste momento.
"O conselho foi consultado pelo governo. A
decisão é baseada em experiências internacionais. O manuseio dos corpos e o
traslado implicam em risco não só às equipes de saúde mas também à
população", diz ele.
"É óbvio que não é o ideal e eu entendo o lado
dos médicos do Samu, mas, quando se fala em controle sanitário, a medida é
válida. Dada a situação atual, não vejo outro tipo de atitude. A situação é
dinâmica. Se houver uma alternativa melhor, não vou me opor", afirma.
Equipes do Samu realizam atendimento pré-hospitalar
de urgências e emergências, de acordo com prioridades.
Casos como infarto ou AVC, por exemplo, em que o
paciente corre o risco de morte iminente, devem ser atendidos pelas equipes
avançadas (com médico e enfermeiro, além do condutor da ambulância, que também
é um socorrista) num tempo que não deve ultrapassar 12 minutos, segundo
preconizam organizações médicas internacionais.
Outro ponto negativo, segundo os profissionais do
Samu, é a desassistência que a medida pode ocasionar no atendimento de
ocorrências graves.
Para o professor da Faculdade de Saúde Pública da
USP Gonzalo Vecina Neto, a medida não é inviável, mas também não é adequada.
"Dado o fato de que o Samu não tem tempo de
atendimento das emergências adequado, é uma má utilização de recurso
sofisticado, de se ter equipes mais completas do Samu para fazer verificação de
óbitos.", diz ele.
"O mais correto seria suprir o SVO de equipes
volantes. Um morto não sai do estágio de morto, mas quem está vivo e precisa da
ambulância de UTI pode ser sacrificado. O ideal seria os médicos do SVO se
deslocarem e fazerem esse serviço.”
Procurada, a Secretaria Estadual da Saúde negou que
haja mudança de protocolo em relação ao Grau.
A pasta afirmou também que os funcionários do
Serviço de Verificação de Óbito seguem desempenhando suas funções.
O Ministério da Saúde e a Secretaria Municipal da
Saúde, responsável pelo gerenciamento do Samu na cidade de São Paulo, não
responderam aos questionamentos da reportagem.
Fonte: Tribuna online
Fonte: Tribuna online
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