Por:
Kateryna Khinkulova e Victoria Prisedskaya / ,BBC World Service
A guerra na
Ucrânia completa dois anos em 24 de fevereiro, e não há razão para
acreditar que o conflito vai terminar em breve.
Nem
a Ucrânia,
nem a Rússia, tampouco os principais aliados de ambos os lados, veem qualquer
chance de um acordo de paz no momento.
Kiev
está convencida de que suas fronteiras internacionalmente reconhecidas devem
ser restabelecidas e que vai expulsar as tropas russas. Já o posicionamento de
Moscou segue sendo de que a Ucrânia não é um país propriamente dito, e as
forças russas vão continuar a avançar até que seus objetivos sejam alcançados.
A
seguir, vamos analisar o que está acontecendo agora, e o rumo que o conflito
pode tomar no futuro.
Quem
está ganhando?
Os
violentos combates continuam durante o inverno, custando muitas vidas a ambos
os lados.
A
linha de frente de combate se estende por 1.000 km — e sua forma mudou pouco
desde o outono de 2022.
Poucos
meses após a invasão em grande escala, há dois anos, a Ucrânia fez as forças
russas recuarem no norte e em torno da capital, Kiev. Retomou ainda grandes
partes do território no leste e no sul no fim daquele ano.
Mas,
agora, as forças russas estão entrincheiradas com fortificações resistentes, e
os ucranianos dizem que sua munição está acabando.
Muitos
veem um cenário de impasse militar – incluindo o ex-comandante-em-chefe
ucraniano, Valerii Zaluzhnyi, destituído recentemente do cargo, e vários
blogueiros militares russos pró-Kremlin.
Em
meados de fevereiro, as tropas ucranianas se retiraram da cidade de Avdiivka,
há muito tempo disputada, no leste.
As
forças russas consideraram isso como uma grande vitória – como Avdiivka está
estrategicamente posicionada, abriria caminho potencialmente para invasões mais
profundas.
Kiev
disse que a retirada visava preservar a vida dos seus soldados, e não escondeu
que suas forças estavam em menor número e com menos armas.
Foi
a maior conquista da Rússia desde que tomou Bakhmut em maio do ano passado. Mas
Avdiivka fica a apenas 20 km a noroeste de Donetsk, cidade ucraniana ocupada
pela Rússia desde 2014.
Um
avanço tão pequeno está longe da ambição inicial da Rússia em fevereiro de
2022, compartilhada por blogueiros militares e reiterada pela propaganda
estatal, de tomar a capital Kiev “em três dias”
Atualmente,
cerca de 18% do território ucraniano permanece sob ocupação russa, incluindo a
península da Crimeia, anexada em março de 2014, e grande parte das regiões de
Donetsk e Luhansk, no leste, que a Rússia tomou pouco depois.
O
apoio à Ucrânia está diminuindo?
Nos
últimos dois anos, os aliados da Ucrânia enviaram uma grande quantidade de
ajuda militar, financeira e humanitária ao país – sendo quase US$ 92 bilhões
provenientes de instituições da União Europeia e US$ 73 bilhões dos EUA até
janeiro de 2024, de acordo com o Instituto Kiel para a Economia Mundial.
Os
tanques, as defesas aéreas e a artilharia de longo alcance fornecidos pelo
Ocidente ajudaram substancialmente a Ucrânia.
Mas
o fluxo de contribuições diminuiu nos últimos meses, em meio ao debate sobre
por quanto tempo os aliados vão poder apoiar de forma realista a Ucrânia.
Nos
EUA, um novo pacote de ajuda de US$ 60 bilhões está parado no Congresso devido
a disputas políticas internas.
E
existe ainda o receio entre os aliados da Ucrânia de que o apoio dos EUA vai
diminuir se Donald Trump voltar à Casa Branca após as eleições presidenciais de
novembro.
Na
União Europeia, um pacote de ajuda de US$ 54 bilhões foi aprovado em fevereiro,
após muita discussão e negociação, especialmente com a Hungria, cujo
primeiro-ministro, Victor Orban, é um aliado de Putin que se opõe abertamente
ao apoio à Ucrânia.
Além
disso, a União Europeia está em vias de entregar apenas cerca de metade das
munições de artilharia que pretendia fornecer a Kiev até o final de março de
2024.
Os
países que apoiam a Rússia incluem seu vizinho Belarus, cujo território e
espaço aéreo foi usado para acessar a Ucrânia.
O
Irã vem fornecendo drones Shahed à Rússia, dizem os EUA e a União Europeia,
embora o Irã apenas admita ter fornecido um pequeno número de drones à Rússia
antes da guerra.
Os
veículos aéreos não tripulados (Vant), mais conhecidos como drones, se
revelaram eficazes para atingir alvos na Ucrânia – em uma guerra em que há uma
demanda por drones de ambos os lados devido à sua capacidade de escapar das
defesas aéreas.
As
sanções não funcionaram tão bem quanto os países ocidentais esperavam, e a
Rússia ainda consegue vender seu petróleo e obter peças e componentes para sua
indústria militar.
Não
acredita-se que a China esteja fornecendo armas a nenhum dos lados. De uma
maneira geral, o país asiático adotou uma linha diplomática cuidadosa no que se
refere a esta guerra: não condenou a invasão russa, mas tampouco apoiou Moscou
militarmente — embora tenha continuado a comprar petróleo russo, assim como a
Índia.
Tanto
a Rússia quanto a Ucrânia também se empenharam bastante em cortejar países em
desenvolvimento, incluindo uma série de visitas diplomáticas à África e à
América Latina.
Os
objetivos da Rússia mudaram?
Acredita-se
amplamente que o presidente russo, Vladimir Putin, ainda quer toda a Ucrânia.
Em
entrevista recente ao apresentador de talk show americano Tucker Carlson, Putin
– que não foi contestado – expôs mais uma vez sua visão distorcida da história
e do conflito.
Ele
argumenta há muito tempo, sem fornecer evidências sólidas, que os civis na
Ucrânia – especialmente na região de Donbas, no leste – necessitam de proteção
russa.
Antes
da guerra, ele escreveu um longo artigo que negava a existência da Ucrânia como
um Estado soberano, dizendo que russos e ucranianos eram “um só povo”.
Em
dezembro de 2023, ele declarou que seus objetivos para o que a Rússia chama de
“operação militar especial” permaneciam inalterados, incluindo a
“desnazificação” – que se baseia em alegações infundadas sobre a influência da
extrema direita.
Ele
também diz que quer a “desmilitarização” e uma Ucrânia “neutra”, e continua a
protestar contra a expansão da influência da Organização do Tratado do
Atlântico Norte (Otan) para o leste.
Como
um Estado independente, a Ucrânia nunca pertenceu a nenhuma aliança militar.
Seus objetivos políticos incluíam a adesão à União Europeia, e o país estava em
negociações para estreitar os laços com a Otan – ambas as perspectivas parecem
agora mais próximas do que no início da guerra.
Estes
objetivos procuravam fortalecer o Estado da Ucrânia e protegê-la de ser
arrastada para qualquer projeto geopolítico que visa restaurar a União
Soviética de alguma forma.
Como
a guerra poderia terminar?
Dado
que nenhum dos lados parece propenso a se render, e que Putin parece
determinado a permanecer no poder, as previsões dos analistas tendem a crer em
uma guerra prolongada.
O
centro de pesquisa de segurança global Globsec combinou as opiniões de dezenas
de especialistas para avaliar a probabilidade de diferentes desfechos.
O
cenário mais provável é de uma guerra de atrito, também conhecida como guerra
de exaustão, que se estenderia para além de 2025, com fortes baixas de ambos os
lados, e a Ucrânia continuando a depender do fornecimento de armas de aliados.
O
segundo cenário mais provável inclui potenciais escaladas de conflitos em
outras partes do mundo, como no Oriente Médio, na China-Taiwan e nos Balcãs –
com a Rússia tentando exacerbar as tensões.
Dois
outros cenários em potencial, ambos considerados igualmente prováveis, seriam a
Ucrânia realizar algum avanço militar, mas nenhum acordo ser alcançado para
acabar com a guerra – ou a ajuda dos aliados da Ucrânia diminuir, e eles
pressionarem o país a chegar a uma solução negociada.
Permanece
a incerteza, no entanto, tanto sobre o potencial impacto das eleições
presidenciais dos EUA, assim como sobre a forma como outras guerras,
especialmente o conflito Israel-Hamas, vão afetar as prioridades e alianças dos
apoiadores da Ucrânia e da Rússia.
O
conflito poderia se alastrar ainda mais?
Em
meados de fevereiro, o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, advertiu que
manter a Ucrânia num “déficit artificial” de armas ajudaria a Rússia.
Ele
disse numa conferência de segurança internacional, em Munique, que Putin
tornaria os próximos anos “catastróficos” para muitos outros países se o mundo
ocidental não o enfrentasse.
O
centro de pesquisa Royal United Services Institute (Rusi) afirma que a Rússia
conseguiu fazer a transição da sua economia e indústria de defesa para ampliar
a produção militar, e está se preparando para uma guerra longa. Diz ainda que a
Europa não está acompanhando o ritmo — preocupação levantada também pelo
ministro das Relações Exteriores da Polônia.
Países
europeus — incluindo alertas feitos pelo ministro das Relações Exteriores da
Alemanha e pelo serviço de inteligência da Estônia — manifestaram recentemente
receio de que a Rússia possa atacar um país da Otan na próxima década.
Isso
levou a Otan e a União Europeia a acelerar seu planejamento para o futuro,
tanto em termos de capacidade militar como de preparação das sociedades para
viver num mundo bem diferente.
Fonte: BBC News Brasil
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