Ainda vivemos a Idade Média Digital

 

(*) Bruno Cesar

Vivemos conectados. Consumimos, comentamos, compartilhamos, curtimos e cancelamos, tudo em tempo real. No entanto, em meio à aparente modernidade das redes, à velocidade dos vídeos curtos e à hiper conectividade do mundo digital, há uma contradição silenciosa, mas grave: boa parte da população que consome o conteúdo digital diariamente ainda não foi alfabetizada digitalmente. E mais alarmante, sequer há profissionais qualificados em número suficiente para ensinar o caminho.

A analogia com a Idade Média não é exagerada. Aquela época foi marcada por concentração de poder e conhecimento nas mãos de poucos, disseminação de mitos e ausência de pensamento crítico em massa. Agora, séculos depois, assistimos a uma nova concentração, só que digital.

As grandes plataformas controlam algoritmos e narrativas, enquanto grande parte da população segue à deriva, sem ferramentas para interpretar o que lê, sem distinguir uma notícia de uma fake news, uma opinião de um discurso de ódio, um golpe de uma promoção legítima.

A maioria acessa, mas poucos compreendem. Sabem usar os aplicativos, mas não entendem as dinâmicas e os riscos do ambiente onde navegam. Sem essa alfabetização digital, continuaremos como súditos dessa nova Idade Média, dominados por senhores feudais que agora atendem pelos nomes de plataformas, influenciadores e algoritmos.

É impossível sobreviver na era digital sem compreender minimamente o território em que se vive. Esse “novo mundo” exige competências além do uso básico de ferramentas. É preciso desenvolver pensamento crítico, ética digital, noções de privacidade, cibersegurança e entendimento sobre o funcionamento de redes sociais, algoritmos e inteligência artificial.

Entretanto, como esperar isso de uma população que sequer foi alfabetizada no contexto analógico? E como capacitar essa população, se nem mesmo existem profissionais suficientes com conhecimento técnico e didática para conduzir esse processo de educação digital em larga escala?

Trata-se de uma urgência ignorada. O abismo entre o acesso e o entendimento é cada vez maior, e com isso, crescem a desinformação, os golpes digitais, os discursos de ódio e a manipulação em escala industrial.

A fragilidade do debate se escancara também no campo institucional.

O Supremo Tribunal Federal votou recentemente pela constitucionalidade da autorregulação das plataformas digitais, mas nem mesmo os “Excelentíssimos Ministros” demonstraram preparo técnico para uma decisão tão complexa. Muitos votos pareceram motivados pelo incômodo pessoal com as críticas que recebem nas redes, mais guiados pelo fígado do que por uma análise jurídica profunda e comprometida com a clareza.

Faltou estabelecer critérios objetivos sobre o que deve ser considerado crime e o que se enquadra no legítimo exercício da opinião. Resultado: empresas como Google, Meta e X (antigo Twitter) assumem agora a responsabilidade de julgar e moderar os conteúdos publicados por seus usuários, em um cenário ainda nebuloso e propenso a excessos.

Na teoria, parece um avanço. Mas na prática, o que se vê é um vácuo de clareza: o que será considerado crime? O que será apenas uma opinião impopular? Quem decide? Como garantir que essa autorregulação não se transforme em censura privada disfarçada de zelo democrático? Se uma pessoa quiser prejudicar alguém, bastará fazer uma notificação extrajudicial para retirar o conteúdo do ar?

A ausência de critérios objetivos fará com que as plataformas adotem um comportamento defensivo, removendo ou penalizando conteúdos de maneira exagerada. Isso colocará em risco a liberdade de expressão, principalmente daqueles que ousarem divergir do discurso dominante, mesmo quando sem violar qualquer lei.

Alfabetizar digitalmente não é ensinar a mexer em um celular. É ensinar a viver e sobreviver no mundo atual. É formar cidadãos conscientes, críticos e responsáveis. É dar ferramentas para que todos possam compreender, questionar, participar e proteger-se.

Sem isso, seguiremos repetindo a história. Trocamos a cruz por senhas, os inquisidores por moderadores de conteúdo, os pergaminhos por posts, mas mantemos a ignorância como ferramenta de dominação.

A saída não está apenas em legislar. Está em educar.

E, para isso, o Brasil precisa sair da Idade Média Digital. Urgente.

(*) Bruno César Teixeira de Oliveira, é colunista do site carioca o Boletim. Com uma carreira sólida na gestão de riscos, compliance e prevenção a fraudes em instituições financeiras.

Fonte: O Boletim

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