Doria no SBT (Foto: Reprodução/Facebook)
O
ex-governador de São Paulo João Doria (PSDB) anunciou nesta segunda-feira (23)
que desiste de sua pré-candidatura ao Palácio do Planalto, cedendo a pressões
da cúpula do seu partido, que pretende anunciar apoio à senadora Simone Tebet
(MDB-MS) e consolidar uma candidatura única da chamada terceira via. As
informações são de Carolina Linhares e Joelmir Tavares/FolhaPress.
"Me
retiro da disputa com o coração ferido, mas com a alma leve. Saio com
sentimento de gratidão e a certeza de que tudo o que fiz foi em benefício de um
ideal coletivo, em favor dos paulistanos, dos paulistas e dos
brasileiros", disse em seu discurso.
"Hoje,
serenamente, entendo que não sou a escolha da cúpula do PSDB. Aceito esta
realidade com a cabeça erguida. Sou um homem que respeita o bom senso, o
diálogo e o equilíbrio. Sempre busquei e seguirei buscando o consenso, mesmo
que ele seja contrário à minha vontade pessoal. O PSDB saberá tomar a melhor
decisão no seu posicionamento para as eleições deste ano", afirmou.
O
anúncio, feito em tom grave, na casa alugada para seu comitê de campanha, nos
Jardins, contraria a postura de Doria e de seus aliados nos últimos dias, que
vinham negando a possibilidade de abrir caminho para a emedebista.
Dirigentes
do PSDB não acreditavam que haveria acordo com Doria e apostavam até na
judicialização do imbróglio. O tucano chegou a sinalizar que buscaria a Justiça
Eleitoral para garantir que o PSDB lhe desse legenda com base no fato de ter
vencido prévias em novembro passado.
Doria
afirmou nesta segunda que "o Brasil precisa de uma alternativa para
oferecer aos eleitores que não querem os extremos", em estocada nos
líderes das pesquisas, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL).
"Saio
com o sentimento de gratidão e a certeza de que tudo o que fiz foi em benefício
de um ideal coletivo, em favor dos paulistanos, dos paulistas e dos
brasileiros", disse o tucano, que exaltou bandeiras de seu governo, como a
viabilização de vacinas contra a Covid-19.
"Peço
desculpas pelos meus erros. Se me excedi, foi por vontade de acertar. Se
exagerei, foi pela pressa em fazer com perfeição. Se acelerei foi pela urgência
que as ações públicas exigem", pontuou.
Doria
relembrou sua história na política e a carreira na iniciativa privada, com
menções também ao pai, João Doria, que foi deputado federal cassado no golpe
militar de 1964.
Ele
discursou com um painel da bandeira do Brasil ao fundo e acompanhado pelos
aliados mais próximos e pela esposa, Bia Doria. Foi aplaudido por
correligionários e chorou ao fim da fala de cerca de dez minutos.
Após
o pronunciamento, o presidente do PSDB, Bruno Araújo, afirmou que a decisão do
ex-governador comprova que ele não colocou seu projeto pessoal acima do país e
disse que o tucano terá o papel que quiser nestas eleições.
Araújo
indicou que o partido dará seguimento à coligação com MDB e Cidadania, mas
evitou dizer que Tebet já está escolhida, embora esse seja o acerto entre os
partidos. O dirigente afirmou que o PSDB deve indicar um vice para a chapa.
O
PSDB deve deliberar apoio a ela em reunião da executiva nesta terça-feira (24).
MDB, PSDB e Cidadania têm um acordo para lançar uma candidatura única da
chamada terceira via e, na semana passada, uma pesquisa encomendada pelos
partidos indicou que a emedebista era mais viável do que o tucano.
Depois
do anúncio do tucano, a senadora divulgou uma nota em que afirmou que
"Doria nunca foi adversário. Sempre foi aliado", destacou sua
"luta pela vacina" e disse que conversará com ele para receber
sugestões para seu programa de governo.
"O
Brasil é maior do que qualquer projeto individual. Vamos trabalhar para unir
todo o centro democrático. Gostaria muito de ter o PSDB e o Cidadania junto
conosco", disse Tebet.
Ainda
na nota, ela afirmou ser preciso aguardar a decisão das direções partidárias.
"Vamos unir o país e tratar de sua reconstrução moral, institucional e
política. O povo tem pressa e precisamos semear esperança".
Como
mostrou o jornal Folha de S.Paulo, apesar de Doria ter vencido as prévias do
PSDB em novembro passado, a cúpula do partido vinha seguindo um roteiro para
derrubar sua pré-candidatura com base no acordo firmado com MDB e Cidadania.
Além
disso, Doria enfrentou concorrência do ex-governador gaúcho Eduardo Leite
(PSDB), que ensaiou uma pré-campanha presidencial apesar de ter sido derrotado
nas prévias do partido.
Até
aliados de Doria admitiram que sua pré-candidatura havia ficado insustentável
depois que mesmo a bancada paulista do PSDB, que o apoiou nas prévias, passou a
operar contra Doria.
Tucanos
afirmam que isso inclui o atual governador, Rodrigo Garcia (PSDB), que em
entrevistas recentes defendeu o acordo com o MDB e uma candidatura competitiva
da terceira via. A pré-campanha de Rodrigo vem tentando se descolar de Doria.
Já auxiliares do governador negam que ele faça parte de uma conspiração contra
o antecessor.
Na
última terça-feira (17), a maior parte da executiva do PSDB, em reunião,
avaliou que Doria prejudicaria os demais candidatos do partido, o que ampliou a
expectativa de que o ex-governador paulista desistisse algo que seus aliados
sempre negaram.
Doria
já havia ameaçado desistir de concorrer ao Planalto em 31 de março, chegou a
dizer a aliados que não renunciaria ao Governo de São Paulo, o que prejudicaria
os planos eleitorais de Rodrigo.
Na
época entrou em curso uma operação para salvar o vice. O presidente do PSDB,
Bruno Araújo, divulgou uma carta reafirmando a escolha do PSDB por Doria. O
ex-governador voltou atrás acreditando em uma vitória política disse que o
recuo fora estratégia. Com Rodrigo empossado, o papel não valia mais nada.
Enquanto
parte do PSDB defende o apoio a Tebet, outra ala ainda prega uma candidatura
própria desde que não seja a de Doria. A aposta é a de que o MDB acabará
rifando Tebet, o que abriria espaço para a candidatura tucana.
Doria
e seus aliados, minoritários no partido, vinham rebatendo os argumentos
pró-Tebet com base nas pesquisas que o mostram à frente numericamente da
senadora. Além disso, ressaltam que o ex-governador tem um legado a mostrar,
que inclui a vacina contra a Covid-19, e venceu prévias que custaram R$ 12
milhões de verba pública.
Para
o entorno do ex-governador, o PSDB deveria deixar a escolha entre Doria e Tebet
para mais adiante, antes das convenções previstas para julho e agosto o que
lhe daria mais tempo para crescer nas intenções de votos.
Líderes
do PSDB, no entanto, rejeitam adiar ainda mais a definição de um nome e veem
Doria estacionado nas pesquisas.
O
tucano marcou 4% na última pesquisa Ipespe contra 2% de Tebet o levantamento
foi financiado pela XP. A enorme distância de Lula (PT, 44%) e Jair Bolsonaro
(PL, 32%) evidencia o drama da terceira via e coloca em perspectiva o enredo da
crise tucana.
Vencedor
de duas eleições seguidas, em 2016 e 2018, e vitorioso em três prévias tucanas,
Doria acumula alta rejeição entre eleitores e, por isso, é visto como tóxico
pela cúpula do PSDB. Outros nomes tucanos que disputarão governos estaduais e
vagas no Congresso têm pregado contra sua candidatura.
Além
disso, como gosta de lembrar, Doria sempre enfrentou resistência no PSDB. Em
2016, sua candidatura à Prefeitura de São Paulo foi apoiada inicialmente apenas
por Geraldo Alckmin (PSB), que hoje é um desafeto do tucano e se considera
traído pelo afilhado.
Doria
venceu em primeiro turno e, em 2018, deixou a prefeitura para concorrer ao
Governo de São Paulo, sendo também vencedor da corrida. O fato de ter deixado o
cargo, no entanto, prejudicou a imagem do tucano entre paulistanos.
A
chegada na política como antipolítico, a empreitada para expulsar Aécio, a
tentativa de presidir o PSDB e a associação com Bolsonaro são episódios que
deram a Doria a má fama no partido.
O
estilo trator também vigorou nas prévias, com acusações de compra de votos e de
filiações intempestivas, além da vantagem da máquina tucana paulista. Isso
explica, para parte dos tucanos, porque Doria ganhou, mas não levou.
De
lá pra cá, os tropeços se seguiram rompimento com Araújo, o quase recuo na renúncia,
um jantar em que a terceira via deu o cano e finalmente a ameaça de
judicialização.
Leia
a íntegra do discurso:
“Boa
tarde a todos.
“Hoje
é um dia de respostas, mas também um dia de perguntas.
“As
pessoas sempre me perguntam por que deixei uma vida de conforto à frente das
minhas empresas bem sucedidas, para entrar na política?
“Sou
filho de um político cassado pelo golpe militar de 64. Meu pai, tal como eu,
começou a vida pobre, mas lutou, trabalhou e alcançou uma vida confortável,
dono de uma das maiores agências de publicidade do Brasil. Até o dia que
decidiu, inspirado por Franco Montoro, a lutar por um Brasil melhor.
“Nele,
era premente e urgente a necessidade de servir ao povo brasileiro, de combater
a desigualdade e a injustiça social.
“João
Doria foi eleito deputado federal e, em abril de 64, foi cassado pelo golpe
militar. Perdeu seus direitos políticos, todos os seus bens e foi obrigado a
viver no exílio.
“Inspirado
pelos ideais e pela coragem de meu pai, e coincidentemente também motivado por
Franco Montoro, colaborei desde cedo com a vida pública. Com Mário Covas fui
Presidente da Paulistur e Secretário de Turismo, em São Paulo. Por conta de uma
gestão bem sucedida, fui convidado a presidir a Embratur, emblematicamente
criada por um projeto de lei de autoria de meu pai. Como militante e
ativista, organizei, a pedido de Franco Montoro, o histórico comício das
Diretas Já, na praça da Sé, em 25 janeiro de 1984, aqui em São Paulo.
“Com
perseverança, dedicação e trabalho, construí uma carreira sólida na
iniciativa privada e coloquei de pé um grupo empresarial de sucesso.
“2015,
marcava o auge de uma recessão brutal que dizimou milhões de empregos,
guilhotinou a renda, levou a inflação às alturas e destruiu sonhos. Nada muito
diferente do que enfrentamos hoje. Inconformado, acompanhava as medidas
econômicas equivocadas de um governo incompetente e o desvio de dinheiro
público.
“2016,
seguindo os passos de meu pai, decidi disputar uma eleição.
“Começa
aí minha saga, no meu partido.
“No
PSDB disputei 3 prévias: para prefeito, para governador e para
presidente. As 3 únicas prévias na história do partido. Venci as prévias
em 2016. E logo depois, venci as eleições para a prefeitura da maior cidade do
país, no primeiro turno. Fato inédito na história política de São
Paulo.
“Guardo
as melhores lembranças da prefeitura. E do meu amigo Bruno Covas.
“Tenho
orgulho de ter zerado a fila de exames nos postos de saúde, com o inédito
Corujão da Saúde. Atendemos a população em situação de rua com os Centros de
Acolhimento, recuperamos praças, avenidas e ruas. Promovemos a maior inclusão
de crianças desassistidas no redimensionamento das creches e escolas
municipais. Lançamos os programas de concessão do Parque do Ibirapuera, do
Pacaembú e do Anhembi, entre outras conquistas importantes para a cidade.
“Em
2018, novamente disputei e fui vitorioso nas prévias do PSDB para a eleição a
governador do Estado de São Paulo. Mais uma vez, venci as prévias e venci
as eleições, sendo eleito governador de São Paulo.
“Tenho
orgulho de ter feito uma gestão transformadora no estado, reconhecida até mesmo
por adversários. Diante do desafio histórico da pandemia, me empenhei
pessoalmente para trazer ao Brasil 124 milhões de doses da vacina contra a
covid 19. Procurei fazer o certo. Salvamos vidas e a economia. Na
pandemia, São Paulo cresceu 5 vezes mais do que o Brasil, gerando um terço de
todos os novos empregos do país. Por todo o território nacional, a vacina
foi sinal de esperança, salvando milhões de brasileiros. Vencemos com a
ciência, os discursos do ódio, das fake news e o negacionismo.
“Assim
como, na saída da prefeitura, quando deixei o comando da cidade nas mãos do
saudoso Bruno Covas, desta vez também, deixei o governo de São Paulo em boas
mãos. Rodrigo Garcia está levando em frente um trabalho que começou com
uma equipe de craques, e que certamente lhe renderá a vitória nas eleições
deste ano. Rodrigo será, com muita justiça, reeleito governador de São Paulo.
“Em
dezembro do ano passado, mais uma vez disputei as prévias do partido para ser
candidato a presidente da república. E mais uma vez, as venci.
“Fica
aqui minha gratidão aos brasileiros da cidade de São Paulo que me deram mais de
3 milhões de votos na prefeitura, aos quase 11 milhões de votos ao governo de
São Paulo. E aos mais de 17 mil militantes do PSDB, que me escolheram como
candidato a presidente do Brasil.
“Agradeço
também aos mais de seis milhões de brasileiros que, nas pesquisas de opinião
pública, já manifestaram a intenção de votar no meu nome para presidente, antes
mesmo do começo da campanha eleitoral.
“O
Brasil precisa de uma alternativa para oferecer aos eleitores que não querem os
extremos. Que não querem aquele que foi envolvido em escândalos de
corrupção. E nem aquele que não deu conta de salvar vidas, não deu conta de
salvar a economia e que envergonha nosso país em todo o mundo.
“Para
esta missão, coloquei meu nome à disposição do partido.
“Hoje,
neste 23 de maio, serenamente, entendo que não sou a escolha da cúpula do
PSDB. Aceito esta realidade com a cabeça erguida. Sou um homem que
respeita o bom senso, o diálogo e o equilíbrio. Sempre busquei e seguirei
buscando o consenso, mesmo que ele seja contrário à minha vontade pessoal. O PSDB
saberá tomar a melhor decisão no seu posicionamento para as eleições deste ano.
“Me
retiro da disputa com o coração ferido, mas com a alma leve. Com a sensação
inequívoca do dever cumprido e missão bem realizada. Com boa gestão e sem
corrupção.
“Saio
com o sentimento de gratidão e a certeza de que tudo o que fiz foi em benefício
de um ideal coletivo, em favor dos paulistanos, dos paulistas e dos
brasileiros.
“Saio
como entrei na política: repleto de ideais, com a alma cheia de esperança e o
coração pulsante, confiante na força do povo brasileiro que têm fé na vida e em
Deus.
“Peço
desculpas pelos meus erros. Se me excedi, foi por vontade de acertar. Se
exagerei, foi pela pressa em fazer com perfeição. Se acelerei foi pela urgência
que as ações públicas exigem.
“Os
acertos foram fruto do trabalho em equipe, da ousadia e da coragem, do
propósito que sempre persegui. De sempre fazer bem feito o que tem que ser
feito.
“Respeito
e Trabalho. Fazer do possível o impossível. Esse é meu mantra. Levo por onde eu
for.
“Agradeço
a minha equipe aguerrida, aos membros do partido que sempre me defenderam, aos
que lutaram ao meu lado, aos que foram leais e que defenderam a democracia
interna do partido. E defendem, como eu, a liberdade e a igualdade no Brasil.
“Agradeço
aos colaboradores, que estiveram comigo na prefeitura e no Governo do Estado,
que se empenharam para os resultados históricos que alcançamos.
“Agradeço
aos militantes do PSDB, extraordinários guerreiros que nunca me abandonaram.
“Agradeço
a Deus pela disposição que sempre me deu, pela capacidade de trabalho, senso de
justiça e paz no coração.
“Agradeço
igualmente à minha família, à Bia, aos meus queridos filhos, Johnny, Felipe e
Carol, ao meu querido irmão Raul e sua linda família. Agradeço também a todos
os verdadeiros amigos que sempre me apoiaram, em todas as minhas decisões.
“Por
fim, relembro aqui o belo poema atribuído a Cora Coralina: “Tem mais chão nos
meus olhos do que o cansaço das minhas pernas, mais esperança nos meus passos,
do que tristeza nos meus ombros. Mais estrada no meu coração do que medo na
minha cabeça.
“Seguirei
como observador sereno do meu País. Sempre à disposição de lutar a guerra para
a qual eu for chamado. Na vida pública ou na vida privada.
“Que
Deus proteja o Brasil.
“Muito obrigado e até breve.”
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