Greve de fome. Sim, você leu certo. Em pleno século XXI, em uma democracia supostamente madura, um parlamentar decide que a melhor maneira de provar sua inocência é… parar de comer. Não apresentar documentos, não sustentar argumentos, não encarar o processo com dignidade. Não. Ele fecha a boca e se deita numa maca como se estivesse na porta de um presídio político da década de 70. Drama? Pouco. É praticamente uma novela das nove com roteiro de quinta categoria.
O sujeito tem salário de cinco dígitos, gabinete com ar-condicionado, verba indenizatória, carro oficial, e ainda quer posar de mártir. Uma figura pública, acusada de infringir regras claras do jogo político, resolve se colocar como vítima da opressão... de um processo de cassação conduzido por seus próprios pares! É quase poético, se não fosse tragicômico.
E o mais curioso é que a tática do “vou morrer se vocês fizerem isso comigo” parece ter algum apelo. Há sempre quem apareça chorando e quem diga “mas vejam o estado dele”, como se o estado emocional de um parlamentar culpado ou inocente fosse um critério para decidir se ele deve continuar legislando ou não. Quer dizer então que agora bastou fazer biquinho e ficar sem almoço pra virar herói nacional?
Em vez de debater a conduta do parlamentar, o foco vira o jejum, a glicose baixa, os boletins médicos. O Brasil, país do futebol e da novela, agora também é o país do reality show político em tempo real. A única coisa que falta é o apresentador dizendo “vota, Brasil, pra decidir se ele continua ou sai do Congresso!”
A gente poderia rir, se não fosse tão triste. Ou melhor — a gente ri porque é triste. A política nacional virou um teatro, onde o ridículo não é mais o limite. É o roteiro. E nesse espetáculo de absurdo, quem perde não é o parlamentar faminto — somos nós, o público pagante.
Quando um parlamentar, eleito para representar o povo e zelar pela integridade das instituições democráticas, recorre a uma greve de fome não por uma causa coletiva, mas para evitar a própria cassação, o país entra em um território desconcertante entre o drama político e o absurdo institucional. Tal atitude — que em outros contextos já foi símbolo de luta contra ditaduras ou injustiças sociais — torna-se, neste caso, uma distorção grotesca de um gesto nobre, usado como último recurso para escapar de consequências legais e éticas.
A seriedade de um país se mede, entre outras coisas, pela robustez de suas instituições e pela responsabilidade de seus representantes. Quando um político tenta se esquivar de um processo legítimo usando um ato de autopiedade e apelo emocional, estamos diante de uma tentativa de manipulação da opinião pública. Ao invés de se defender com argumentos, provas e ética, escolhe-se o espetáculo, a vitimização.
É também sintomático de um sistema político fragilizado, onde o senso de impunidade é tão enraizado que atos extremos, mesmo que ridículos, são tentados como tática de sobrevivência. Afinal, se o parlamentar está convencido de que sua cassação é injusta, deveria enfrentá-la com serenidade, munido de sua defesa, não com chantagens morais.
Essa situação revela um problema mais profundo: a banalização da política. O gesto extremo do jejum, que já foi símbolo de resistência de figuras como Gandhi ou presos políticos em regimes autoritários, é reduzido a um artifício midiático. Isso empobrece o debate público, desinforma a população e corrói a credibilidade das instituições.
Um país sério precisa de políticos que respeitem as regras do jogo democrático, que compreendam que mandato é dever antes de ser privilégio, e que honrem seus cargos com responsabilidade. Usar o corpo como escudo contra a justiça não é heroísmo, é desespero — e, pior, é um sintoma claro de que algo está muito errado no modo como encaramos a política.
Imaginem se essa moda pega!
(*) Professor e analista político
Não
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