Sete entre cada dez
eleitores ainda não definiram o voto para deputado, a menos de quinze
dias das eleições.
Você lembra em quem votou nas
últimas eleições gerais, em outubro de 2018? A maioria responderá pensando nos
cargos de presidente ou de governador. Talvez um ou outro lembre em quem votou
para as duas vagas no Senado, mas seguramente apenas uma ínfima minoria
recordará em quem votou para deputado.
É quase certo que 2 de outubro
próximo o quadro se repetirá. Você possivelmente já escolheu em quem votará
para presidente e governador; ainda está em dúvida quanto ao voto para senador,
porém ainda não definiu em quem votará para deputado federal e estadual.
Possivelmente decidirá no dia da votação, a caminho da urna.
Além dessa pouca preocupação
com o voto no Legislativo (deputados e senador), existe o fato de que ocorrem em
turno único, o implica em dizer que não haverá "repescagem", nem
mesmo na disputa para o Senado, que é majoritária — isto é, a votação do dia 2
de outubro representa o primeiro turno das eleições para o Executivo, mas é o
turno único das eleições legislativas.
Eis o ponto: todos sabemos que
as leis são feitas no Poder Legislativo, mas damos muito pouca atenção às
eleições para as casas legislativas; todavia, todos temos que obedecer às leis
que nelas são aprovadas.
Nesses últimos quatro anos,
nosso Congresso Nacional aprovou diversas normas e assumiu posições, umas boas
e outras nem tanto — cada qual julgue como quiser. Tivemos a reforma da lei do
saneamento básico e o bloqueio de dezenas de pedidos de impeachment, que
sequer foram apreciados. Foi aprovada mais uma reforma previdenciária, ao mesmo
tempo em que foram pedalados os precatórios federais. Foi aprovada a
PEC Emergencial e criado o orçamento secreto, que beneficia os
parlamentares. Foram vastamente ampliados os recursos do fundo eleitoral. E
muito mais. Só de Emendas Constitucionais foram 26, em três anos e meio.
Começou com a EC 100, que tornou obrigatória a execução das emendas
parlamentares de bancada, em junho de 2019, sendo a mais recente a EC 125, que
criou requisitos para admissibilidade de processos pelo STJ, em julho de 2022.
Olhe para o Legislativo de seu
estado e verifique o que nele foi feito nos últimos quatro anos. Veja quais
deputados ou lideranças brigaram pelas causas que são simpáticas a você. Dois
exemplos paulistas: foi durante essa legislatura que a Assembleia Legislativa
do Estado de São Paulo (Alesp) decidiu pela manutenção dos recursos no caixa da Fapesp, bem como criou uma espécie de ICMS com alíquotas móveis,
semelhante ao IPI.
Estas normas/decisões não
decorreram de votações unânimes, logo, veja quem votou em um sentido ou outro e
alinhe-se conforme melhor lhe aprouver. Só não fique indiferente, pois isso lhe
impactará diretamente. Afirmar que estamos em um binarismo eleitoral,
como escreveu Alexa Salomão, é pertinente na eleição para
presidente e governador em vários estados, mas não se aplica para as disputas
legislativas, nas quais é enorme o leque de opções.
É preciso dar mais atenção às
disputas para os Legislativos, pois lá são feitas as leis que obrigarão a todos
nós. Você é contra ou a favor do aumento dos tributos? Isso será decidido no
Legislativo. Reforma tributária ou reforma administrativa? É pauta do
Legislativo. E por aí vai.
É no Legislativo que se
concentra (ou deveria se concentrar) a fiscalização dos atos do Executivo. Isso
foi bastante corrompido pelo orçamento secreto, criado pelo atual
presidente e seguido por muitos governadores.
A partir desse olhar é
possível até mesmo, com seu único voto, tentar balancear o jogo de poder. Veja
só: (1) caso você queira que o presidente/governador a ser eleito tenha
"vida fácil" no Legislativo, vote de forma alinhada, isto é, em
todos do mesmo grupo político. Em sentido oposto, (2) caso você pense que é
melhor que o Legislativo se oponha a qualquer iniciativa do Executivo, mesmo as
que aparentemente sejam boas, vote desalinhado, ou seja, em grupos
políticos opostos para Executivo e Legislativo. Existe ainda (3) a
possibilidade de análise federativa do poder, votando em grupos
políticos iguais ou diversos para presidente e para governador.
Além disso, e extremamente
importante, é que você paga o salário dessa turma toda, e de seus assessores,
que muitas vezes são obrigados a fazer "rachadinhas" com o
parlamentar com o qual trabalham.
Uma imagem demonstra o risco:
é como entrar em um restaurante, comer mal e ainda pagar uma conta cara — e ser
obrigado a fazer isso durante quatro anos, todos os dias.
Portanto, preste atenção e não desperdice o voto no parlamentar de sua preferência política.
Artigo publicado originalmente na Revista Consultor Jurídico (link)
(*) é professor titular de Direito Financeiro da Universidade de São Paulo (USP), advogado e sócio do escritório Silveira, Athias, Soriano de Mello, Bentes, Lobato & Scaff Advogados.
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