A Constituição de 1988 reproduz nossa tradição republicana de instituir os três poderes de Montesquieu, “independentes e harmônicos”, coisa que nunca foram. Em virtude dessa impossibilidade real, durante quase todo o século passado, as Forças Armadas se assumiram como poder moderador, intervindo quando a desarmonia alcançava o ponto de ruptura. Isso era bom? Não, era apenas o inevitável reflexo de uma inconsistência do modelo institucional.
Agora, aparentemente, os poderes de estado vivem momento de “harmonia”. Há um poder que manda e os demais obedecem sinfonicamente. Isso é bom? Não, é apenas uma nova manifestação da mesma e persistente inconsistência. Nestes dias, trocou-se a farda pela toga e o STF irrompeu na cena com a primazia entre os poderes.
O fato, bem incomum na história dos povos, é reflexo de circunstâncias políticas atípicas e se estruturou com base num conflito real. Ele surgiu quando as redes sociais provocaram o fim daqueles anos reconhecidos por um ministro do STF como o tempo em que “éramos felizes e não sabíamos”. Graças às redes, os anos decorridos entre o desastre econômico produzido pela sequência de governos petistas e o término do mandato de Jair Bolsonaro foram marcados por notável alarido popular. No ruidoso coro de dezenas de milhões de vozes, surdos os poderes de Estado, os cidadãos passaram a falar por si mesmos.
Acabaram ali o teatro das tesouras e o falso Bang Bang, de pistolas de rolha (ou seriam espadas de plástico?) longamente ensaiado entre PT e PSDB. No seio da extrema esquerda orgânica surgiu, então, a reação que se foi fazendo sentir de modo crescente. Os três poderes de Estado se uniram num mecanismo de proteção recíproca. “Todos por um e um por todos!”, clamaram como mosqueteiros, desembainhando as espadas reais da repressão. A tarefa de intimidar, “prender e arrebentar” a vida de muitos ficou com o poder sem votos, cujas decisões devem ser obedecidas.
A maioria do Congresso, a despeito da brilhante e honrada minoria, abastece seu poder na monetização dos mandatos mediante emendas parlamentares que causam repulsa nacional, mas geram crédito em votos junto às bases. Por outro lado, como macaquinhos de meme, avançam com cada um segurando o rabo do outro. Pode fazer mal à saúde confrontar a Suprema Corte.
O governo, em caso de dificuldades com o Congresso, tem sólida e grata maioria entre os onze ministros para “empurrar a história!” graças ao inédito e “vertiginoso” protagonismo político do Judiciário. Por isso, pautas da esquerda brasileira barradas no Legislativo por falta de apoio são levadas ao Supremo que, com gosto e sem constrangimento, cumpre essa função alegando omissão do Legislativo. Na verdade, o que acontece nesses casos, é mais simples: o Congresso decidiu preservar as normas vigentes – sobre aborto ou Marco Civil da Internet, por exemplo – com a redação que legislaturas anteriores lhes deram. Não se trata de omissões do Poder Legislativo, mas de intromissões do Poder Judiciário querendo impor a opinião de sua pequena maioria ou mesmo monocraticamente, sobre temas decididos pelo Congresso Nacional…
O STF, por sua vez, sente-se bem protegido pelo medo que infunde e pelos aplausos do governo e do jornalismo militante a quaisquer medidas que relativizem a liberdade de opinião e expressão nas redes sociais e nas tribunas do Parlamento.
Como se vê, está como o diabo gosta, mas ele não é o Senhor da História.
(*) Arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras. Escreve, semanalmente, artigos para vários jornais do Rio Grande do Sul, entre eles Zero Hora, além de escrever o seu próprio blog e em outros websites de expressão nacional, a exemplo do Mídia Sem Máscara, Diário do Poder, Tribuna da Internet. Sua coluna é reproduzida por mais de uma centena de jornais.
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