ARTIGO: O STF e a aplicação retroativa do novo Código Florestal

 


Gleydson K. L. Oliveira  advogado, mestre e doutor em Direito pela PUC-SP e professor da graduação e mestrado da UFRN.

Nesse contexto, registre-se que o STF, no julgamento das ADIs 4901. 4902. 4903 e ADC 42, relator ministro Luiz Fux, declarou a constitucionalidade dos artigos 61-A, 61-B, 61-C, 63 e 67 do novo Código Florestal, por considerar que o Poder Legislativo dispõe de legitimidade constitucional para estabelecer a eficácia imediata a fatos anteriores à sua vigência, assegurando-se aos proprietários adequar-se a partir das novas normas estabelecidas, e não com base no que determinava o Código Florestal anterior (Lei 4771/1965).

Entretanto, mesmo após a referida decisão do STF sobre a constitucionalidade do novo Código Florestal, o STJ firmou, em diversos precedentes, interpretação em não admitir a aplicação das mencionadas regras legais a fatos pretéritos, sob pena de retrocesso ambiental, aplicando-se a máxima do tempus regit actum (REsp 1.728.244, relator ministro Herman Benjamin), e que a declaração de constitucionalidade proferida pelo STF não inibe a análise pelo STJ da aplicação no tempo da nova lei (REsp 1.646.193, relator ministro Gurgel de Faria).

Por sua vez, em face dos referidos julgados proferidos pelo STJ, inicialmente o STF inclinou-se em não admitir os recursos extraordinários, por entender que a discussão da aplicação da lei no tempo envolve violação reflexa ao texto constitucional (ARE 1217539-AgRg, relator ministro Dias Toffoli, ARE 1257726-AgRg, ministra Carmen Lúcia, RE 1170071, relator ministro Edson Fachin).

Pende, inclusive, perante a 1ª Seção do STJ a afetação de recurso especial repetitivo em que se examinará a possibilidade de se reconhecer, ou não, a retroatividade de normas não expressamente retroativas do novo Código Florestal para alcançar situações consolidadas sob a égide da lei anterior (REsp 1.731.334, relatora ministra Regina Helena Costa). Não se afasta a possibilidade de, à luz do princípio da retroatividade da sanção mais benéfica, se conjugar a aplicação retroativa de preceito sancionador mais benéfico previsto no novo Código Florestal a fato pretérito, eis que a retroação da lei mais benéfica é um princípio geral do Direito sancionatório, e não apenas do Direito Penal (REsp 1153083, relatora ministra Regina Helena Costa; AR 1304, relator ministro Napoleão Maia). Não se afigura razoável submeter o particular à sanção administrativa, em razão de conduta que não é mais é contrária à ordem jurídica.

Por oportuno, inexplicavelmente o STJ se negou a aplicar dispositivos legais previstos no novo Código Florestal com eficácia retroativa declarados constitucionais pelo STF, a pretexto de impedir o retrocesso ambiental e a redução do patamar de proteção a ecossistemas frágeis a ponto de transgredir o dever de preservação do meio ambiente.

Afigura-se inexplicável tal postura porque os eventuais postulados da proibição de retrocesso e o dever de proteção ao meio ambiente não consubstanciam valores constitucionais absolutos, inexistindo discricionariedade aos órgãos jurisdicionais de aplicar, ou não, os precedentes vinculantes emanados do STF. A proteção ambiental se situa no patamar de outros princípios constitucionais conjugados com outros valores constitucionais de igual estatura, como livre iniciativa, função social da propriedade, desenvolvimento sustentável, segurança e estabilidade jurídicas etc.

Assim, em relação às normas legais expressamente previstas no novo Código Florestal como de eficácia retroativa, em boa hora o STF, em recentes decisões colegiadas e monocráticas, tem anulado as decisões proferidas pelo STJ, por haver identificado o flagrante e inequívoco desrespeito à autoridade do julgado que declarou a constitucionalidade dos dispositivos legais previstos no novo Código Florestal, além de configurar violação à sua Súmula Vinculante nº 10, segundo a qual "viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, afasta sua incidência, no todo ou em parte", admitindo o ajuizamento de reclamação constitucional por violação à autoridade de decisão vinculante emanada da Corte Suprema.

Até porque a decisão do STF que declara a constitucionalidade de dispositivos legais, em sede de controle concentrado de constitucionalidade, por força do artigo 102, §2º, da CF/1988, adquire o status de precedente jurisprudencial com eficácia vinculante, de sorte que não se admite que outra autoridade judiciária deixe de aplicar tal tese jurídica, sob pena de esvaziamento da autoridade e da eficácia da decisão proferida pelo STF, especialmente porque a eficácia retroativa do novo Código Florestal, por força dos artigos 61-A, 61-B, 61-C, 63 e 67, implica o reconhecimento de situações jurídicas já consolidadas e a regularização de imóveis rurais a partir das novas disposições, e não a partir da legislação anterior vigente, se traduziu em tema central, cuja constitucionalidade foi declarada (Rcl 42889, relator ministro Alexandre de Moraes; Rcl 39.270, relator ministro Gilmar Mendes; Rcl 44645, relator ministro Ricardo Lewandowski).

De outro lado, a rigor as decisões proferidas pelo STJ, afastando a aplicabilidade de preceitos normativos previstos no novo Código Florestal, em razão de suposto fundamento constitucional, sem a decretação de inconstitucionalidade configura, entre outras, violação direta e frontal aos artigos 5º, XXXVI, e 97 da Constituição Federal (RE 1051404, relator ministro Roberto Barroso, RE 1216014, relatora ministra Carmen Lucia).

Artigo publicado originalmente na Revista Consultor Jurídico

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