© AP - Gustavo Garello
Por: Márcio Resende, correspondente da RFI em Buenos Aires
O objetivo da Argentina, na reunião que acontece no Alvorada nesta terça-feira (2) às 17 horas, é obter linhas de financiamento do BNDES para exportações de produtos brasileiros e para a construção de um gasoduto estratégico. Por falta de dólares no Banco Central argentino, o país está a ponto de não poder mais importar e ver a sua economia parar em plena corrida eleitoral.
O
presidente argentino, Alberto Fernández, reúne-se com Lula nesta terça-feira
para obter ajuda financeira e política do aliado brasileiro para a crítica
situação argentina. No campo econômico, o apoio pretendido tem duas frentes
principais: linhas de crédito do BNDES para empresas brasileiras exportarem
produtos à Argentina e o financiamento da construção de um estratégico
gasoduto.
No
primeiro caso, a Argentina mantém as importações necessárias para a sua
economia continuar a produzir; no segundo, além de evitar importar gás, o país
passaria a exportar o produto, invertendo uma deficitária equação na sua
balança comercial, agrava pelo aumento das commodities energéticas a partir da
guerra na Ucrânia.
“Esta
é uma viagem politicamente relevante porque é economicamente importante para o
governo argentino conseguir que o Brasil contribua para a Argentina evitar o
principal risco provocado pela escassez de dólares: além da desvalorização da
moeda, a falta de dólares limita a importação de bens e de componentes que
sustentam a atividade econômica e a produção na Argentina”, explica à RFI o
analista político Lucas Romero, da Synopsis.
A
situação emergencial da Argentina é decorrente das reservas do seu Banco
Central, próximas do zero. A escassez de dólares é tamanha, a ponto de o país
ter ficado sem dinheiro para importar componentes básicos para a sua própria indústria
funcionar.
“O
ministro Sergio Massa procura aliviar dois pontos: a demanda de dólares, mas,
principalmente, o impacto na atividade econômica porque muitos setores têm
limitado as importações, afetando a produtividade. A Argentina vive uma desaceleração
muito grande a ponto de que as previsões são de que a economia encolha em torno
de três pontos do PIB. Nesse sentido, esta viagem ao Brasil é fundamental”,
aponta à RFI o cientista político Sergio Berensztein.
O
governo argentino tenta que o seu principal parceiro comercial, o Brasil,
continue a lhe enviar produtos, mas sem cobrar agora e sem cobrar em dólares.
Por isso, é importante para Buenos Aires que essas linhas do BNDES sejam em
reais. Os Bancos Centrais de cada país seriam as garantias do crédito e os
responsáveis pela compensação em moeda local.
Terreno
perdido pelo Brasil para a China
Se,
para a Argentina, a vantagem é poder manter a atividade econômica, adiando o
pagamento de importações, para o Brasil, a vantagem é poder continuar a vender
ao país vizinho, sem perder o principal mercado para os produtos
industrializados brasileiros, aqueles que mais valor acrescido e, portanto,
empregos geram.
Cerca
de 210 empresas brasileiras exportam para a Argentina. Todas têm tido problemas
para receber os pagamentos, com demoras superiores a 180 dias. O país tem
procurado pagar em até 366 dias, de forma a sempre adiar para o ano seguinte.
Há
anos, a China tem um mecanismo de swap de moedas com a Argentina para o uso de
yuans chineses no comércio bilateral. Com essa facilidade de não usar dólares,
Pequim tem conseguido tirar do Brasil boa parte do mercado argentino.
Situação
crítica
O
presidente argentino, Alberto Fernández, viaja com o seu ministro da Economia,
Sergio Massa, e com o seu chanceler, Santiago Cafiero. Sergio Massa, por sua
vez, leva sua equipe econômica, revelando a dimensão que o financiamento
brasileiro tem para uma economia argentina em agonia.
Somente
em abril, o peso argentino desvalorizou-se 20%, no contexto de uma corrida
cambial que ainda não terminou. O estopim para a corrida cambial foi o índice
de inflação de março em 7,7% com uma acumulação de 104,3% nos últimos 12 meses.
A desvalorização de abril alimentou o aumento de preços numa galopante e
preocupante dinâmica inflacionária.
A
escassez de dólares tornou-se ainda mais grave a partir de uma severa seca que
afetou a produção agrícola, retirando da economia cerca de US$ 20 bilhões.
A
viagem com urgência de Alberto Fernández a Brasília para se reunir com Lula foi
acertada durante a videochamada de 45 minutos que os dois presidentes
mantiveram na última quinta-feira (27). Foi um desdobramento dos acordos de
cooperação econômica e financeira que os dois governos assinaram em 23 de
janeiro em Buenos Aires, durante a primeira viagem internacional de Lula.
Gasoduto
estratégico
O
mais estratégico dos acordos a médio prazo foi o de Soberania Energética que
prevê a construção de um gasoduto entre a reserva patagônica de Vaca Muerta, a
segunda maior jazida de gás de xisto e a quarta de petróleo não-convencional do
mundo, até o sul do Brasil.
Faltam
à Argentina recursos financeiros para construir um gasoduto e uma planta que
permita exportar a energia contida em Vaca Muerta, suficiente para o Brasil
substituir o gás da Bolívia cujas reservas têm caído anualmente.
O
que mais aparece avançado, no entanto, é o papel do BNDES como financiador dos
canos de aço para o gasoduto. Esses canos são produzidos no Brasil pela empresa
argentina Techint.
Salvação
política
Além
da ajuda financeira, o presidente argentino procura em Lula um apoio político.
Alberto Fernández é hoje um presidente meramente decorativo. Seu governo é
sustentado pela vice-presidente Cristina Kirchner em aliança com o ministro da
Economia, Sergio Massa, que ainda alimenta chances de ser candidato à
presidência nas eleições de outubro. Para isso, precisa estabilizar a economia
e evitar uma desvalorização desordenada.
“Enquanto
o objetivo de Alberto Fernández é terminar o mandato, o de Sergio Massa é
garantir o seu futuro político, condicionado a que a economia não entre em
colapso. O poder de Alberto Fernández é muito limitado, mas estar com Lula no
Brasil lhe permite exercer o papel de presidente e fortalecer a sua posição
regional”, indica Sergio Berensztein.
“Alberto
Fernández é hoje mais um ex-presidente do que um presidente em exercício. É uma
espécie de presidente emérito. A centralidade do governo passa por Sergio Massa
e por Cristina Kirchner. São os que sustentam as decisões de política
econômica. Para Alberto Fernandez, Lula aparece como um aliado nesta última
fase do seu mandato num contexto de absoluta fraqueza política do presidente
argentino”, avalia Lucas Romero.
Para
o especialista, “a ajuda brasileira colabora para o plano de Sergio Massa de
conduzir a economia sem sobressaltos nem uma brusca desvalorização do peso
argentino” enquanto “o objetivo de Alberto Fernández é apenas que o seu mandato
não termine da pior forma”.
“Sergio
Massa procura ter chances de uma candidatura presidencial. Para isso, requer
que a economia tenha certo nível de competitividade. Se o processo econômico
continuar piorando, não há candidatura. Se conseguir evitar que a economia
entre em colapso, pode tentar ser candidato. O seu destino político depende do
rumo econômico nas próximas semanas”, conclui Lucas Romero em entrevista
à RFI.
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