Fotomontagem TM
Por Evandro Voltolini
O
preconceito com a velhice é um tema que cresce em importância conforme a população se torna mais velha em média — a pirâmide
etária, com mais jovens do que idosos, está mudando para um funil etário, e os
mais velhos tendem a se tornar maioria.
Mas,
nos últimos dias, esse assunto dominou as manchetes por um motivo inusitado: um
grupo de universitárias humilhou uma colega de classe, de somente 40 anos, mas
que já seria "velha" demais para estar em uma faculdade com elas. No
domingo, ao ganhar o Oscar de Melhor Atriz por Tudo em
Todo Lugar ao Mesmo Tempo, a atriz Michelle Yeoh, de 60 anos, disse:
"Senhoras, não deixe ninguém dizer que você já passou do seu auge".
Esses
casos — e vários outros que vemos com infeliz frequência — evidenciam o
preconceito com a idade. Esse fenômeno foi definido pela primeira vez pelo
gerontólogo norte-americano Robert N. Butler, ainda nos anos 1970. Ele criou o
termo em inglês, "ageism", que muitas vezes é traduzido como ageísmo,
mas também como etarismo ou idadismo. Esse último passou a ser utilizado pela
OMS (Organização Mundial da Saúde), em relatórios sobre o tema.
Alguns
especialistas, como a antropóloga Mirian Goldenberg, usam o termo
"velhofobia" para facilitar as discussões. Contudo, é importante
observar que estereótipos relacionados à idade podem acontecer em várias etapas
da vida — como acreditar que pessoas jovens são sempre inexperientes, por
exemplo. Além disso, o preconceito com o envelhecimento não impacta só as
pessoas idosas, como o caso das universitárias demonstrou.
Dessa
maneira, definir esse preconceito como etarismo ou idadismo seria mais
correto.
Um
preconceito com o processo de envelhecer
Em
conversa com o podcast Café da Manhã, da Folha de São Paulo, Mirian
Goldenberg explica que o etarismo ou idadismo está relacionado aos valores
sociais que exaltam a juventude — ao mesmo tempo em que demonizam o
envelhecimento. Os 20 ou 30 anos seriam o auge da vida de qualquer pessoa, e passar
dos 60 ou 70 seria quase uma doença.
Contudo,
Mirian conta que o medo da morte — que supostamente estaria próxima — não é um
assunto entre os nonagenários que pesquisa. O que essas pessoas mais temem, na
realidade, é a solidão e a perda da independência. Uma morte
simbólica, ainda em vida, segundo ela.
Nesse
processo, as pessoas mais velhas sofrem preconceito no mercado de trabalho,
pois são vistas como incapazes, como alguém que "já deu o que tinha que
dar". No convívio social, elas podem ser infantilizadas, como se não
fossem seres humanos com sonhos, opiniões próprias e projetos pessoais — assim
como qualquer pessoa, apenas com mais anos de vida.
Em
última instância, isso causa grande impacto na saúde mental dos idosos — que
podem até se sentir capazes, mas sofrem com o julgamento social. Além disso,
como a professora Naira Dutra Lemos afirmou ao podcast O Assunto, isso
pode levar à violência física contra pessoas mais velhas. Entre 2019 e 2020, as
denúncias desse tipo ao Disque 100 aumentaram de 48,5 mil para cerca de 77 mil
— foi quando mais idosos ficaram em casa com filhos e netos.
Um
problema de valores
Mirian
Goldenberg afirma que o etarismo ou idadismo é um problema ainda mais grave
aqui no Brasil — um país que até pouco tempo era muito jovem e valoriza demais
a aparência física da juventude. Em pesquisas na Alemanha, onde o movimento de
envelhecimento da população já acontece há mais tempo, ela afirma que idosos
ativos são vistos com mais naturalidade.
A
solução para esse problema, segundo esses especialistas, passa pela educação,
as pessoas precisam entender que os idosos podem fazer o que desejarem:
trabalhar, viajar, se divertir, ou ter uma vida sexual ativa, de acordo com
suas possibilidades. E ainda que a saúde física possa diminuir após os 80 ou 90
anos, nem todos se tornam senis ou "voltam a ser crianças" — aliás,
mesmo os idosos senis merecem respeito e tratamento digno.
Em
resumo, tratar as pessoas mais velhas como gente.
Mas,
para Mirian, mesmo que a população brasileira esteja envelhecendo como um todo
e a sociedade esteja começando a questionar algumas coisas, ainda levará
bastante tempo para mudar esse sistema de valores que exalta a juventude, em
detrimento à velhice.
Fonte: Artigo publicado, originalmente, no site megacurioso
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