BRASÍLIA
- O presidente da Câmara, Arthur
Lira (PP-AL), enviou para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) nesta
sexta-feira, 16, duas Propostas de Emenda à Constituição (PEC) que limitam o
poder do Supremo Tribunal Federal (STF). O movimento ocorre após a Corte formar maioria no plenário para manter a decisão
do ministro Flávio Dino de suspender as emendas parlamentares ao Orçamento.
O magistrado exigiu que o Congresso crie regras para a execução desses recursos
que observem requisitos de transparência, rastreabilidade e eficiência.
Uma
das PECs, de autoria do senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) e que já
passou no Senado, limita as decisões monocráticas de ministros do STF. A
proposta foi aprovada no ano passado no Senado. Estava na gaveta de Lira desde
dezembro e dali não saiu. Segundo a assessoria de Lira, ele assinou o despacho
na quarta-feira, 14, mas só nesta sexta-feira, 16, foi registrado no sistema da
Câmara. Naquele dia, Dino havia assinado decisão suspendendo as chamadas
emendas impositivas, aquelas em que o governo federal é obrigado a enviar os
recursos para cidades e estados indicados pelos parlamentares.
A
outra, apresentada pelo deputado Reinhold Stephanes (PSD-PR), permite que o
Legislativo suste decisões da Corte pelo voto de dois terços da Câmara e do
Senado. O texto foi apresentado em julho deste ano e também aguardava um
despacho do presidente da Câmara.
“Nas
decisões do Supremo Tribunal Federal, no exercício da jurisdição constitucional
em caráter concreto ou abstrato, se o Congresso Nacional considerar que a
decisão exorbita do adequado exercício da função jurisdicional e inova o
ordenamento jurídico como norma geral e abstrata, poderá sustar os seus efeitos
pelo voto de dois terços dos membros de cada uma de suas Casas Legislativas,
pelo prazo de dois anos, prorrogável uma única vez por igual período”, diz a
PEC de Reinhold. A proposta também define que os relatores de processos nos
tribunais superiores devem submeter imediatamente para decisão colegiada as
medidas cautelares “de natureza cível ou penal necessárias à proteção de
direito suscetível de grave dano de incerta reparação, ou ainda destinadas a
garantir a eficácia da ulterior decisão da causa”. A medida cautelar, de acordo
com o texto, teria de ser inserida na sessão subsequente do plenário.
A
PEC do Senado veda as decisões monocráticas de ministros que suspendam eficácia
de leis e atos dos presidentes da República, do Senado e da Câmara, exceto
durante o recesso do Judiciário em casos de grave urgência ou perigo de dano
irreparável. Nessas hipóteses, as decisões precisarão passar pelo colegiado dos
tribunais em até 30 dias após o fim do recesso. Comissão Mista de Orçamento deu
primeiro recado
Com
as emendas Pix bloqueadas por decisão de Dino, a primeira reação do Congresso
veio na quarta-feira, 14. A Comissão Mista de Orçamento rejeitou Medida Provisória (MP)
que previa recomposição orçamentária de R$ 1,3 bilhão para o Poder Judiciário e
o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). Naquele dia, o único
deputado a criticar o movimento contra o Judiciário foi Orlando Silva
(PCdoB-SP).
“Objetivamente,
me parece uma resposta política a uma decisão manifestada por um ministro do
Supremo Tribunal Federal”, disse Orlando. “A resposta baseada em uma reação
intempestiva não ajuda. Deveríamos ter resposta, se necessário for, baseada na
razão. Se erro foi cometido pelo Supremo, (com) outro erro do Parlamento, somar
dois erros não produz um acerto”, emendou.
Lira
já havia demonstrado publicamente desconforto com as decisões de Flávio Dino.
“Não podem mudar isso, com todo o respeito, num ato monocrático, quaisquer que
sejam os argumentos e as razões, por mais que elas pareçam razoáveis”, afirmou
na última terça-feira, 13, durante jantar das Santas Casas, ao defender a
autonomia do Congresso para enviar emendas.
O
presidente do STF, Luís Roberto Barroso, negou nesta sexta-feira o pedido do
Congresso e de 11 partidos políticos para que a decisão de Dino sobre as
emendas fosse derrubada. No recurso à Corte, a Câmara e o Senado disseram que a
determinação do ministro “viola patentemente” a separação entre os Poderes e
causa “dano irreparável à ordem jurídica”.
Deputados
e senadores chegaram a prever para esta semana a votação de mudanças nas
chamadas emendas Pix para dar mais transparência nos repasses. A análise
ocorreria na Comissão Mista de Orçamento (CMO), mas o item foi retirado de
pauta após a nova decisão de Dino e, em vez disso, foi rejeitada uma Medida
Provisória que aumenta a verba para o Judiciário, em retaliação ao STF.
Até
então, o ministro havia suspendido apenas a operação das emendas Pix, que são
uma parte das emendas individuais. A nova decisão, contudo, afeta todas as
individuais e também as emendas de bancada estadual. Dino já havia pedido mais
transparência nas emendas de comissão, que não são impositivas.
A
ideia do Congresso é delimitar o objeto das emendas Pix, ou seja, explicitar
para qual fim o dinheiro está sendo usado (para qual obra ou política pública
específica). Hoje, não fica claro como as prefeituras estão usando as verbas,
embora o nome do deputado que enviou a emenda possa ser identificado.
Emendas
parlamentares são recursos no Orçamento da União que podem ser direcionados
pelos deputados e senadores a seus redutos eleitorais. Hoje, existem três
modalidades: as emendas individuais, a que cada deputado e senador tem direito,
as de bancada estadual e as de comissão. As duas primeiras são impositivas, ou
seja, o pagamento é obrigatório, embora o governo controle o ritmo da
liberação.
As
emendas Pix (batizadas com esse nome em referência ao sistema de pagamento
instantâneo criado pelo Banco Central) são uma forma de manejar as emendas
individuais e permitem a destinação direta de recursos federais a Estados e
municípios sem controle e fiscalização.
O
pano de fundo do imbróglio é uma disputa de poder entre o Executivo e
Legislativo, arbitrada pelo Judiciário. O orçamento secreto foi declarado
inconstitucional pelo STF após a eleição do presidente Luiz Inácio Lula da
Silva, mas parte dos recursos continuou nas mãos do Congresso, após um acordo
feito com o Planalto.
Agora,
os parlamentares veem nova ofensiva do governo federal, em aliança com o
Judiciário, para retomar mais poder sobre o Orçamento. Principalmente porque
Dino foi indicado por Lula para a Corte.
Estadão
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