O crime impossível sendo julgado


(*) Valter Bernat

Nesta semana estamos assistindo aos depoimentos de pessoas pertencentes ao “núcleo crucial da trama golpista” – nome pomposo dado pelo STF para a ação penal.

Golpe? Tentativa de golpe? Abolição violenta do estado de Direito? Organização criminosa? Não!!! Apenas cogitação. Nem planejamento houve. Aconteceram reuniões para sondar a quantas andava o ânimo dos apoiadores. Viram que não era possível e desistiram, tanto que nada foi feito.

O ocorrido no dia 8 de janeiro foi uma balbúrdia desenfreada, tal como aconteceu em 2013 com os Black Blocks e ninguém, naquela época, foi processado por golpe de estado, apenas por danos ao patrimônio.

Outra coisa: durante a ditadura militar, a oposição (esquerda) e seus apoiadores matou, sequestrou embaixador, assaltou bancos e explodiu bombas e, no entanto, foi aprovada a anistia (ampla, geral e irrestrita) a todos … é outra história? Outro tempo? Dois pesos, duas medidas? Desta vez houve apenas depredação, mais nada, rigorosamente nada! Nem plano aconteceu.

Tentativa é você planejar, executar e ter sua intenção derrubada, por exemplo, pelas Forças armadas ou por outro motivo legal, ou seja, você planejou e tentou executar, mas não teve sucesso por forças externas. Isso é tentativa! Se você parar no planejamento, nada houve, salvo cogitação. Isso foi o que aconteceu, só que na verdade, nem o planejamento houve.

No entanto, agora estão processando o Crime impossível, figura conhecida no Direito Penal.

Fica meio chato explicar, juridicamente, a figura do “crime impossível”, mas é necessário o devido esclarecimento. No âmbito do Direito Penal, existem situações em que um crime não pode ser praticado devido a circunstâncias que tornam impossível sua execução. O crime impossível é um dos primeiros institutos do Direito Penal estudados pelos alunos do curso de Direito. Ele também é conhecido por outros nomes, tais como tentativa inidônea, tentativa inadequada ou quase crime.Ele está previsto no art. 17 do Código Penal e sua redação é a seguinte:

Art. 17 – Não se pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime.

Exemplos clássicos de crime impossível: Roubo com uso de faca de papel, envenenar com substância que não seja venenosa, atirar sem balas, etc…

A diferença entre “tentativa de crime” e sua “cogitação” é importante, pois se houve apenas intenção, não houve o crime, portanto não pode ser punido. No crime impossível o agente tem a consciência e a vontade de cometer o crime, que é impossível de se consumar por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto.

Portanto, foi com horror e perplexidade que o Brasil assistiu, em 8 de janeiro de 2023, às cenas da invasão das sedes dos Três Poderes, vandalizadas por uma turba insatisfeita com a eleição e a posse de Lula e a com a forma que foi conduzida a eleição pelo TSE. Naquele dia, milhares de apoiadores radicais de Bolsonaro, insatisfeitos com o resultado da eleição e com a posse de Lula, invadiram e depredaram o Palácio do Planalto, o Congresso e o STF.

A reação que se esperava das autoridades, das forças de segurança e dos órgãos de investigação era identificar quem depredou as sedes dos poderes e quem, estando ou não na praça na tarde de 8 de janeiro, instigou ou levou adiante um plano golpista, separando este grupo do grupo que apenas tinha a intenção de protestar, mas exageraram sim. Vandalizaram e fizeram um quebra-quebra em patrimônio público. Uma forma de protesto que não levaria a nada.

Em vez de serem corretamente investigados e punidos, os atos de 8 de janeiro foram transformados em pretexto para que as liberdades e as garantias democráticas fossem ainda mais agredidas no país. Tentativa de golpe de estado!!!

Que havia pessoas dispostas a derrubar o governo Lula, é evidente. No entanto, mais de mil pessoas foram encarceradas e tratadas como golpistas. Esses brasileiros foram mantidos nos presídios da Papuda e da Colmeia sem que houvesse os requisitos legais para a manutenção de prisões preventivas ou temporárias.

Qual seu crime? O “golpe de Estado de 8 de janeiro”. É, claramente, um crime impossível, ou seja, pelos fatos, jamais poderiam ter cometido o delito que lhes está sendo imputado.

Gilmar Mendes, no STF disse: “Certamente, não houve de forma muito clara, não se pode dizer que houve uma tentativa de golpe, não houve quem quisesse assumir o poder. Ocuparam o STF, o Palácio do Planalto e parte do Legislativo. A seguir as forças policiais atuaram e estes palácios foram esvaziados, mas, de qualquer forma, causaram um imenso tumulto, como nós estamos a ver e estamos a discutir, inclusive no exterior”.

A maioria dos ministros do STF, demonstrando desprezo pelo devido processo legal e pela ampla defesa, condenou algumas dezenas de manifestantes pelos crimes de “tentativa de golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, associação criminosa, dano ao patrimônio da União e deterioração do patrimônio tombado” (ufa!), ainda que em quase todos os casos não houvessem elementos concretos que ligassem os réus a atos de vandalismo ou a intenções golpistas.

No caso, os réus são acusados do chamado crime impossível – quer dizer, não poderiam, pela observação material dos fatos, ter cometido o delito que lhes está sendo imputado. Constatamos que não houve golpe, nem tentativa de golpe e muito menos golpe armado.

O golpe do 8 de janeiro é um crime impossível, pois não podia ser praticado, da mesma forma como não se pode roubar um automóvel em Marte ou passar um cheque sem fundo para o faraó do Egito. Não podia ser praticado por várias razões evidentes, a começar pelo fato de que é impossível dar um golpe armado se as armas mais agressivas dos golpistas eram dois estilingues ou tacos de beisebol.

É impossível dar um Golpe de Estado quando as Forças Armadas não aderem. Não há como derrubar um governo sem qualquer plano coerente de ação, corroborado pelas Forças Armadas. Sim, os amotinados podem e devem ser processados por destruição do patrimônio público e outros crimes de pequeno porte, já que depredaram patrimônio da União.

Só que a anistia não é para o quebra-quebra ou para o vandalismo. É para o “golpe de Estado” que nunca foi dado. É, na verdade, a correção de um erro judicial cometido com malícia deliberada pelo STF. No entanto, cidadãos, que jamais violaram a lei em suas vidas, estão sendo condenados, alguns a 17 anos de cadeia.

O argumento dos defensores da lenda oficial e dos inimigos da anistia é que os condenados do STF, o ex-presidente Bolsonaro, o coronel Cid e sabe lá Deus quem mais, tinham a intenção de dar o golpe; queriam mas não conseguiram, desistiram, ou coisa parecida. É como condenar o ladrão que estava pensando em roubar a galinha, mas não roubou – tanto que a galinha continua no galinheiro, entregue a seus afazeres pessoais, e não na panela do ladrão.

No entanto, o STF e o governo acham que isso é o maior triunfo da democracia brasileira em toda a sua história. Só que não…

Logo, na verdade, os crimes a serem anistiados, não foram cometidos! Não existe isso em democracia nenhuma do mundo.

(*) Advogado, analista de TI e editor do site.

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