Advogado e árbitro com uma vasta experiência em litígios, com ênfase em
transporte marítimo, e um extenso registro de assessoria a clubes P&I,
armadores e afretadores.
Na terça-feira da semana passada (4/8), o porto
de Beirute explodiu em chamas e ficou envolto em uma densa fumaça branca.
Enquanto o inferno se agitava, flashes que muitos confundiram com fogos de
artifício apareceram em sua base. Em um instante, o fogo foi substituído por
uma explosão poderosa que foi ouvida em Chipre, a quase 150 milhas. Logo em
seguida, veio o veredicto: a explosão de 2.750 toneladas de nitrato de amônio.
Além de uma grande indignação, fica a pergunta: o que o nitrato de
amônio estava fazendo há tanto tempo nos armazéns? Como isso pôde ter
acontecido?
A história dessa explosão começa anos atrás (2013), quando negligências
corporativas levaram a uma batalha legal prolongada envolvendo marítimos
abandonados por um armador negligente. Procedimentos inadequados para lidar com
navios e tripulantes abandonados são parte do que permitiu que tanto material
perigoso chegasse aos armazéns de Beirute e ali permanecesse por tanto tempo,
até o resultado fatídico.
Em 2013, a embarcação Rhosus foi abandonada em Beirute após o seu
passeio de saída ser suspenso pelo Port State Control. A tripulação foi
impossibilitada de desembarcar e, sem suprimentos ou provisões, a situação
a bordo do navio rapidamente se tornou uma questão humanitária.
Eventualmente, a tripulação entrou em contato com advogados, que por sua
vez argumentaram que a vida da tripulação estava ameaçada não apenas por seu
abandono, mas também devido à natureza perigosa da carga a bordo. A tripulação
recebeu uma liminar permitindo sua repatriação ao país de origem.
Após a partida da tripulação do Rhosus e o silêncio contínuo do armador,
a autoridade portuária se viu com a responsabilidade pelo conteúdo altamente
explosivo do navio.
Assim, enquanto pendia uma definição jurídica do navio, a carga, o
nitrato de amônio, foi transferida para um armazém onde, ostensivamente,
permaneceu até a explosão catastrófica.
As consequências do abandono de navios e marítimos raramente são tão
visíveis e chocantes quanto naquela terça-feira em Beirute, mas o problema é
realmente bastante comum. Inclusive, já foi objeto de inúmeros artigos e
entrevistas que concedi.
Nos últimos anos, nossa equipe tem atuado em mais de uma dezena de casos
em que navios ou tripulantes foram simplesmente abandonados por seus proprietários,
resultando em situação perigosa para credores e marítimos.
De fato, a Organização Marítima Internacional e a Organização
Internacional do Trabalho já colaboram em questões de abandono de marítimos e
navios. Inclusive, já registraram quase cinco mil marítimos abandonados em
seus navios em quase 400 incidentes separados entre 2004 e 2018.
Além disso, atualmente diversas embarcações permanecem em águas
jurisdicionais brasileiras em situação de total abandono, aguardando definição
jurídica, geralmente sem nenhum seguro ou P&I Club. E, enquanto isso,
oferecem enorme risco à segurança da navegação e têm potencial para causar
enorme poluição ambiental. Dentro dos diversos casos que atendemos nos últimos
anos, está a situação do navio Seawind, que veio a naufragar em águas
alencarianas.
Na época, a tripulação do navio em questão se encontrava em situação
análoga à de escravos, sem receber salários havia mais de 14 meses, além de não
possuir víveres e com estoque reduzido de aguada, sendo forçados à pesca para
subsistência. Infelizmente, o armador estrangeiro abandonou a embarcação em
águas alencarianas e, assim, após dois anos de debate no Judiciário local,
a embarcação veio a naufragar, deixando os tripulantes e credores estrangeiros
a ver navios.
Gerando, ainda, enorme vazamento de óleo, que somente não veio a causar
efeitos nefastos na costa de Fortaleza tendo em vista um trabalho em
conjunto das autoridades e a comunidade marítima-portuária para conter o óleo
que estava vazando. A situação é crítica e inúmeros casos como esse ainda são
vistos no Brasil, devido a uma enorme insegurança jurídica. Solução existe! E
será explorada em uma próxima ocasião.
Para ler outras matérias acesse, www: professortacianomedrado.com
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