Foto divulgação
A
adoção pelo YouTube de critérios que combatam a desinformação no enfrentamento
da crise da Covid-19 encontra-se pautada por critério de razoabilidade.
Com
base nesse entendimento, a 22ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça
de São Paulo (TJ-SP) reformou sentença de primeiro grau para isentar o Google
da obrigação de recolocar no YouTube vídeos com desinformação sobre a Covid-19.
De
acordo com os autos, vídeos do canal da autora da ação foram removidos pelo
YouTube por violação às regras da plataforma. Nos vídeos, a autora defendia,
entre outros, o tratamento precoce da Covid-19 com hidroxicloroquina, remédio
sem eficácia comprovada contra a doença, além de propagar desinformação sobre a
vacina contra o coronavírus.
Em
razão de sua política contra fake news, o YouTube tirou os vídeos do ar, o que
levou a autora a acionar o Judiciário. Em primeira instância, o Google foi
obrigado a reinserir os vídeos, sob pena de multa diária de R$ 1,5 mil,
limitada a 30 dias. A empresa, representada pelo escritório Mattos Filho,
apelou ao TJ-SP e obteve decisão favorável.
Para
o relator, desembargador Campos Mello, não houve abuso de direito ou prática de
censura por parte do YouTube, mas apenas exercício regular de direito. "É
incontroverso que o conteúdo dos vídeos divulgados pela recorrida, apesar de
respaldado em opinião médica, colide frontalmente com as orientações da
Organização Mundial de Saúde (OMS)", afirmou.
O
magistrado disse ainda que o Google exerce sua atividade mediante livre
iniciativa, nos termos dos artigos 1º, IV, e 170, parágrafo único, da
Constituição da República: "Assim, no exercício da liberdade contratual e
amparada em sua autonomia privada, a recorrente pode, fundada em boa-fé e no
direito à prévia informação do outro contratante, estipular termos contratuais
que regerão a relação jurídica com os usuários de seu serviço. E foi exatamente
o que ocorreu na espécie".
Nesse
contexto, conforme Mello, os usuários do YouTube possuem a liberdade de
contratar ou não e, dessa forma, se sujeitar às regras contratuais previamente
informadas. Consequentemente, prosseguiu, se houve aceitação de tais regras ao
criar o canal, a autora não pode querer impor à plataforma a obrigação de
divulgar conteúdo contrário às suas diretrizes.
"Anote-se
que, na esfera contratual, a controvérsia tem fácil solução favorável à
recorrente. Mas há ainda um acréscimo no caso presente, qual seja, a necessária
ponderação entre a liberdade de expressão e o direito à saúde, devendo, por
óbvio, prevalecer este último em especial nesses tristes e nefastos dias de
pandemia de Covid-19 que, até o momento, ceifou a vida de quase 700 mil
brasileiros", completou.
Segundo
o relator, ainda que se considere, em tese, a discussão sobre censura,
conclui-se que, diante do conflito entre a liberdade de expressão e os direitos
fundamentais à saúde e à informação, estes últimos devem prevalecer. Mello,
então, considerou correta a conduta do YouTube de remover os vídeos e disse que
a autora pode procurar outras plataformas ou "montar palanque em praça
pública para difundir suas opiniões".
"Cabe
salientar que a manutenção desse nocivo conteúdo na plataforma, sob fundamento
de que sua remoção importaria censura e violação à liberdade de expressão,
acarretaria inestimável prejuízo aos inúmeros usuários da plataforma",
finalizou o desembargador. A decisão se deu por unanimidade.
Para
a advogada Nicole Moreira, sócia da área de Contencioso e Arbitragem do
Mattos Filho, a decisão é um importante paradigma do TJ-SP para os
casos envolvendo moderação de conteúdo "porque tratou da questão
pelos dois ângulos essenciais do debate": de um lado, prestigiou a livre
iniciativa, a liberdade contratual e a autonomia privada; de outro lado,
afastou alegações de censura.
"Dessa
forma, o TJ-SP dá sinais importantes de que a liberdade de expressão não é um
direito absoluto e deve ser temperada com a livre iniciativa e a liberdade
contratual, especialmente quando o uso de aplicações de internet, como é o caso
do YouTube, representa uma escolha livre e informada do usuário sobre
as regras aplicáveis", explicou a advogada.
Clique aqui para
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1116588-35.2021.8.26.0100
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