Da Redação
A
proibição de showmícios se justifica para resguardar a paridade de armas entre
os candidatos a cargos eletivos. E a medida não afeta a liberdade de expressão,
pois não impede que artistas manifestem suas opiniões políticas em
apresentações próprias.
Com
esse entendimento, o ministro Dias Toffoli, relator da Ação Direta de
Inconstitucionalidade 5.970, votou nesta quarta-feira (6/10) para manter a
proibição de showmícios por candidatos em eleições. O entendimento foi seguido
pelos ministros Nunes Marques e Alexandre de Moraes. Toffoli, porém, disse que
apresentações artísticas em eventos de arrecadação de campanha não contrariam a
Constituição, no que foi seguido por Alexandre. Nunes Marques opinou pela
inconstitucionalidade da prática. O julgamento será retomado nesta quinta
(7/10).
O
artigo 39, parágrafo 7º, da Lei 9.504/1999, acrescentado pela Lei 11.300/2006,
proíbe "a realização de showmício e de evento assemelhado para promoção de
candidatos" e a apresentação, "remunerada ou não", de
artistas para animar comícios e reuniões eleitorais.
O
segundo ponto em discussão é o artigo 23, parágrafo 4º, inciso V, que dispõe
que as doações poderão ser efetuadas por meio de "promoção de eventos de
arrecadação realizados diretamente pelo candidato ou pelo partido
político".
Dias
Toffoli apontou que a Constituição elegeu o pluralismo político como um dos
fundamentos da República brasileira. Assim, a Carta Magna prestigiou a
coexistência de diferentes visões de mundo, garantida pelo livre fluxo de
ideias e de informações e da concorrência de candidatos de diferentes espectros
políticos. Para isso acontecer, ressaltou, é necessário que haja um espaço
público em que se garantam oportunidades iguais para os diferentes candidatos.
"Condiz
com o princípio republicano que o exercício do direito ao voto seja fruto da
livre manifestação de consciência do eleitor, pelo que merece proteção contra
todo e qualquer tipo de abuso ou manipulação, de forma a garantir um processo
eleitoral legítimo, autêntico, igualitário e, em última instância, efetivamente
democrático. Sobre essas bases assenta-se o Estado Democrático de Direito, pois
o exercício da democracia não se encerra na periodicidade dos mandatos
políticos, mas pressupõe a existência de eleições tão livres, universais e
equânimes quanto possível", avaliou o ministro.
De
acordo com Toffoli, a proibição de showmícios "buscou evitar o abuso de
poder econômico no âmbito das eleições e resguardar a paridade de armas entre
os candidatos". E isso também vale para apresentações gratuitas, pois há considerável
benefício ao candidato, que recebe um serviço que pode ser quantificado em
dinheiro.
Além
disso, showmícios podem ser considerados oferecimentos de vantagens aos
eleitores, que podem associar o entretenimento à figura do político
homenageado. "Nesse sentido, a norma protege, também, a livre formação de
vontade do eleitor", declarou o relator.
Os
showmícios, segundo o ministro, também conferem vantagem na disputa eleitoral,
que pode desequilibrar a paridade de armas entre os candidatos.
A
vedação dos showmícios não configura censura prévia, pois não impede
manifestações de cunho políticos de artistas, desde que sejam feitas em
apresentações próprias, avaliou Toffoli.
"Sob
essa perspectiva, concluo não haver qualquer vulneração à liberdade de expressão
a partir da proibição dos showmícios e eventos assemelhados, remunerados ou
não, já que a regra não se traduz em uma censura prévia ou em proibição do
engajamento político dos artistas, mas apenas disciplina a realização de
apresentações artísticas no contexto de eventos eleitorais voltados à obtenção
de votos".
Dessa
maneira, Dias Toffoli votou para negar o pedido de declaração de
inconstitucionalidade parcial artigo 39, parágrafo 7º, da Lei 9.504/1997. O
entendimento foi seguido por Nunes Marques e Alexandre de Moraes.
Nunes
Marques analisou que mesmo as apresentações sem remuneração desequilibram a
corrida eleitoral. Afinal, atraem pessoas que não iriam a tal evento político
se não houvesse o show, prejudicando os candidatos que não têm como promover
eventos do tipo. O ministro ainda ressaltou que as apresentações artísticas
podem desviar a atenção do eleitor dos problemas sociais que estão em jogo nas
eleições.
Já
Alexandre de Moraes destacou que a vedação dos showmícios visa garantir a
isonomia não eleições. "Dinheiro chama dinheiro. E dinheiro, nas eleições,
chama voto. É inegável que showmícios, quando eram permitidos, tinham uma
influência eleitoral. Quem tinha mais possibilidades econômicas tinha mais
possibilidade de promover showmícios".
O
magistrado também avaliou que a proibição das apresentações não viola a
liberdade de expressão. Isso porque os artistas não ficam impedidos de expor
suas opções eleitorais.
Shows para arrecadações
No entanto, Dias Toffoli votou para conferir interpretação conforme à
Constituição ao artigo 23, parágrafo 4º, inciso V, da Lei 9.504/1997, para
permitir apresentações artísticas em eventos de arrecadação de recursos para
campanhas eleitorais.
Conforme
o ministro, tais eventos são voltados a eleitores que, conscientemente,
contribuíram com uma candidatura. "Ou seja, o comparecimento do eleitor à
ocasião tem o propósito definido de financiar o projeto político de sua
escolha", disse Toffoli, apontando que tal medida permite que os cidadãos
viabilizem as propostas que apoiam.
Alexandre
de Moraes seguiu o relator, avaliando que, se jantares de arrecadação para
candidatos com chefs famosos são permitidos, shows também devem ser,
pois são apresentações artísticas do mesmo jeito.
Nunes
Marques divergiu nesse ponto, entendendo que shows em eventos de arrecadação
também atraem pessoas que possivelmente não iriam a tal evento, desequilibrando
a disputa. Por isso, votou para negar o pedido de liberação dessas
apresentações.
Violação de precedente
O ministro Gilmar Mendes, que ainda não votou, opinou que a permissão de shows
em eventos de arrecadação pode ser uma forma de burlar a decisão do Supremo que
proibiu as doações eleitorais de pessoas jurídicas.
"Imagino
que uma empresa possa comprar todos os ingressos de um almoço ou show de uma
pequena reunião de arrecadação de campanha e distribuir aos seus empregados,
que podem ou não ir. Isso já resulta em um tipo de financiamento por pessoa
jurídica", destacou.
O
decano da Corte ainda lembrou que, se um cantor cobra R$ 500 mil por show, esse
é o valor da doação que está fazendo ao candidato ao se apresentar em evento de
sua campanha. Assim, tais apresentações podem ultrapassar o teto de doações
feitas por pessoas físicas.
Pedidos dos partidos
O Partido Socialista Brasileiro (PSB), o Partido Socialismo e Liberdade (Psol)
e o Partido dos Trabalhadores (PT) ajuizaram no Supremo Tribunal Federal ação contra
regra da legislação eleitoral que trata da organização de eventos de
arrecadação de recursos e da proibição de showmícios por candidatos.
A
pretensão dos partidos é que seja declarada a inconstitucionalidade parcial do
artigo 39, parágrafo 7º, da Lei 9.504/1997, quando as apresentações forem
gratuitas, sem cobrança de cachê, mediante a supressão da expressão "ou
não" do texto legislativo. "É proibida a realização de showmício e
de evento assemelhado para promoção de candidatos, bem como a
apresentação, remunerada ou não, de artistas com a finalidade de animar
comício e reunião eleitoral", diz o dispositivo.
Além
disso, as agremiações requereram o reconhecimento de que a proibição de
showmícios e eventos assemelhados não impediria a ocorrência de eventos
artísticos, inclusive shows musicais, feitos no intuito de arrecadar recursos
para campanhas eleitorais.
"Diante
da postura por vezes censória da Justiça Eleitoral, existe o elevado risco de
que se adote a compreensão de que tal preceito não abrange a realização de
espetáculos artísticos, em razão da vedação aos showmícios e à apresentação de
artistas para animar eventos eleitorais", afirmaram as legendas.
Segundo
os partidos, tanto a proibição dos showmícios não remunerados quanto a vedação
de eventos artísticos de arrecadação eleitoral são incompatíveis com a garantia
constitucional da liberdade de expressão.
"A
primeira medida ofende, ainda, o princípio da proporcionalidade, enquanto a
segunda também viola a isonomia e o imperativo constitucional de valorização da
cultura", apontaram.
Os
partidos destacaram que tanto a atividade artística como as manifestações de
natureza política compõem o núcleo essencial da liberdade de expressão.
"Música não é apenas entretenimento, mas também um legítimo e importante
instrumento para manifestações de teor político", sustentaram. "Não é
legítima a pretensão legislativa de converter o embate político-eleitoral numa
esfera árida, circunscrita à troca fria de argumentos racionais entre os
candidatos, partidos e seus apoiadores, sem espaço para a emoção e para a
arte."
A
Procuradoria-Geral da República mTanifestou-se pela improcedência da ADI,
sustentando que "o dispositivo questionado veicula importante mecanismo de
controle sobre a propaganda eleitoral, com a finalidade de assegurar a
igualdade entre os postulantes a cargos públicos, combater o abuso do poder nas
eleições e o uso indevido dos meios de comunicação". Com informações da Revista Consultor Jurídico
Clique aqui para ler o voto de Dias Toffoli
ADI 5.970
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