‘É muito feio Lula prometer desmatamento zero na Amazônia’, diz governador pró-Bolsonaro que se reunirá com Lula na COP27© Assecom
Reeleito
no primeiro turno com quase 70% dos votos, o governador do Mato Grosso, Mauro
Mendes (União Brasil), vai à COP27, a cúpula do clima das Nações Unidas, com a
seguinte mensagem: "Não podemos aceitar que o Brasil seja transformado no
bad boy ou o patinho feio do ambientalismo internacional".
Para
o governador, que é forte apoiador de Jair Bolsonaro, o Brasil faz
"mais" que a maioria dos demais países na preservação do meio
ambiente. E, apesar de ter piorado todos os seus indicadores ambientais na gestão
do atual presidente, não merece, segundo Mendes, ser criticado pela comunidade
internacional.
Nos
últimos três anos, o Brasil registrou a pior taxa de desmatamento em 15 anos, o
maior número de focos de incêndios em 10 anos e a maior taxa de emissão de
gases poluentes em 16 anos. A destruição recorde da Floresta Amazônica,
considerada crucial para o combate às mudanças climáticas, deteriorou a imagem
do Brasil no exterior e travou negociações comerciais do país com nações
europeias.
Mas
Mauro Mendes diz que vai à COP27 cobrar "respeito ao Brasil" e que os
países ricos cumpram a promessa de entregar US$ 100 bilhões por ano para
financiamento de ações de combate a mudanças climáticas em nações em
desenvolvimento.
"Eu
sou contra o desmatamento ilegal. O que eu acho que nós brasileiros não podemos
aceitar é que eles fiquem constantemente apontando o dedo para os nossos
problemas quando os deles são muito maiores", disse o governador, em
entrevista à BBC News Brasil.
Mendes
integra o consórcio de governadores dos nove Estados que abrigam floresta
amazônica. Eles vão se reunir com o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da
Silva, na quarta-feira (16), em Sharm El-Sheikh, no Egito, onde ocorre a
conferência da ONU.
Mas
essa reunião não deve ser só de afagos. Desde a vitória nas urnas, Lula vem
prometendo zerar o desmatamento na Amazônia, tanto o legal quanto o ilegal.
Atualmente, a legislação brasileira permite o desmate de 20% das propriedades
privadas nas áreas de floresta e exige a preservação de 80%.
A
maior oposição aos planos de Lula pode vir dos próprios governadores de
territórios onde há floresta amazônica, sobretudo os que apoiam Jair Bolsonaro
e reproduzem as ideias do presidente. Em Mato Grosso, Estado governado por
Mendes, 65% dos eleitores votaram em Bolsonaro no segundo turno.
Perguntado
pela BBC News Brasil o que acha da proposta de Lula de desmatamento zero na
Amazônia, Mendes disse que é um "atentado contra a nação" não
permitir a exploração das "riquezas da floresta".
"É
muito feio um presidente fazer uma proposta que é ilegal. Ele está fazendo uma
proposta ilegal", criticou.
"Nós
temos enormes riquezas minerais na região amazônica. Será desmatamento zero?
Nós vamos ficar 1 milhão de brasileiros passando fome sem poder explorar essas
riquezas. Se o Brasil fizer isso, é um atentado contra nossa própria nação. Nós
não podemos cometer um crime contra o nosso país."
Veja
os principais trechos da entrevista:
BBC
News Brasil - Qual vai ser o foco da sua participação na COP27? Que mensagem
vai levar à cúpula do clima?
Mauro
Mendes - Nós estamos fazendo um esforço muito grande para reposicionar a
verdade a respeito daquilo que nós fazemos no Mato Grosso e que nós fazemos no
Brasil. Mas eu não posso falar pelo Brasil, falo pelo meu Estado. Nós somos uma
região com grande capacidade de produção de alimentos. Nós somos o maior
produtor brasileiro das commodities agrícolas e preservamos 62% do nosso
território.
O
mundo tem hoje o desafio da segurança alimentar e o desafio da
sustentabilidade, das mudanças climáticas a da redução da emissão de carbono.
E, nesse quesito, o nosso Estado está muito bem posicionado. Somos um grande
produtor. Nenhuma outra região do planeta produz tantos alimentos como nós
produzimos no Brasil e tem tanta preservação. Então, essa é a principal
mensagem. E nessa linha, nós queremos defender mais respeito ao Mato Grosso e
ao Brasil. Outras partes do planeta precisam fazer pelo menos a metade do
esforço que nós fazemos para preservação ambiental.
BBC
News Brasil - Mas todos os indicadores ambientais do Brasil pioraram nos
últimos três anos. O Brasil registrou o pior desmatamento em 15 anos, a maior
taxa de emissão de CO2 em 16 anos e o maior número de focos de incêndio em 10
anos. De que maneira isso afeta a capacidade do Brasil de continuar nessa
liderança de exportação de produtos agro e de negociar com outros países?
Mauro
Mendes - Nós fazemos aqui um esforço muito grande, consistente e
verdadeiro para combater o desmatamento ilegal. O Estado do Mato Grosso tem a
melhor tecnologia hoje no Brasil para detectar e rapidamente aplicar aquilo que
a lei brasileira estabelece para esses infratores, que são as penalizações
administrativa e a responsabilização civil pelo Ministério Público. Hoje nós
conseguimos detectar no meu Estado em 48 horas qualquer desmatamento acima de
um hectare. Se ele é ilegal, nós atuamos com a autuação administrativa
imediatamente e em tempo real.
A
Floresta Amazônica nós compreendemos que ela é fundamental para a nossa
principal atividade econômica, que é o agronegócio, e contribui fortemente para
o regime de chuvas do meu Estado e a produção de alimentos. Eu acredito que o
mundo, apesar de ameaças constantes, não vai tirar o Brasil como um player de
fornecimento de commodities alimentares. No último ano, o preço de alimentos do
mundo subiu 30%. Se tirar o Brasil e sem a Rússia, o mundo estará disposto a
pagar esse preço de ter o preço de comida dobrado por conta de problemas aqui e
acolá?
Eu
acho que nós temos alguns problemas, sim. Existem coisas ilegais que tem de ser
combatidas. Agora, o mundo precisa reconhecer o tamanho do ativo que nós temos,
que os lugares do planeta têm, que o Brasil tem. Então, em vez de ficar
atirando pedra de lá para cá ou de cá para lá, nós temos que nos unir para
fazer o esforço que tem que ser de todos os lados, não só do Brasil.
BBC
News Brasil - O Brasil é sim um importante exportador de commodities e
dificilmente o mundo bloquearia por completo produtos brasileiros. Mas é um
fato que negociações internacionais ficaram travadas porque há uma resistência,
principalmente na União Europeia, de negociar com o Brasil diante da política ambiental
que existe hoje. Tanto é que o acordo comercial entre Mercosul e União Europeia
está paralisado. Na sua visão, o Brasil também precisa mudar a forma como está
lidando com a política ambiental ou não?
Mauro
Mendes - Acho que melhorias nós podemos e sempre devemos fazer em qualquer
política, seja ambiental ou qualquer outra atividade pública. Mas os países
ricos também não cumpriram sua promessa de pagar por serviços ambientais (em
nações em desenvolvimento). Aqueles 100 bilhões de dólares por ano anunciado em
diversas rodadas de negociação nunca saíram das falácias ou das conferências.
Os países desenvolvidos não estão cumprindo também com a sua parte, em fazer as
compensações, pagar pelos ativos ambientais de outras regiões do mundo, não só
o Brasil.
E
eu sou contra o desmatamento ilegal. Agora, o que eu acho que nós brasileiros
não podemos aceitar é que eles fiquem constantemente apontando o dedo para os
nossos problemas quando os deles são muito maiores. A emissão de carbono em
países desenvolvidos, como Estados Unidos, muitos da Europa e da China, é muito
alta e o esforço deles está sendo muito pequeno. Então, eu vejo que o Brasil
precisa melhorar as suas políticas de controle e o meu Estado é um exemplo
disso. Agora, o que nós não podemos aceitar é que o Brasil seja transformado em
um bad boy do ambientalismo internacional.
BBC
News Brasil - O senhor cita avanços no Mato Grosso, mas o Mato Grosso foi o
terceiro Estado com maior desmatamento entre os nove Estados que abrigam
Floresta Amazônica, segundo dados do Mapbiomas divulgados em julho e relativos
a 2021. O que explica isso?
Mauro
Mendes - Sempre vai ter alguém que vai ser o primeiro. Se alguém desmatar
três hectares, eu desmatar dois e alguém desmatar um, alguém vai ser o
primeiro, o segundo, e o terceiro. Essa forma de olhar para o número, de
abordar, ela talvez não seja a mais correta e mais justa. Temos que olhar nos
últimos 20 anos se o desmatamento está diminuindo. E se esse desmatamento é
legal ou ilegal. Se você olhar o recorte de 20 anos, Mato Grosso reduziu o
desmatamento ilegal em 85% e o legal está aumentando. Porque a lei brasileira
permite desmatar 20% no bioma amazônico. E isso precisa continuar. Senão, vão
transformar essa parte do Brasil numa grande floresta.
BBC
News Brasil - O presidente eleito, Lula, tem dado bastante ênfase na promessa
de mudança da política ambiental e chegou a falar em desmatamento zero - não só
o desmatamento ilegal, mas desmatamento zero na Amazônia. O que o senhor acha
dessa proposta?
Mauro
Mendes - Eu acho que é muito feio o presidente fazer uma proposta de algo
ilegal. Ele está fazendo uma proposta ilegal. Talvez ele não saiba disso, ou
talvez saiba. Ele pode até defender que ele vai tentar no Congresso Nacional
mudar a lei brasileira. Eu acho que ele sabe que é ilegal o que ele está
dizendo e é muito ruim começar apresentando uma proposta legal. Pode dizer: 'eu
sou contra e vou no Congresso Nacional tentar mudar a lei brasileira'. E vai
condenar milhões de brasileiros a viver no meio da floresta, passando fome como
hoje. Nós temos milhões de brasileiros no meio da Amazônia, numa região
extremamente pobre. Muitos passando na linha da pobreza.
BBC
News Brasil - O argumento ao propor desmatamento zero é o de que é possível
implementar atividades econômicas que não impliquem em desmatamento na
Amazônia. E, em outras regiões do Brasil, utilizar milhões de hectares que já
foram degradados e que atualmente estão improdutivos. Qual sua opinião sobre
esse argumento?
Mauro
Mendes - Tá bom. Nós temos enormes riquezas na região amazônica. Será
desmatamento zero? Nós vamos ficar 1 milhão de brasileiros passando fome, sem
poder explorar essas riquezas? É isso? Isso não tem a menor racionalidade.
Ninguém no planeta faz isso. Se o Brasil fizer isso, é um atentado contra nossa
própria nação. Vamos fazer uma conversa um pouco mais qualificada. Vamos
colocar na mesa, dando maior ou menor importância aos países que protegem 80%
do seu território. Eu até hoje não encontrei nenhum nessas conferências do
clima. Quando eu converso com alguns interlocutores, produtores, é difícil
conseguir preservar 80%. Alguém consegue entender o que é isso? E o Brasil
agora quer preservar 100%.
E
o que nós vamos ganhar com isso? O que o mundo vai pagar por isso? Só conversa
fiada. Pouco dinheiro realmente tem sido colocado na mesa para pagar por
serviços ambientais. Nós não podemos cometer um crime contra o nosso país.
Nessa conversa de meio ambiente, ficam tentando colocar a nós como o patinho
feio. Eu espero que nós, brasileiros, o presidente e a imprensa compreendam
isso.
-
Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/brasil-63617171
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