O Brasileiro honesto na mira das fraudes: quando a malandragem vira armadilha cotidiana

 



(*) Bruno Cesar

Dados recentes, divulgados pelo Instituto Locomotiva e pela Febraban, mostram uma realidade alarmante: mais da metade dos brasileiros já foi vítima de algum tipo de fraude ou golpe. Em um país onde a criatividade e a improvisação são marcas culturais, o “jeitinho brasileiro” que tantas vezes é celebrado, parece ter descambado, em parte, para alimentar uma engrenagem criminosa que faz da vida do cidadão honesto um verdadeiro campo minado.

Fraudes bancárias, golpes digitais, compras online fantasmas, clonagem de cartões, falsos boletos, links maliciosos, falsas centrais de atendimento e uma infinidade de outras modalidades já fazem parte do vocabulário comum do brasileiro. O preocupante é que tais práticas não são apenas resultado de oportunismo isolado, mas sim de uma estrutura que se alimenta de uma cultura de tolerância à esperteza, muitas vezes confundida com inteligência ou capacidade de “se virar”.

O problema não se resume à presença de criminosos disfarçados de vendedores, atendentes ou consultores financeiros. Está enraizado no dia a dia. Por décadas, a imagem do “malandro simpático” foi romantizada no teatro, na música, na televisão e nas conversas de bar. Era o personagem que burlava regras, enganava “os poderosos” e sempre levava vantagem, arrancando risadas e admiração. Porém, na prática, essa romantização do “jeitinho” cobra um preço caro.

O brasileiro honesto se vê obrigado a desconfiar de tudo e de todos. Precisa pensar duas vezes antes de clicar em uma mensagem, de preencher um formulário ou de atender uma ligação. O cidadão comum, que trabalha, consome e paga impostos, tem que lidar com uma rotina exaustiva de cuidados para não cair em mais um golpe. Não bastasse o custo emocional de viver em permanente estado de alerta, há o custo financeiro direto: cerca de R$ 33 bilhões foram perdidos com fraudes apenas no ano passado, segundo a pesquisa citada.

Essa dificuldade em separar a esperteza legítima da trapaça deliberada cria um ambiente de insegurança. Se, por um lado, o “jeitinho” ajudou muitos a sobreviver em tempos difíceis, por outro, tornou-se o álibi de quem justifica pequenos delitos ou mesmo grandes esquemas de fraude, sob o pretexto de que “todo mundo faz”.

A consequência? Um ciclo vicioso onde quem tenta agir corretamente se sente cada vez mais sozinho, vulnerável e pressionado a se adaptar ou, pior, a normalizar pequenos desvios. O brasileiro honesto, que evita furar filas, que respeita regras, que paga o que deve, acaba sendo tratado quase como ingênuo num ambiente onde se exalta quem “sabe se virar”.

Portanto, mais do que campanhas contra fraudes e mais tecnologia de segurança, o Brasil precisa de um movimento cultural e ético que recoloque a honestidade no centro das relações. Desromantizar a malandragem e valorizar a integridade não é só uma questão de princípios, é uma necessidade urgente de sobrevivência em uma sociedade cada vez mais refém de golpistas travestidos de espertos.

O desafio está posto: como proteger o cidadão honesto quando a própria cultura flerta com a trapaça? Enquanto não se responder a essa pergunta de forma coletiva, o brasileiro seguirá, sozinho, driblando obstáculos para não ser a próxima vítima.

(*) Bruno César Teixeira de Oliveira, com uma carreira sólida na gestão de riscos, compliance e prevenção a fraudes em instituições financeiras. Colunista do site carioca O Boletim.


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