Dados genéticos de um grupo de aves da Caatinga conhecidas como choca-do-nordeste indicam que alterações no curso do rio São Francisco e oscilações climáticas ocorridas ao longo de um milhão de anos causaram a divisão do grupo em duas espécies distintas. Uma delas foi descrita pela primeira vez na revista científica Zoologica Scripta. O artigo publicado ontem (18 de junho) é fruto de parceria entre o Instituto Tecnológico Vale (ITV), o Museu Paraense Emílio Goeldi e as universidades federais do Pará (UFPA) e do Rio Grande do Norte (UFRN).
Os
indivíduos da nova espécie, nomeada Sakesphoroides niedeguidonae (o
nome da espécie foi uma homenagem à arqueóloga
Niède Guidon), até então, eram considerados parte da espécie Sakesphoroides
cristatus. Porém, o estudo descobriu diferenças genéticas, de plumagem e de
canto entre os grupos.
Os
pesquisadores analisaram características da plumagem, das formas e as medidas
corporais de 1.079 aves, incluindo 92 exemplares preservados em museus e 987
fotografias digitais. Além disso, estudaram 115 gravações sonoras atribuídas às
chocas-do-nordeste, 58 amostras de material genético e 568 registros de
ocorrência que indicavam a distribuição geográfica dessas aves. Com as
informações em mãos, estimaram ainda a história genética do grupo e as relações
de parentesco entre as linhagens. Também foi possível inferir o tamanho
populacional e os nichos climáticos – ou seja, a distribuição de indivíduos de
acordo com condições climáticas – ocupados pela espécie ao longo de sua história.
A
equipe identificou dois padrões distintos no canto das aves, que coincidiam com
diferenças na plumagem das fêmeas. Ao mesmo tempo, os dados genéticos revelaram
a presença de dois grupos nas amostras, com uma variação no material genético
de 1,8%. Alexandre Aleixo, pesquisador do ITV autor do artigo, explica que, se
todos os indivíduos pertencessem à mesma espécie, como se acreditava antes do
estudo, esse número seria próximo de zero.
Biodiversidade
da Caatinga
Os
achados chamam atenção para a diversidade da Caatinga. “Estamos vendo que
a Caatinga tem espécies ainda não descritas de todos os grupos e, quanto mais
frequente for a incorporação de dados moleculares nos estudos, maior é a
chance de encontrar novas espécies”, comenta Aleixo. Cerqueira destaca que esse
foi o primeiro estudo a mostrar um novo padrão evolutivo para as aves da
região, sinalizando que ainda há muito a ser descoberto.
O
estudo pode contribuir para a criação de estratégias de proteção para essas
espécies e para o ecossistema como um todo, além de abrir espaço para
outras pesquisas. “Os futuros estudos ecológicos e populacionais podem ser mais
focados em cada uma das espécies, avaliando se os tamanhos populacionais estão
sofrendo influência do desmatamento e se variam com o aumento de temperatura”,
exemplifica Cerqueira.
A
partir da hipótese de diversificação da Caatinga mediada pelo rio São Francisco
e das oscilações climáticas históricas, o grupo planeja continuar testando
esses padrões em outras espécies com distribuição similar. “Queremos também
trabalhar com genomas completos em torno dessa nova espécie e entender melhor
como é a relação com a espécie irmã quando elas se encontram”, conclui Aleixo.
Fonte: Fauna News
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