Carissmo(a)s leitore(a)s do TMNews do Vale (Blog do professor taciano medrado), hoje o mundo se despede de Pepe Mujica, uma figura ímpar da política latino-americana e mundial e dedicamos nosso espaço a homenageá-lo.
Exemplo de simplicidade
Pepe Mujica - um homem que escolheu viver com simplicidade em tempos de ostentação. Um líder que optou pela coerência num mundo cada vez mais dominado pelo oportunismo. Um esquerdista por convicção, mas, acima de tudo, um humanista por essência.
Ex-presidente do Uruguai, Mujica não é daqueles que se encaixam facilmente nos moldes da política tradicional. Sua trajetória foge à regra, desvia da lógica do poder como instrumento de vaidade e se aproxima, com sinceridade comovente, da vida comum, da gente simples, do trabalhador e do homem do campo. Mujica nunca quis ser exemplo. Mas, ironicamente, tornou-se um dos mais autênticos que já tivemos.
Nascido em 1935, Pepe Mujica teve uma juventude marcada pela militância política. Integrou o movimento Tupamaros, uma guerrilha urbana que lutava contra a ditadura uruguaia nas décadas de 1960 e 1970. Foi preso. Torturado. Passou 14 anos encarcerado, a maioria deles em condições desumanas — confinado em solitárias, trancado em poços, vivendo com o mínimo da dignidade. Saiu de lá, como ele mesmo conta, "com feridas na alma, mas sem ódio no coração".
Ao invés da vingança e do rancor, a construção
E talvez seja esse o traço mais impressionante de Mujica: a ausência de rancor. Ao invés de se vingar, ele escolheu construir. Ao invés de se isolar, ele decidiu se aproximar do povo. Mujica compreendeu, como poucos, que o poder político só vale a pena se for usado para servir. E foi assim que governou o Uruguai entre 2010 e 2015: com os pés no chão, a cabeça nas ideias, e o coração na esquerda – uma esquerda que acredita na justiça social, na igualdade de oportunidades e no cuidado com os mais vulneráveis.
Durante seu governo, promoveu políticas sociais ousadas, legalizou o aborto e o casamento entre pessoas do mesmo sexo, regulamentou a maconha como questão de saúde pública e segurança, e sempre defendeu o meio ambiente como um bem comum. Mais do que um administrador, Mujica foi um símbolo. Recusou o luxo da residência oficial, continuou morando em sua pequena chácara nos arredores de Montevidéu, dirigindo seu velho Fusca azul e doando cerca de 90% de seu salário presidencial para causas sociais.
Crítico e um pensador popular
Mas engana-se quem acha que Mujica é apenas um símbolo de humildade. Ele é também uma voz crítica, um pensador popular que enxerga os excessos do mundo moderno com a lucidez de quem já viu demais. Em um dos discursos mais famosos na ONU, Mujica denunciou o consumismo desenfreado, a cultura da acumulação, e nos fez refletir sobre o verdadeiro sentido da liberdade. "Pobre não é quem tem pouco, é quem precisa infinitamente mais", disse ele, com a calma de um velho sábio e a firmeza de um revolucionário de alma.
O TMNews do Vale presta hoje esta homenagem não apenas ao ex-presidente, mas ao ser humano Mujica. A sua coerência, sua coragem e sua compaixão são faróis em tempos sombrios. Seu exemplo mostra que é possível fazer política com ética, com afeto e, sobretudo, com convicção. Ele nunca abandonou seus ideais, mesmo quando a vida tentou dobrá-lo. Continuou fiel à sua causa, à sua visão de mundo, à esquerda que não tem vergonha de lutar por justiça, igualdade e liberdade.
Pepe Mujica nos lembra que a verdadeira revolução começa dentro de nós. Que não é necessário ódio para transformar o mundo, e que é possível ser radical sem ser extremista. Que se pode discordar sem desumanizar. Que podemos — e devemos — sonhar com um mundo melhor, mas com os pés fincados na terra, trabalhando por ele todos os dias.
Nesta homenagem, o TMNews do Vale se curva diante da grandeza discreta de um homem que jamais buscou aplausos, mas os mereceu em cada gesto. Que nunca quis ser ídolo, mas tornou-se inspiração. Que nunca se rendeu às tentações do poder, porque sua convicção sempre foi maior que qualquer cargo.
Obrigado, Pepe Mujica. Por sua história. Por sua luta. Por sua humanidade.
(*) Professor e analista político
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