Da Redação
A Globo demitiu nesta segunda-feira (29) os jornalistas Francisco José e Renato Machado, que estavam há mais de 40 anos na emissora e nos últimos tempos atuavam no programa Globo Repórter. A repórter especial do jornalístico, Isabela Assumpção, com mais de 41 anos no canal, também foi demitida na última sexta-feira (26).
Segundo
informações divulgadas pelo site Notícias
da TV, os cortes na Globo fazem parte da nova política da empresa, que
renova seus quadros e abre mão de profissionais experientes por causa dos
salários altos. Ali Kamel, diretor de jornalismo, enviou e-mail para se
despedir dos antigos colegas. No texto, ele elogia o profissionalismo de
Machado e José e conta que os dois ainda têm trabalhos a serem exibidos no
Globo Repórter.
Nos
últimos meses, a Globo
causou comoção nos bastidores ao demitir nomes como Alberto Gaspar,
Roberto Paiva, Linhares Júnior, Ari Peixoto, José Hamilton Ribeiro, Eduardo
Faustini, Robinson Cerântula e Fernando Saraiva. No caso de Ari Peixoto, o
profissional foi demitido em uma conversa “cuja duração cabe nos dedos de uma
mão”. “Fui ‘desligado’ (essa é a palavra) hoje da TV Globo. Cheguei para
trabalhar e fui chamado à sala do diretor, que em minutos me informou da minha
demissão”, disse o repórter.
Leia
o texto de despedida de Renato Machado enviado por Ali Kamel aos jornalistas da
Globo:
“A
primeira vez que conheci Renato Machado pessoalmente foi em Brasília, na
cobertura do impeachment de Collor, eu pelo Globo e ele pela TV. Estávamos na
casa de Eliane Cantanhêde com outros tantos jornalistas – e Renato encantando a
todos com suas histórias bem humoradas.
Quando
cheguei à Globo em 2001, ele já era apresentador e editor-chefe do Bom Dia
Brasil, programa cujo novo formato ele ajudou a criar, em 1996, com mais
conversa, mais análise. Sucesso imediato, passou a pautar as redações sobre o
que vinha pela frente. Tivemos, nesse período, um contato estreito
–especialmente durante as coberturas eleitorais, quando preparávamos as
entrevistas que seriam feitas com os candidatos. Atento, atencioso, certeiro.
Renato
tem uma experiência invejável no jornalismo: BBC de Londres por dois anos,
Jornal do Brasil por 14, e, na Globo, desde 1982 (com apenas um ano de
afastamento, quando trabalhou para a TV Manchete). Aqui, foi repórter especial,
correspondente em Londres por dois longos períodos e editor-chefe e
apresentador do Bom Dia Brasil por 15 anos. Cobriu de tudo: guerras, atentados
terroristas, revoluções, tragédias, escândalos políticos, acontecimentos
culturais, entrevistas com grandes personalidades internacionais.
Poucos
alcançaram tamanho êxito. Entre as coberturas marcantes da qual participou, eu
destaco aquela do acidente nuclear de Chernobyl, em 1986. O stand up que fez, à
beira de uma lagoa em Upsala, mostrou a qualidade do seu texto e a capacidade
de explicar fenômenos complexos. Eu cito de memória, e peço desculpas pela
inexatidão. Mas era algo assim: “A radioatividade fica presa nas águas paradas
do lago, contaminando tudo, inclusive esse chão onde piso. E é exatamente por
isso que devo sair daqui logo”. Virou-se de costas e partiu. Algumas palavras,
um gesto, e o público entendeu a dimensão da tragédia.
Renato
está há cinco anos no Globo Repórter. E não me surpreende que, logo o primeiro
programa dele tenha sido indicado ao Emmy, na categoria “Atualidade”. Emprestou
certamente ao programa sua experiência com o jornalismo internacional, que
começou já na sua estreia na BBC em 1967. Mas também o traqueio no manejo de
temas nacionais, culturais e de comportamento. A câmera gosta dele e o público
mais ainda.
A
maneira cordata que deixa transparecer no vídeo é a mesma com que trata colegas
e amigos. Um profissional ímpar, um colega gentil e um amigo querido.
Também
ele, como Zé Hamilton Ribeiro e Chico José, de quem já falei, combinou comigo a
sua saída. Foi tão logo voltou de Londres. Um planejamento de longo prazo e por
etapas. Segundo nosso acerto, sairia em 2020, mas adiamos para o fim desse ano
por conta da pandemia.
Renato deixa um legado de bom jornalismo. É um exemplo do profissional de excelência. Em meu nome, em nome da Globo e de seus colegas, muito obrigado.”
Texto
de homenagem ao repórter Francisco José:
“Chico José, cearense de Crato, começou a trabalhar como jornalista em 1966 no Jornal do Commercio do Recife, antes mesmo de a profissão ser regulamentada, como ele gosta de frisar. Pelo jornal, Chico cobriu duas Copas do Mundo e chamou atenção de Armando Nogueira, que o convidou para ser repórter e apresentador do Globo Esporte. O programa começaria a ser exibido na capital pernambucana. Depois de estrear em frente às câmeras, em 1975, achou que a TV não era para ele .
Chico estava enganado.
Há
46 anos, vem fazendo uma carreira brilhante na Globo. Ao longo de sua
trajetória, pelo Esporte, Chico participou de quatro Copas do Mundo e duas
Olimpíadas. No Jornalismo, coleciona histórias inesquecíveis: foi o primeiro
repórter do Nordeste a aparecer no JN, mergulhou ao vivo na Baía de Guanabara
durante a Rio-92 (um feito inédito e antológico), cobriu a Guerra das Malvinas
(quando chegou a ser expulso pelo militares), acompanhou dezenas de apresentações
do Galo da Madrugada, mostrou ao Brasil a importância das festas de São João,
acompanhou o Papa João Paulo II na Coreia, revelou ao país as primeiras imagens
do naufrágio do Bateau Mouche, e alcançou a impressionante marca de 103 edições
do Globo Repórter… Sim, não é erro de digitação: são 103 programas com
reportagens dele, um feito. Esses são apenas alguns dos muitos momentos em que
Chico deixou sua marca.
Aliás,
foi no Globo Repórter que ele mostrou seu lado aventureiro. Pulou de bungee
jump, mergulhou com tubarões, seguiu onças na Amazônia, mostrou a vida selvagem
na África do Sul e os tesouros do Caribe, encarou elefantes marinhos na
Patagônia e muito mais. Foi ao Polo Norte e ao Polo Sul. Em 2013, Chico foi
finalista do Emmy com um Globo Repórter sobre a rotina e os rituais dos índios
Enawenê-Nawê, na Amazônia.
Mas
nada representa mais Chico José do que sua identificação com o Nordeste. É um
apaixonado. Durante 10 anos, fez coberturas da seca e da miséria que assolavam
o sertão nordestino. Em 2008, percorreu seis capitais para mostrar, ao vivo, o
São João no Jornal Nacional. Por 15 anos, ao lado de Beatriz Castro, apresentou
e fez reportagens no programa local de meio ambiente Nordeste Viver e
Preservar.
Recebeu
vários prêmios, inúmeras homenagens e títulos – entre eles o de Cidadão
Pernambucano. Convidado para ser correspondente internacional, nunca quis.
Costuma dizer que não troca o Nordeste por nenhum outro lugar do mundo. Mas tem
no currículo reportagens feitas em todos os continentes. Tem um jeito único de
fazer reportagem: envolvente, cativante, leva o espectador para onde ele está.
Com palavras precisas, com cenas que marcam.
Eu
o conheci pessoalmente ao chegar à Globo, numa visita que fiz ao Recife. Depois
dos afazeres na redação, aceitei o convite dele para almoçar. Andando pelas
ruas, pude comprovar o quanto é querido, tratado como família pelos
pernambucanos, carinho puro, que ele retribui. Uma conversa com ele nunca é
curta e é sempre prazerosa. Num de nossos encontros mais recentes, tínhamos uma
agenda breve, mas quando nos despedimos já havia se passado uma hora.
Conversamos sobre a profissão, o fazer jornalístico, a vida. Chico é um baú de
boas histórias e um observador agudo. Jo Mazarollo me disse dele: “Adora contar
histórias. As histórias das reportagens e as histórias que surgem enquanto está
fazendo as reportagens”. É verdade.
Há
três anos, começamos a conversar mais detidamente sobre este movimento que se
conclui hoje. Primeiramente, deixou o dia a dia para se dedicar aos projetos que
tinha no Globo Repórter. Para a nossa alegria e satisfação do público, fez o
que planejou. Em outubro, partiu para o Atol das Rocas, período mais propício
para realizar a reportagem há muito sonhada. O resultado, como sempre, superou
todas as melhores expectativas. Ao dar o ponto final no texto, ao pronunciar as
últimas palavras do programa, encerrou com chave de ouro esses 46 anos de
Globo. O resultado vai ao ar em 25 de março do ano que vem. Como planejado.
Eu
agradeço ao Chico José, cearense do Crato, cidadão de Pernambuco, jornalista do
Brasil, por todo o legado que nos deixa e por tudo o que fez pelo nosso
jornalismo. Em meu nome, no nome da Globo e no de seus colegas”.
Para ler mais acesse, www: professortacianomedrado.com
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