Foto divulgação
Para
preservar a disputa pelo Poder Executivo de Alagoas, os ministros do Supremo
Tribunal Federal Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso revogaram nesta
segunda-feira (24/10) o afastamento do cargo do governador Paulo Dantas
(MDB).
Os
ministros decidiram em três processos: ADPF 1.017, apresentada pelo Partido
Socialista Brasileiro (PSB) e de relatoria de Gilmar; Reclamação 56.518 e HC
221.528, ambos movidos pelo governador e de relatoria de Barroso.
Dantas
foi afastado do cargo no último dia 11, por decisão da
ministra do Superior Tribunal de Justiça Laurita Vaz, posteriormente confirmada pela Corte Especial. A
decisão gerou críticas ao STJ, tanto por alegada incompetência da
corte para analisar o caso quanto por interferir na eleição alagoana. Dantas,
que é apoiado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e pelo senador
Renan Calheiros (MDB-AL), disputa a reeleição no segundo turno contra Rodrigo
Cunha (União Brasil), candidato do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur
Lira (PP-AL), aliado do presidente Jair Bolsonaro (PL).
O
artigo 236, parágrafo 1º, do Código Eleitoral proíbe a prisão de
candidatos no período de 15 dias que antecede a data das eleições,
ressalvadas as hipóteses de prisão em flagrante ou decorrente de sentença
condenatória irrecorrível.
Em
sua decisão, Gilmar Mendes argumentou que uma interpretação do dispositivo à luz
da Constituição Federal de 1988 também proíbe a decretação de medidas
cautelares alternativas à prisão durante as eleições. Afinal, o artigo visa a
proteger o processo eleitoral, cuja violação atingiria o próprio regime
democrático vigente, segundo o ministro.
Ele
destacou que o artigo 236 do Código Eleitoral foi elaborado em 1965, mas desde
a Constituição de 1988 foram criadas diversas outras medidas cautelares
restritivas da liberdade. Assim, disse o magistrado, quando o código entrou em
vigor, não poderia englobar tais determinações, uma vez que elas nem existiam.
Ordens
judiciais como o afastamento do mandato cuja reeleição se pretende; a proibição
de frequentar determinados lugares, como comícios ou reuniões públicas; ou a
imposição de uso de tornozeleira eletrônica "podem impor desequilíbrios ao
processo eleitoral e constrangimentos aos candidatos que afetam diretamente a
livre concorrência", segundo o ministro, que ressaltou que, no segundo
turno, não é possível substituir o candidato.
"Nesses
casos, a imposição de tão grave medida cautelar no período de 15 dias antes da
realização das eleições tem o potencial de impactar ou desequilibrar de forma
injustificada a livre manifestação das urnas, o que não deve ser admitido à luz
dos princípios e parâmetros acima descritos de neutralidade, livre concorrência
e paridade de armas eleitorais."
Dessa
maneira, o ministro concedeu cautelar para revogar o afastamento de Paulo
Dantas do governo de Alagoas e estabelecer que a imunidade eleitoral prevista
no parágrafo 1º do artigo 236 do Código Eleitoral compreende a proibição da
adoção de medidas cautelares contra candidato a cargo do Executivo desde os 15
dias que antecedem o primeiro turno até as 48 horas seguintes ao término de
eventual segundo turno. Tal imunidade eleitoral também se aplica aos demais
postulantes a cargos eleitorais majoritários.
"A
decisão do ministro Gilmar Mendes confere efetividade à garantia constitucional
de liberdade do voto, ao evitar que, às vésperas de pleitos eleitorais,
decisões judiciais interfiram diretamente na formação da vontade popular,
criando fatos políticos, negativos ou positivos, em benefício de determinada
candidatura", afirmaram Felipe Santos Correa e Caio Souza,
advogados do PSB no caso.
Competência duvidosa
Já Luís Roberto Barroso suspendeu as medidas cautelares impostas a Paulo Dantas
por considerar que há dúvida razoável sobre a competência para o afastamento
pelo STJ, responsável por analisar casos sobre governadores, uma vez que as
acusações se referem ao período em que o emedebista era deputado
estadual — portanto, com foro especial no Tribunal de Justiça de
Alagoas.
O
STF restringiu, em 2018, o alcance do foro por prerrogativa de
função. Parlamentares, desde então, só têm foro especial se os fatos imputados
a eles ocorrerem durante o mandato, em função do cargo. No caso de delitos
praticados anteriormente a isso, o parlamentar deve ser processado pela primeira
instância da Justiça, como qualquer cidadão. Com o fim do mandato, também acaba
o foro privilegiado.
Posteriormente, o STJ decidiu que o foro especial de governadores e
conselheiros de Tribunais de Contas é restrito a fatos ocorridos durante o
exercício do cargo e em razão deste.
O
ministro afirmou que o contato do delegado-geral da Polícia Civil alagoana com
a delegada da Polícia Federal responsável pelo caso, com o objetivo de promover
oitiva de testemunha, não é suficiente para justificar a fixação da competência
do STJ.
"A
suposição de que tal contato representaria tentativa do governador de
interferir nas investigações não foi corroborada por qualquer indício para além
da relação hierárquica entre o delegado e o governador. Por essa lógica,
qualquer ilícito praticado por servidor do Poder Executivo poderia ser
automaticamente atribuído ao chefe desse poder. A grave inferência da prática
de interferência em investigação criminal — que poderia configurar o delito de
obstrução de Justiça — não pode ser presumida", argumentou Barroso.
Além
disso, o ministro lembrou que o afastamento de Dantas do governo se deu entre o
primeiro e o segundo turno das eleições e sem contraditório.
"Vale
dizer: o paciente/reclamante (Dantas) não foi ouvido em momento algum. O
Judiciário deve ter cautela e autocontenção em decisões que interfiram no
processo eleitoral no calor da disputa."
"A
decisão é muito importante porque corrige uma situação de injustiça e de
interferência indevida no processo eleitoral do estado de Alagoas por
autoridade incompetente", afirmou o advogado Cristiano Zanin Martins,
que representou Dantas nas ações de relatoria de Barroso.
Histórico do caso
A ministra do STJ Laurita Vaz afastou o governador em 11 de outubro, pelo prazo de
180 dias. Ainda não existe denúncia ou acusação formal contra Dantas, mas o
inquérito cogita de peculato e lavagem de dinheiro em um suposto esquema
de "rachadinha" na Assembleia Legislativa de Alagoas, referente à
época em que ele era deputado estadual — de 2019 ao início deste ano.
A
decisão foi referendada pela Corte Especial do STJ. Por
entender que não cabe suspensão de liminar para particular em matéria penal, uma
vez que isso criaria diferenciação inaceitável para ocupantes de cargos
públicos, a presidente do STF, ministra Rosa Weber, manteve o afastamento de Paulo Dantas no último dia
19.
Clique aqui para ler a decisão de Gilmar Mendes
Clique aqui para ler a decisão de Luís Roberto Barroso
ADPF
1.017
Reclamação 56.518
HC 221.528
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