EDITORIAL DO ESTADÃO: Os ‘meninos’ de Lula


Para quem não está com o juízo comprometido pela paixão ideológica, a pré-campanha eleitoral tem evidenciado o relativismo de Lula da Silva ao tratar de certos crimes, que para ele seriam menos graves a depender de quem os cometeu e das causas que os teriam motivado.

Além de tentar reescrever a história do petrolão, fazendo os brasileiros de tolos, há poucos dias Lula achou que era o caso de jactar-se de ter intercedido, em 1998, pelos sequestradores do empresário Abílio Diniz junto ao então presidente Fernando Henrique Cardoso.

Presos havia quase dez anos, os sequestradores do empresário, que Lula tratou singelamente como “meninos”, decidiram entrar em greve de sede e de fome. “Eu disse: ‘Fernando, você tem a chance de passar para história como um democrata ou como o presidente que permitiu que dez jovens que cometeram um erro morressem na cadeia, e isso não vai (se) apagar nunca’”, disse Lula em Maceió (AL) na semana passada, no que se prestava a ser um discurso elogioso ao senador Renan Calheiros (MDB), ao seu lado no palanque. Renan Calheiros era o ministro da Justiça àquela época.

Abstraindo a pretensão de Lula de ensinar a FHC como entrar para a história como um democrata, é inacreditável como o petista, passados todos esses anos, ainda manifeste explícita simpatia pelos que cometeram não um “erro”, mas um crime tão violento – extorsão mediante sequestro – que em 1990 passou a ser qualificado como hediondo, conforme a Lei 8.072.

Abílio Diniz, convém recordar, foi sequestrado no dia 11 de dezembro de 1989, em São Paulo, por um grupo de delinquentes do Movimento de Esquerda Revolucionária-Político (MIR-Político) e das Forças Populares de Libertação (FPL) de El Salvador. Dez pessoas foram presas por envolvimento no crime: cinco chilenos, dois canadenses, dois argentinos e um brasileiro. O empresário passou quase uma semana no cativeiro e, em entrevistas posteriores, descreveu seu medo de morrer a qualquer momento nas mãos daqueles, segundo a definição carinhosa de Lula, “meninos”.

“Eles iam entrar em greve seca, que é ficar sem comer e sem beber, e aí é morte certa”, disse Lula. “Eu então fui procurar o ministro da Justiça, Renan Calheiros, que depois de uma longa conversa me disse para falar com o presidente Fernando Henrique Cardoso, porque ele teria toda a disposição de mandar soltar o pessoal.” O petista afirmou ter convencido os sequestradores a encerrar a greve seca. “Eu fui na (sic) cadeia no dia 31 de dezembro (de 1998) e falei com os meninos: ‘Vocês vão ter que dar a palavra para mim e garantir que vão acabar com a greve de fome agora, e vocês vão ser soltos’. Eles respeitaram a proposta, pararam a greve de fome, foram soltos. Não sei onde estão agora.”

É muito curiosa essa preocupação de Lula com o equilíbrio nutricional dos sequestradores de Abílio Diniz, todos ligados a movimentos revolucionários de esquerda, que, confessadamente, pretendiam usar o dinheiro do resgate para sustentar a guerrilha em El Salvador. O mesmíssimo Lula tem uma visão diametralmente oposta da greve de fome como instrumento de manifestação política quando ela é empregada no cárcere por opositores dos regimes que ele apoia. Recordemos o que Lula disse à agência Associated Press, em 2010, quando um grupo de opositores da ditadura de Fidel Castro em Cuba decidiu iniciar uma greve de fome em protesto contra prisões arbitrárias na ilha caribenha. “Nós temos de respeitar a determinação da Justiça e do governo cubano de deter pessoas em razão da legislação de Cuba, como quero que respeitem o Brasil”. Para aquele Lula, “a greve de fome não pode ser usada como um pretexto de direitos humanos para libertar as pessoas. Imagine se todos os bandidos presos em São Paulo entrassem em greve de fome e pedissem a liberdade”.

Lula é isso: para seus “meninos”, criminosos condenados por sequestro, carinho e compreensão; para os que enfrentam a ditadura sanguinária de Cuba colocando a própria vida em risco, frieza e cinismo. Eis aí o líder.

Fonte: Estadão

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