O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF),
enfrenta críticas de congressistas e entidades após a revelação de que seu
gabinete solicitou, por meio de canais informais, a produção de relatórios ao
Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para embasar decisões contra apoiadores do
ex-presidente Jair Bolsonaro em inquéritos conduzidos no STF. Os pedidos foram
realizados durante o período em que Moraes presidia o TSE, segundo o
jornal Folha de S. Paulo.
Parlamentares
bolsonaristas acusam o ministro de desrespeitar o devido processo legal e de
direcionar investigações contra personalidades específicas. A Ordem dos
Advogados do Brasil (OAB) anunciou que vai solicitar acesso aos inquéritos sob
a relatoria de Moraes no Supremo. Em nota, a OAB ressaltou a necessidade de
esclarecer, com urgência, se houve a produção de provas ilegais por servidores
ou gabinetes do STF para sustentar decisões judiciais contrárias a indivíduos
específicos, ou se a atuação permaneceu dentro dos limites do poder de polícia
da Justiça Eleitoral.
Já
o gabinete de Moraes afirmou, por meio de nota, que, durante os inquéritos,
foram feitas solicitações a diversos órgãos, incluindo o TSE, e garantiu que
todas as ações seguiram rigorosamente os termos regimentais. Além disso,
acrescentou que a Procuradoria Geral da República participou integralmente dos
casos.
A
repercussão das mensagens motivou um novo avanço de aliados de Bolsonaro no Congresso
Nacional contra o ministro. Na tarde desta quarta-feira, 14, a oposição ao
governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vai apresentar um
pedido de impeachment. A senadora Damares
Alves (Republicanos-DF), que integra o grupo, afirmou que o magistrado
deve renunciar à cadeira na Corte.
Uso
do TSE fora do rito para embasar relatórios
A Folha revelou
que a equipe de Moraes pediu, de forma constante, a produção de relatórios para
embasar investigações contra bolsonaristas. Haveria um fluxo fora do rito, com
um órgão do TSE sendo utilizado para nutrir o STF sem uma requisição de
informações feitas de forma oficial.
O
ministro, por meio do juiz auxiliar dele, Airton Vieira, fazia pedidos
para o perito Eduardo Tagliaferro, que comandava a Assessoria Especial de
Enfrentamento à Desinformação (AEED). Os alvos eram aliados do ex-presidente
que postaram ataques ao sistema eletrônico de votação, aos ministros do STF e
que incitaram os membros das Forças Armadas contra o resultado da
eleição presidencial de 2022.
Ministro
indicava nomes e conteúdos que deveriam entrar em documentos probatórios
Foto captura de tela
Na
troca de conversas, Airton pedia, em nome de Moraes, que os relatórios
incluíssem determinados investigados e conteúdos nas redes sociais. O gabinete
do ministro também solicitou ajustes quando os documentos não estavam em
conformidade com os resultados esperados pelo magistrado. Os movimentos sugerem
que o magistrado, além de relator e julgador, também estava atuando como
investigador nos inquéritos das fake news e das milícias digitais.
Em
um pedido de relatório para embasar uma decisão contra o comentarista político
Rodrigo Constantino, Airton Vieira pede para Tagliaferro “caprichar” nas provas
utilizadas contra o investigado.
Moraes
mirou Eduardo Bolsonaro e outros aliados próximos do ex-presidente
Além
de Rodrigo Constantino, Airton Vieira pediu a Tagliaferro que produzisse
relatórios que iam ser utilizados para embasar decisões contra o blogueiro Paulo
Figueiredo Filho. Mensagens também evidenciam o pedido de documentos
probatórios contra deputados que integravam (alguns continuam no Congresso) o
núcleo duro do bolsonarismo na Câmara dos Deputados como: Bia Kici (PL-DF), Carla
Zambell (PL-SP), Daniel Silveira (PTB-RJ), Eduardo
Bolsonaro(PL-SP), Filipe Barros (PL-PR), Junio Amaral (PL-MG), Major
Vitor Hugo (PL-GO), Marco Feliciano (PL-SP), Otoni de
Paula (MDB).
“Boa
noite, Eduardo! Tudo bem?! O Ministro pediu para verificar, o mais rápido
possível, as redes sociais dos Deputados bolsonaristas (os nomes envio abaixo),
ver se estão ofendendo Ministros do STF, TSE, divulgando ‘fake news’, etc.,
para fins de multa. Ele tem bastante pressa. Obrigado”, diz o juiz instrutor em
uma das mensagens reveladas pela Folha. Relatórios receberam timbre do TSE
após pressão do gabinete de Moraes.
Em
outras trocas de mensagens, Airton Vieira sugere uma estratégia para evitar que
o uso do TSE como braço investigativo não ficasse “descarado”. Uma das
alternativas utilizadas foi a de registrar que a autoria do pedido dos
relatórios ficassem com o timbre do TSE, assinado pelo juiz auxiliar Marco
Antônio Vargas, e não com a assinatura do STF.
Em
um documento, Tagliaferro envia um relatório sobre um grupo chamado “Brasil
Conservador” com o timbre do STF. Em um áudio, Airton diz que pensou em colocar
o nome dele na autoria do relatório, mas ele disse que desistiu da ideia porque
ficaria “estranho”.
“Em
um primeiro momento pensei em colocar o meu nome, de ordem do juiz Airton
Vieira, etc e etc. Mas, pensando melhor, fica estranho. Porque eu não tenho
como mandar para você, que é lotado no TSE, um ofício ou pedir alguma coisa e
você me atender sem mais nem menos”, afirma o juiz no áudio revelado pela Folha.
“Embora
saibamos que entre nós as coisas são muito mais fáceis justamente porque temos
um mínimo múltiplo comum na pessoa do ministro, mas eu não tenho como,
formalmente… Se alguém for questionar, vai ficar uma coisa muito descarada,
digamos assim”, completou o juiz instrutor.
O
que diz o gabinete de Moraes e o ministro?
Na
noite desta terça-feira, logo após a divulgação da reportagem da Folha, o
gabinete de Moraes afirmou, em nota, que fez solicitações a inúmeros
órgãos, incluindo o TSE. Segundo o magistrado, todas as ações foram feitas
seguindo os termos regimentais.
“Todos
os procedimentos foram oficiais, regulares e estão devidamente documentados nos
inquéritos e investigações em curso no STF, com integral participação da
Procuradoria Geral da República”, disse o gabinete.
Na
abertura da sessão desta quarta do STF, Moraes se defendeu das acusações
afirmando que, como presidente do TSE na época da troca de mensagens, tinha
“poder de polícia” para determinar a feitura dos relatórios e afirmou que seria
“esquizofrênico” se auto-oficiar.
“Seria
esquizofrênico eu, como presidente do TSE, me auto-oficiar. Até porque, como
presidente do TSE, no exercício do poder de polícia, eu tinha o poder, pela
lei, de determinar a feitura dos relatórios”, afirmou Moraes.
Com informações do Estadão
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