(*) Autor: Martin Kuebler
A desinformação climática consiste no compartilhamento de informações falsas ou de dados atuais pré-selecionados sobre as emissões de combustíveis fósseis ou sobre as mudanças climáticas, o que inclui a omissão dos dados completos sobre esses temas, potencialmente influenciando a opinião de muitas pessoas
Isso ocorre não necessariamente de maneira proposital: a desinformação também pode ser resultado de enganos ou da má compreensão de um tema complexo.
Um
exemplo é a chamada greenwashing ("lavagem verde"), adotada por
algumas empresas para transmitir uma imagem de correção ecológica e de respeito
ao meio ambiente que não corresponde à realidade.
Algumas
empresas de vestuário, por exemplo, propagandeiam o uso de fibras naturais ou
renováveis e de embalagens recicláveis, ao mesmo tempo em que omitem a enorme
quantidade de roupas descartáveis e de baixa qualidade que produzem.
A
desinformação também ocorre quando negacionistas das mudanças climáticas e
outros grupos ou organizações publicam de maneira proposital informações falsas ou disseminam farsas no intuito de
avançar sua agenda contra a ciência do clima e as políticas governamentais
criadas em benefício do meio ambiente.
Prejuízos
à luta contra mudanças climáticas
Grandes
empresas petrolíferas como Shell, Exxon Mobil e BP, juntamente com a chamada
Coalizão para o Clima Global – um grupo de fachada dissolvido em 2022 que
reunia quatro empresas associadas à indústria dos combustíveis fosseis – foram
acusadas de promover campanhas de descrédito contra cientistas do clima e de
omitir seus investimentos em combustíveis fósseis através de lobbies e
propagandas com mensagens positivas desde o anos 1970.
Grupos
como a The Empowerment Alliance ("Aliança do
Empoderamento") nos Estados Unidos ou a Responsible Energy Citizen
Coalition ("Coalizão de Cidadãos Responsáveis em Energia") na
Europa utilizam táticas como o chamado astroturfing – ações políticas
criadas de modo a parecer que são movimentos populares espontâneos – para
promover o uso de gás natural derivado de combustíveis fósseis e para
desacreditar políticas ambientais, sendo muitas vezes financiados por fontes
obscuras.
Desinformações
e mentiras também são publicadas em alguns veículos de imprensa ou promovidas
por políticos populistas. Quando as enchentes resultantes de um ciclone extratropical causaram
mais de 40 mortes no Rio Grande do Sul, em setembro de 2023, oposicionistas do
governo e até um jornalista bastante conhecido no país atribuíram as mortes a
abertura de comportas de três represas, numa tentativa de distrair a atenção
dos esforços para mitigar os efeitos extremos do aquecimento global e culpar o
atual governo federal pelo ocorrido. Umas das três barragens em questão nem
sequer têm comportas.
As
redes sociais e a manipulação de fotografias ou vídeos tornaram mais fácil a
disseminação desse tipo de desinformação, especialmente quando associadas a
teorias da conspiração, como nos ataques recentes à estratégia de planejamento
urbano chamada de cidades de 15 minutos – na qual as cidades seriam
planejadas de tal modo em que a maioria dos serviços e necessidades básicas dos
habitantes estariam localizados a 15 minutos de distância, a pé ou de
bicicleta, dos locais de moradia.
A Climate
Action Against Disinformation ("Ação Climática contra a
Desinformação"), uma coalizão global que trabalha no combate à
desinformação e à má compreensão dos fatos, concluíram que as postagens
negacionistas do clima com hashtags como #ClimateScam ("farsa
climática") aumentaram na rede social X (antigo Twitter) depois de a
plataforma ter sido adquirida pelo bilionário Elon Musk.
Nos
últimos anos, a desinformação também infiltrou a esfera dos tomadores de
decisões políticas. Um dos exemplos mais notáveis foram as repetidas críticas
do ex-presidente dos EUA Donald Trump às energias renováveis e sua negação à
ciência do clima antes e depois de ser eleito, com frequência classificando as
mudanças climáticas como "farsa".
Trump,
inclusive, retirou os EUA do Acordo Climático de Paris, de 2015, assinado por
mais de 190 países que se comprometeram a limitar o aquecimento global a 1,5ºC
em relação aos níveis pré-industriais. A decisão gerou um retrocesso de vários
anos nas ações climáticas dos EUA e, possivelmente, globais.
O
impacto da desinformação
Enquanto
isso, se esgota o tempo para a adoção de medidas para conter o aquecimento
global, em meio ao aumento das emissões de gases causadores do efeito estufa e
recordes sucessivos de temperaturas em todo o mundo.
A
maioria dos cientistas concorda que ações urgentes se fazem necessárias, embora
a desinformação resulte em questionamentos sobre a tese científica já
comprovada de que os humanos são a causa das mudanças climáticas, e crie dúvidas
que minam o apoio popular à defesa do clima.
Em
2022, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças do Clima da ONU (IPCC) reconheceu
pela primeira vez que a "retórica e desinformação sobre as mudanças
climáticas e a desautorização deliberada da ciência contribuíram para
percepções errôneas sobre o consenso científico, assim como para incertezas,
ignorância dos riscos e da urgência e para a discórdia".
Grupos
como a Climate Action Against Disinformation, governos como o da União
Europeia (UE) e organizações globais como a ONU, a Organização Meteorológica
Mundial e a Organização Mundial da Saúde (OMS), entre outras, trabalham para
denunciar e combater a desinformação.
Muitos veículos de imprensa também direcionam recursos para a cobertura jornalística sobre o clima, a fim de desfazer mitos e mentiras sobre as questões ambientais.
(*) Editor sênior da DW há mais de 10 anos em Bonn, Alemanha e em Bruxelas. Trabalhou anteriormente como jornalista em Toronto, Praga e Budapeste. Martin Kuebler é natural de Waterloo, Canadá, e tem mais de duas décadas de experiência editorial. Vive na Europa desde 2006, com reportagens da Europa Central e da Bélgica.
Fonte: Artigo publicado, originalmente, pelo DW Brasil
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