Os
ministros Luis Roberto Barroso e André Mendonça bateram boca no início da
sessão desta quinta-feira (20) do STF (Supremo Tribunal Federal), em que os
ministros julgaram a descriminalização do porte de maconha.
O que aconteceu
O
STF voltou a julgar hoje se o artigo 28 da Lei de Drogas é inconstitucional.
Ele considera crime o porte de drogas para uso pessoal e prevê medidas
alternativas de punição, como prestação de serviços à comunidade. Após o voto
de Dias Toffoli, a sessão foi suspensa, e o julgamentos será retomado na terça
(25)
Barroso, que é presidente do STF, abriu a sessão trazendo uma explicação sobre o caso. Ele quis destacar que o Supremo não está legislando nem legalizando o consumo de drogas.
O
ministro disse que recebeu uma ligação do presidente da CNBB (Conferência
Nacional dos Bispos do Brasil), dom Jaime Spengler, questionando se o STF
liberaria as drogas. Barroso, então, respondeu que não e disse que havia uma
certa "desinformação" da sociedade sobre o tema.
"Gostaria de reiterar um esclarecimento muito importante. O STF considera, tal como a legislação em vigor, que o consumo, o porte de drogas mesmo pra consumo pessoal, é um ato ilícito. Portanto, o STF não está legalizando a droga. O Supremo mantém o consumo como um comportamento ilícito. E todos nós aqui educamos nossas famílias numa cultura para o não consumo de drogas. O consumo de maconha continua a ser considerado um ato ilícito, porque esta é a vontade do legislador. O que nós estamos discutindo são duas questões: primeira é se deve ser tratado como ato ilícito de natureza penal ou ato ilícito de natureza administrativa." (ministro Luis Roberto Barroso, presidente do STF)
Barroso ainda citou que a falta de uma legislação mais clara causa desigualdade na abordagem de quem porta drogas.
"Segunda questão é qual a quantidade que diferencia porte para consumo pessoal de tráfico. E a razão para fazermos isso é a necessidade de criarmos um critério objetivo, porque na falta de critério, a mesma quantidade de drogas nos bairros mais elegantes das cidades brasileiras é tratada como consumo e na periferia é tratada como tráfico. O que nos queremos é acabar com essa discriminação entre ricos e pobres, basicamente entre brancos e negros." (ministro Luis Roberto Barroso, presidente do STF)
O
ministro André Mendonça, que participou da sessão de maneira virtual, pediu a
palavra e rebateu o colega, dizendo que o STF estava passando por cima do poder
Legislativo. Disse ainda que, em se tratando de um ato administrativo,
precisariam definir quem faria a fiscalização. E falou que o presidente da CNBB
não estava errado.
"Acho que ele não tem a informação incorreta, não. A informação é essa mesma. A grande verdade é que nós estamos passando por cima do legislador. O legislador definiu que portar drogas é crime. Decidir que é ato administrativo é passar por cima do legislador. Nenhum país do mundo fez isso por decisão judicial. E a grande pergunta que fica sobre o ato administrativo é: quem vai processar? Quem vai condenar? Essa determinação tem que ser tomada pelo legislador” (ministro André Mendonça)
Em
tom mais alto, Barroso cortou o colega, dizendo que a explicação dada
anteriormente estava correta. "Vossa Excelência acabou de dizer o que eu
disse, mas em tom mais panfletário", afirmou o presidente. "Minha
explicação foi absolutamente corretíssima sobre o que está sendo decidido
aqui". Depois, passou a palavra a outros ministros.
Alexandre
de Moraes reiterou as palavras de Barroso. O ministro citou números sobre
abordagens de porte de drogas em São Paulo e disse que, diferentemente do que
dizem os críticos do projeto, a quantidade de maconha apreendida não deve ser a
única baliza para determinar se o cidadão é usuário ou traficante.
"Todo mundo palpita, e pouca gente conhece essas questões. Eu quero que alguém me indique quantos usuários são levados à delegacia e tem aplicada alguma sanção. Não é isso que ocorre. Essa questão de quem vai fiscalizar, se vai ser a Anvisa, no mundo real não é isso que ocorre. (...) Houve uma reação a partir dessa lei, uma reação difusa, mas extremamente coordenada, de polícia, Judiciário e MP. Como usuário não pode ser punido, o que antes polícia, Ministério Público e Judiciário entendiam como uso passou a ser tipificado como crime "(ministro Alexandre de Moraes)
Os
ministros Kassio Nunes Marques e Luiz Fux também se manifestaram. No total, o
debate entre os magistrados levou mais de 40 minutos, até que Dias Toffoli foi
chamado a dar o primeiro voto do dia.
O
julgamento
O
julgamento começou em 2015 e já foi suspenso quatro vezes por pedidos de vista.
Até agora, cinco ministros votaram a favor da descriminalização do porte de
drogas, três votaram contra a descriminalização e Dias Toffoli abriu uma nova
interpretação.
Votaram a favor da descriminalização do porte de maconha:
Gilmar
Mendes
Luis
Roberto Barroso
Edson
Fachin
Rosa
Weber (quando ainda era ministra. Por causa disso, seu sucessor, Flávio Dino,
não votou neste processo)
Alexandre
de Moraes
Votaram
contra a descriminalização do porte de maconha:
Cristiano
Zanin
André
Mendonça
Kassio
Nunes Marques
Votou
para que o porte não seja crime, mas seja passível de medidas alternativas
Dias
Toffoli
Ainda não votaram:
Luiz
Fux
Cármen Lúcia
Os
ministros ainda devem definir qual é a quantidade permitida para o usuário.
Eles vão deliberar sobre a quantidade de maconha que uma pessoa pode portar
para uso próprio sem que isso seja considerado tráfico de drogas, que continua
sendo ilegal.
A Lei de Drogas não deixa claros quais são os critérios para definir usuário e traficante. Com isso, na prática, acabava ficando a cargo das autoridades locais, como polícia, Ministério Público e o juiz, definirem se a pessoa que estava com drogas era usuário ou traficante. O STF agora estabelece critérios para padronizar as abordagens policiais no país.
Os
ministros definiram que a descriminalização se restringe apenas ao porte de
maconha. A sugestão foi do ministro GIlmar Mendes, relator do caso, sendo seguido
pelos outros magistrados.
Judiciário
x Legislativo
O julgamento pode aumentar a tensão do STF com o Congresso. Isso porque o Senado estava discutindo uma PEC de autoria do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que criminaliza o porte e a posse de drogas, em entendimento oposto ao definido hoje pelo Supremo.
A
proposta teve tramitação paralisada no Senado em março. Na ocasião, os
parlamentares decidiram que iriam esperar o julgamento no Supremo para depois
retomar os debates sobre o assunto.
Fonte: Uol
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