A
educação pública brasileira costuma ser um terreno fértil de erros e inversão
de prioridades que geram atrasos e desigualdades, impondo um horizonte sombrio
para milhões de crianças e jovens. O estudo divulgado recentemente pela
Secretaria do Tesouro Nacional (Despesas por Função do Governo Geral) reafirmou em números
um desses equívocos. Mapeando dados consolidados até 2022, constata-se que, no
ensino superior, o Brasil exibe gasto no padrão de países ricos, enquanto fica
aquém em etapas da educação básica como o ensino fundamental 2 e o ensino
médio. Não difere muito nas despesas com educação infantil e fundamental 1, mas
no conjunto de despesas gerais com a educação (4,49% do Produto Interno Bruto –
PIB) o País fica abaixo de vizinhos da América Latina e de economias avançadas.
É
importante notar, de acordo com o estudo, que o Brasil vinha ampliando
sistematicamente o volume de despesas com educação entre 2010 e 2019 – de R$
397 bilhões para R$ 520 bilhões no período, ainda que proporcionalmente em
relação ao PIB tenha sido verificada uma certa estabilidade entre 2011 e 2018.
Entre 2019 e 2021, no entanto, iniciou-se um período de redução e, nela, a
educação básica foi especialmente atingida, graças à pandemia de covid-19 e à
retração que se verificou tanto nos governos estaduais e municipais quanto em
nível federal. O ano de 2022 inverteu a trajetória decrescente.
Essa
curva não inverte o essencial: em matéria educacional, o Brasil tem um sistema
de transferência de renda e geração de oportunidade às avessas, distorção que
já vem sendo apontada há bastante tempo por especialistas. Enquanto a uma
esmagadora maioria pobre se oferta um péssimo ensino básico público, a minoria
rica tem a seu dispor boas universidades públicas e gratuitas. Existe padrão
internacional nas escolas privadas, não faltam magníficas exceções entre as
escolas públicas da educação básica e há trágicos exemplos de má qualidade
entre universidades públicas, mas o retrato geral é desabonador, completado e
aprofundado pela defasagem do ensino técnico e profissionalizante.
Isso
significa estar na contramão do que ensinam boas práticas apontadas pela
literatura especializada. A lição internacional indica dois pilares essenciais:
prioridade para a educação básica e a qualificação de professores. No
abecedário dos erros do Brasil, falha-se em ambos.
Em
setembro do ano passado, o relatório Education at a Glance, da Organização para Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE), mostrou que desde 2010 o Brasil investe menos
de um terço do que os países ricos para cada aluno da educação básica pública:
US$ 3.583 por aluno/ano, enquanto a média entre as nações desenvolvidas é de
US$ 10.949. Em contrapartida, o Brasil investe no ensino superior público quase
US$ 14.800 ao ano por aluno, o mesmo valor da média da OCDE, além de ter um dos
menores porcentuais de estudantes matriculados na educação profissional,
considerando os 45 países analisados. Um ano antes, o Anuário Brasileiro
da Educação Básica já apontava tendências similares.
Esse
pode ser um recado particularmente útil para o presidente Lula da Silva. As
primeiras gestões lulopetistas dedicaram especial atenção à ampliação de vagas
no ensino superior, tanto pela abertura de novas universidades públicas
federais quanto pelos incentivos às universidades particulares por meio de
mecanismos como o Prouni. Lula e o PT se mostram garbosos até hoje ao falar dos
números exuberantes das gestões anteriores, entre novos campi universitários
(181), novas universidades federais (18) e os chamados institutos federais
(422). Obras e prioridades que jamais se converterão em mudança efetiva para a
vida de crianças e adolescentes diante de uma educação básica que fracassa em
quantidade e qualidade, na atração de recursos e na gestão.
Enquanto
alunos de escolas privadas têm desempenho similar ao dos norte-americanos, a
esmagadora maioria que vem da escola pública ingressa na vida profissional só
com as frágeis ferramentas do ensino básico. Tal descompasso não é uma
imposição do destino, e sim o resultado de más escolhas públicas.
AVISO: Os comentários são de responsabilidade dos autores e não representam a opinião do Blog do professor Taciano Medrado. Qualquer reclamação ou reparação é de inteira responsabilidade do comentador. É vetada a postagem de conteúdos que violem a lei e/ ou direitos de terceiros. Comentários postados que não respeitem os critérios serão excluídos sem prévio aviso.
Postar um comentário