Por: Lucas Marchesini e Fábio Pupo/ Folha de São Paulo
Além
de pressionar as expectativas de inflação e a curva de juros, causando um
efeito reverso ao pretendido, as declarações do presidente Luiz Inácio Lula da
Silva e do PT contra o Banco Central (BC) têm sido permeadas por imprecisões e
exageros.
Apesar
de a autoridade monetária fazer mais referências à área fiscal agora do que sob
Bolsonaro mais até que durante o primeiro ano da pandemia de Covid-19, quando
as contas públicas registraram um rombo sem precedentes, citações a números
errados, reclamações de que a autarquia supostamente teria se calado no governo
anterior e a desconsideração sobre o risco inflacionário na artilharia contra
os juros representam tropeços que minam o discurso do partido.
A
presidente do PT, Gleisi Hoffmann, falou nos últimos dias que o BC não deu
"um pio" no ano passado sobre a elevação de gastos do governo
Bolsonaro em meio à corrida eleitoral. Mas as decisões do Comitê de Política
Monetária (Copom) do BC, comandado por Roberto Campos Neto, e as atas das
reuniões mostram o contrário.
"A
nota divulgada [pelo Copom sobre a decisão de manter juros e que cita o cenário
fiscal] está muito mais crítica ao governo do que acontecia no ano passado,
quando o Banco Central não deu um pio sobre as façanhas orçamentárias de
Bolsonaro para se reeleger", afirmou Gleisi em rede social.
Na
verdade, ao longo de 2022 o BC fez diferentes alertas sobre o cenário fiscal, a
ponto de gerar reclamações do então ministro Paulo Guedes (Economia), e ainda
elevou cinco vezes a taxa de juros (de 9,25% para 13,75%, percentual visto até
hoje). Desde o começo daquele ano, o Copom repetia, inclusive, os riscos que o
teto de gastos corria.
"O
Comitê reforça que a incerteza sobre o futuro do arcabouço fiscal do país e
políticas fiscais que sustentem a demanda agregada podem trazer um risco de
alta para o cenário inflacionário e para as expectativas de inflação",
afirmou o Copom em junho, por exemplo.
No
mês seguinte, foi promulgada pelo Congresso uma PEC (proposta de emenda à
Constituição) de interesse do governo Bolsonaro para turbinar benefícios
sociais em meio à corrida eleitoral até o fim daquele ano. O então presidente
estava em segundo lugar na disputa e as medidas poderiam ajudar sua
popularidade entre a população mais carente, tradicionalmente mais disposta a
votar em Lula.
A
medida aumentou os gastos do governo em R$ 41 bilhões em 2022. Foi elevado o
valor do Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600, foi expandido o Auxílio Gás,
foram criados benefícios para caminhoneiros e taxistas e liberadas outras
medidas.
Conforme
o tempo passava, novos comentários eram inseridos nos textos do BC. Em agosto
de 2022, em meio ao crescimento das especulações sobre a perpetuação das novas
despesas, o Copom considerou que o prolongamento delas poderia "elevar os
prêmios de risco do país e as expectativas de inflação à medida que [tais
medidas] pressionam a demanda agregada e pioram a trajetória fiscal".
Após
a vitória de Lula, o que pode ser observado pelos textos do Copom é que os
alertas feitos sobre o cenário fiscal se intensificaram.
Em
2022, o Copom fez referência às palavras "fiscal" e
"fiscais" no máximo 5 vezes em cada ata do Copom até setembro. Em
outubro, pouco antes do resultado das eleições, foram 7. Em dezembro, após a
vitória de Lula, as menções dobraram para 14 e, na mais recente (de fevereiro),
foram 15.
Até
então, o maior número havia sido em dezembro de 2020, quando o governo chegou a
um rombo histórico de R$ 743 bilhões no ano devido às medidas para enfrentar a
pandemia de Covid-19 e seus efeitos (foram 11 menções).
No
documento do fim do ano passado, o Copom se voltou ao novo governo adicionando
ao texto trechos em que dizia acompanhar "os desenvolvimentos futuros da
política fiscal e seus potenciais impactos sobre a dinâmica da inflação
prospectiva". Além disso, disse que havia "muita incerteza sobre o
cenário fiscal prospectivo" e que o momento demandava "serenidade na
avaliação de riscos".
Falou
ainda que o impacto para a inflação decorrente de estímulos fiscais
significativos "tende a se sobrepor aos impactos almejados sobre a
atividade econômica". E ainda levantou o risco de reversão de reformas,
que, para o Copom, poderia resultar em "uma alocação menos eficiente de
recursos" e "reduzir a potência da política monetária".
Com
algumas variações, o Copom manteve e até subiu o tom de alertas na ata mais
recente, divulgada em fevereiro mas adicionou um trecho em que cita o pacote
fiscal apresentado pelo governo para melhorar as contas públicas. O movimento
foi interpretado pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda) como uma mensagem mais
amigável do que o observado até então.
"O
comitê [...] reconhece que a execução de tal pacote atenuaria os estímulos
fiscais sobre a demanda, reduzindo o risco de alta sobre a inflação",
afirmou o Copom. O texto, contudo, ressalta em outro momento que será
importante "acompanhar os desafios" na implementação das medidas
anunciadas por Haddad.
Embora
possa se discutir o tom em cada momento, as atas mostram que a preocupação com
o cenário fiscal é presente nos recados do Copom ao longo dos últimos anos.
A
série de mensagens públicas trocadas entre petistas e BC continua. Nas redes
sociais, Gleisi disse recentemente que "as grandes economias controlam
inflação sem aumentar juros, menos o Brasil". Na verdade, mais de 40
países aumentaram os juros para conter a inflação ao longo de 2022.
Entre
eles, os Estados Unidos, cujo mais recente movimento aconteceu neste mês quando
o Federal Reserve (banco central americano) elevou sua taxa de juros em 0,25
ponto percentual. Apesar de o movimento marcar um retorno a aumentos mais
lentos, a taxa de referência está agora entre 4,5% e 4,75% o nível mais alto
desde setembro de 2007.
O
próprio Lula tem cometido uma série de imprecisões no debate. Neste mês,
criticou o BC por "esse aumento de juro" embora a taxa tenha sido
elevada antes das eleições (em agosto de 2022). O percentual está, desde então
(após quatro reuniões do Copom), inalterado.
Lula
também já afirmou duas vezes que a taxa de juros está em 13,5% (quando o
correto é 13,75%). Também reclama de ter sido estabelecida uma meta de inflação
de 3,7%, que ele considera exageradamente baixa (na verdade, a meta deste ano é
de 3,25%; e o objetivo de 3,75% foi fixado para o ano de 2021).
Ao
criticar a autonomia do BC, o presidente da República também já falou que o
país poderia "não ter nem juro". Juro real zero ou negativo é uma
possibilidade em algumas economias mais desenvolvidas, mas uma realidade ainda
difícil de ser alcançada em um país como o Brasil que tem um mercado de crédito
sob significativa inadimplência, é pressionado pela inflação e vive um cenário
fiscal de desconfiança.
O
juro real ou negativo também teria suas complexidades. Apesar de a princípio
incentivar empresas e pessoas a retirarem dinheiros dos bancos para que rendam
em outros tipos de investimentos, movimentando a atividade, parte dos
economistas vê efeitos colaterais, como para o sistema bancário do qual a
economia também depende.
Na
saraivada de ataques ao presidente do BC pelo patamar dos juros, o PT aponta os
dedos para a autoridade monetária desconsiderando em grande parte a pressão
inflacionária existente no país por diferentes fatores entre eles, os que
dependem do governo e que poderiam ajudar a reduzir as incertezas do cenário.
Na
lista, estão a decisão acerca da tributação sobre combustíveis, a efetiva
implementação do pacote de medidas para melhorar as contas públicas e a
apresentação da proposta do novo arcabouço fiscal que substituirá o teto de
gastos.
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