(*) Teobaldo Pedro
Outro dia vi um vídeo que me fez pensar. Um vira-lata caramelo, acuado por um pitbull, fez o que muitos fariam diante da morte iminente: fingiu-se de morto. Ficou imóvel, em silêncio absoluto por um instante. O pitbull, sem reação, se afastou. O caramelo viveu. Naquela cena, enxerguei um retrato brutalmente honesto do Brasil que sangra todo dia. Não o Brasil do cartão-postal, do desfile militar, do discurso inflamado. Falo do Brasil real, o Brasil pobre, oprimido, esmagado pela violência, pela miséria, pela humilhação cotidiana.
O brasileiro acorda cedo, trabalha até o corpo gritar, pega transporte lotado, enfrenta salário mínimo que mal paga o gás. Vive com medo do assalto, da injustiça, do descaso. E mesmo assim continua. Se cala. Finge que não dói. Finge que está vivo para não ser devorado. Como o caramelo, o povo aprendeu a sobreviver por instinto. A se curvar quando a pancada vem. A fingir-se de morto para ganhar mais um dia de vida. Não é covardia. É uma resistência silenciosa, ancestral. Um grito engolido, mas ainda pulsando por dentro.
No Brasil, a violência não se limita às ruas. Ela está entranhada nas instituições que deveriam proteger a população. A violência institucional se manifesta na seletividade da justiça e na superlotação das prisões, que aprisionam sobretudo os mais pobres, enquanto os ricos e poderosos, responsáveis por corrupção e crimes de colarinho branco, raramente enfrentam punição. Essa corrupção corrói o país, desviando recursos que deveriam garantir saúde, educação e segurança, perpetuando a desigualdade e a injustiça. É uma violência que fere o coração da democracia e aprofunda o sofrimento dos vulneráveis.
Esse Brasil não marcha, não berra, não explode. Mas também não esquece. Um dia, como o cão caramelo, ele se levanta. Bambeando, ferido, mas vivo. Porque quem aprende a resistir fingindo-se de morto nunca esquece o caminho de volta para a vida. E quando esse povo decidir levantar de vez, ninguém segura mais.
Ariano Suassuna dizia que o Brasil não é para principiantes. José Saramago, com sua ironia pungente, nos lembra que o mundo é um lugar perigoso para se viver não por causa daqueles que fazem o mal, mas por causa daqueles que observam e deixam o mal acontecer. Que possamos ser a força que não mais se finge de morta, mas que luta, ergue a voz e transforma.
(*) (*) É pastor evangélico há 30 anos e tem forte atuação na área social do Vale do São Francisco, desenvolvendo diversas ações nesse segmento há três décadas, tendo sido parceiro na criação de vários projetos de inclusão em Juazeiro e região. Ele tem formação em Teologia, Psicanálise Clínica, Educação Religiosa e Filosofia. Fez especialização em Radialismo, atuando por vários anos na área. É também professor e escritor. Em 2013, ganhou o título de Dr. Honoris Causa pela Genesis University. Colunista do TMNews do Vale (Blog do professor Taciano Medrado)
Não
deixe de curtir nossa página Facebook e também Instagram para
acompanhar mais notícias do TMNews do Vale (Blog do professor TM)
Envie
informações e sugestões para o TMNews do Vale pelo WhatsApp: (74)98825-2269
AVISO:
Os comentários são de responsabilidade dos autores e não representam a opinião
do TMNews do Vale (Blog do professor TM) Qualquer reclamação ou reparação é de
inteira responsabilidade do comentador. É vetada a postagem de conteúdos que
violem a lei e/ ou direitos de terceiros. Comentários postados que não
respeitem os critérios serão excluídos sem prévio aviso.
Postar um comentário