O
presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), devolveu ao Executivo trechos
da medida provisória (MP) que limitava o uso de créditos de PIS e Cofins pelas
empresas. O ato, grave, costuma ser adotado com muita parcimônia pelos
presidentes do Congresso, pois sempre é visto como uma atitude simbólica a
expressar bem mais que uma mera discordância sobre o tema da MP em si.
A
MP – que, recorde-se, tem força de lei – foi a forma que o governo havia
encontrado para compensar a renúncia associada à desoneração da folha de
pagamento de 17 setores econômicos e dos municípios. Poucas vezes se viu o
setor privado tão contrariado com um governo – o atual ou qualquer outro. Foram
muitas as entidades representativas do agronegócio, indústria, comércio e
serviços, além de 27 frentes parlamentares, que se uniram para cobrar do
Congresso que rejeitasse a MP 1.227/2024 sem analisá-la.
O
senador mineiro já havia resistido à pressão de deputados, senadores, prefeitos
e empresas para devolver a MP da reoneração da folha, publicada em pleno
recesso parlamentar no dia 28 de dezembro. Não se pode, portanto, acusar
Pacheco de intransigência nem de agir de maneira intempestiva. Um dia antes,
ele chegou a sinalizar ao presidente Lula da Silva que devolveria parte da MP
caso o governo não indicasse uma alternativa.
A
forma como o anúncio foi feito expôs o ministro Fernando Haddad a uma fritura
sem precedentes. Ao lado de Pacheco, sentado à mesa da presidência, o líder do
governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), poderia ter assentido em silêncio,
mas agradeceu a Pacheco, disse que seu ato interrompia o que seria “uma
tragédia sem fim” e foi além. Afirmou que a medida tinha “o aplauso” do
presidente Lula.
Jaques
Wagner, por óbvio, não falava apenas por si mesmo. Como mostrou o Estadão,
o governo, quando se deu conta do tamanho do problema gerado pela MP, optou por
recuar e deixar o ministro Haddad e sua equipe na chuva. A empresários, o
ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa, disse desconhecer o impacto da
proposta sobre o setor produtivo. Já os ministros do Planejamento, Simone
Tebet, e do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, o vice-presidente
Geraldo Alckmin, indicaram não terem sido consultados sobre o teor do texto.
Mais
do que uma afronta ao governo, portanto, a impugnação de trechos da MP foi a
imposição de uma derrota acachapante a Haddad e sua agenda econômica. Por meio
dela, os parlamentares deixaram claro que a estratégia de recuperação de
receitas e recomposição da arrecadação defendida pelo ministro, apoiada e
aprovada muitas vezes ao longo do ano passado, atingiu o limite.
A
ausência do ministro, que estava no Vaticano para encontrar o papa Francisco,
não ajudou. Se Haddad tivesse explicado e negociado o teor da MP com as
lideranças da Câmara e do Senado antes de encaminhá-la, talvez tivesse alguma
chance. Mas o fato de ter apelado ao Supremo Tribunal Federal (STF) para
garantir a compensação financeira pela desoneração da folha levou a disputa a
um outro patamar.
Haddad
disse que a Fazenda não tem plano B para a proposta impugnada e jogou a
responsabilidade por encontrar uma solução para a perda de arrecadação ao
Senado. Não será fácil encontrar maneiras de arrecadar R$ 26,3 bilhões no
espaço de pouco mais de 30 dias, e as possibilidades aventadas pelos
parlamentares, como a repatriação de recursos no exterior e o uso de dinheiro
esquecido em contas judiciais, não parecem promissoras nem suficientes.
Haddad
tem do seu lado o STF, que endossou a liminar concedida pelo ministro Cristiano
Zanin. Pelo entendimento da Corte, se não houver medida compensatória, a
reoneração volta a valer imediatamente.
No
fundo, está claro que era isso o que Haddad queria desde o início do debate,
razão pela qual pode reivindicar o título de “campeão moral” da discussão. Mas
o fato é que o ministro foi abandonado pelo presidente Lula em um dos momentos
mais críticos de sua gestão.
Há
que reconhecer que foi o próprio ministro quem não soube medir as consequências
de seus atos. Apostando na discórdia, tentou jogar os setores uns contra os
outros, mas obteve o oposto do que desejava e aglutinou todos contra si mesmo.
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