(*) Thomas Milz
Era
o sonho de todos nós ver o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o
atual presidente Jair Bolsonaro (PL) entrando no mesmo ringue, para finalmente
lutarem um contra o outro pela primeira vez. Não houve um duelo direto em 2018,
pois Lula estava na cadeia. Agora, Bolsonaro até ameaçou não comparecer
ao primeiro debate, na Band. Mas foi. E o Lula também.
Já
vi Lula discursando para plateias inúmeras vezes ao longo dos anos. Ele é um
mestre das palavras, da encenação do discurso. Vi o petista fazer até três
discursos diferentes por dia durante as caravanas de campanha. Com esse mestre,
o Bolsonaro não pode, pensei, esperando que o Lula fosse esmagar Bolsonaro com
frases de efeito e sacadas rápidas.
Mas
algo deu errado logo na primeira resposta de Lula. Bolsonaro tinha questionado
o ex-presidente sobre corrupção. Óbvio que ele iria fazer isso. E Lula citou
todas as leis e órgãos que criou para combater a corrupção. Quando chegou a
citar o Coaf, pensei: agora vem o ataque à família Bolsonaro, um contra-ataque
para jogar as "rachadinhas" na cara do presidente.
Mas
nada. De repente, Lula estava falando sobre empregos que criou no seu governo.
Nada a ver com o assunto corrupção. Parecia que o Lula tentava enterrar esse
assunto. Mas, ao desviar do tema, ele parecia surpreendentemente fraco. Perdeu
esse primeiro embate com Bolsonaro. De surpresa.
Pensei
que o Lula fosse acordar depois da largada queimada. Mas, no decorrer do
debate, ele foi parecendo até mais apático. Num certo momento, tinha a mesma
expressão facial que meu pai quando fica com pressão baixa e desmaia. Será que
o Lula não está bem de saúde? Ele teve um câncer na laringe em 2011. Foi
curado. No fim do ano passado, apareceram boatos de que o câncer teria voltado,
mas não foram apresentadas provas.
No
debate entre os presidenciáveis, Lula se segurou. Teve até um momento forte, ao
responder à Soraya Thronicke, candidata pelo União Brasil, que o mundo lindo
que ele pinta existe, mesmo quando a senadora não o vê: "A senhora não viu
melhora. Mas seu motorista e sua empregada doméstica viram." De resto?
Nada de Lula.
Busca-se
agora uma explicação pelo fraco desempenho do petista. Será que as perguntas o
pegaram de surpresa? Pouco provável, são as mesmas perguntas que Lula ouve há
anos. Pessoalmente, aposto em desgaste físico: estava com a voz rouca e
visivelmente cansado. Trata-se, vamos lembrar, de um homem de 76 anos.
Costumamos falar mal da "múmia" Joe Biden, de 79 anos. Mas Lula está
apenas alguns anos atrás do presidente americano.
O
debate muda o cenário eleitoral? Por enquanto não. Quem se saiu bem foram a
Simone Tebet (MDB) e o Ciro Gomes (PDT), que têm 3% e 7% das intenções de voto,
respectivamente, segundo a última pesquisa do Ipec. Lula ainda lidera a corrida, com
entre 8 e 12 pontos percentuais de vantagem em relação a Bolsonaro, dependendo
da pesquisa. Mas qualquer ponto que vai para a "terceira via" diminui
as chances de liquidar a fatura já no primeiro turno.
Haverá, bem provavelmente, um segundo turno entre Bolsonaro e Lula. Já estou ansiosamente esperando pelo duelo entre os dois antes da votação final e decisiva. Desta vez, não vou tomar como garantida uma vantagem natural de Lula sobre Bolsonaro. A corrida continua em aberto, com uma vantagem significativamente grande de Lula. Mas as zebras parecem soltas.
(*) Thomas Milz saiu da casa de seus pais protestantes há quase 20 anos e se mudou para o país mais católico do mundo. Tem mestrado em Ciências Políticas e História da América Latina e, há 15 anos, trabalha como jornalista e fotógrafo para veículos como a agência de notícias KNA e o jornal Neue Zürcher Zeitung. É pai de uma menina nascida em 2012 em Salvador. Depois de uma década em São Paulo, mora no Rio de Janeiro há quatro anos.
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