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Por maioria apertada de 4 votos a 3, o Tribunal Superior Eleitoral decidiu, na noite de terça-feira (20/9), substituir o critério restritivo que usava para averiguar a existência de pedido explícito de voto, um dos pressupostos para configurar a propaganda eleitoral antecipada.
Essa
conduta vedada ocorre em atos feitos antes de 15 de agosto do ano da eleição.
Para diferenciar a propaganda antecipada da mera pré-campanha, a jurisprudência
precisou eleger critérios. Se há pedido explícito de votos ou violação da
igualdade de oportunidades entre os candidatos, está configurado o ilícito
eleitoral, cuja punição é multa de até R$ 25 mil.
Nessa
linha de pensamento, o TSE fixou uma interpretação bastante restritiva para o
que deve ser considerado pedido explícito de votos, baseado no critério das
"palavras mágicas": é preciso que o ato contenha determinados termos
como "votem", "apoiem" ou "elejam".
A
ideia é que o pedido tenha sido formulado de maneira clara e direta. Não basta
o sugerido, o denotado, o pressuposto, o indireto, o latente, o sinuoso e o
subentendido.
Na
terça-feira, o TSE superou essa interpretação para condenar o presidente Jair
Bolsonaro por propaganda eleitoral antecipada praticada na Assembleia-Geral das
Assembleias de Deus no Brasil, em Cuiabá, em 19 de abril deste ano.
Na
ocasião, ele participou de uma motociata, que culminou no evento religioso. Nem
o então pré-candidato, nem o deputado federal Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), que
o apresentou aos fiéis, fizeram uso de qualquer das "palavras
mágicas" ao discursar no templo religioso.
Para
o TSE, no entanto, o "conjunto da obra" deixa claro e inequívoco que
Bolsonaro e o parlamentar anteciparam um verdadeiro ato de campanha, que merece
punição, nos termos do artigo 36-A da Lei das Eleições (Lei 9.504/1997).
O fim da magia
Segundo informações, Bolsonaro falou no evento religioso diante de 7 mil
pessoas, depois de ser acompanhado na motociata por 2,5 mil motociclistas. Ao
microfone, avisou que, se for a vontade de Deus, continuará a missão de estar à
frente do governo federal. Também disse "tenho certeza de que, tendo vocês ao
nosso lado, nós atingiremos os nossos objetivos" e citou que "hoje
temos uma luta do bem contra o mal".
Já
Sóstenes Cavalcanti citou o desafio que os fiéis têm, de votar em candidatos
que representam a igreja para criar "um exército aliado com o nosso
presidente Bolsonaro para, se Deus quiser, dar a ele mais um mandato". E
completou com: "um homem que tem esses valores não precisa nos pedir nada,
nós já sabemos o que devemos fazer por ele".
Relatora,
a ministra Maria Cláudia Bucchianeri aplicou a jurisprudência até então vigente
e afastou punição por propaganda antecipada. Interpretou que as falas
representaram um anúncio implícito de pré-candidatura, a exaltação de
qualidades pessoais do pré-candidato e um pedido de apoio político, todas condutas permitidas no período pré-campanha.
Para
ela, assim como é lícito às lideranças femininas e negras defenderem votos em
mulheres e negros sem especificamente identificá-los, também é possível aos
líderes religiosos defenderam a escolha de candidatos que comunguem dos mesmos
valores.
"Ainda
que pedido explícito de voto possa ser extraído de outras 'palavras mágicas',
tenho que, no caso concreto, não houve uso de nenhuma delas", concluiu.
Ele ficou vencida, acompanhada pelos ministros Raul Araújo e Sergio Banhos.
Conjunto da obra
Abriu a divergência vencedora o ministro Ricardo Lewandowski, para quem o
contexto geral da motociata e do evento, previamente organizados e divulgados,
indicam a clara antecipação de um ato de campanha pelo presidente. Acompanharam
essa posição os ministros Benedito Gonçalves, Cármen Lúcia e Alexandre de
Moraes.
"A
questão das 'palavras mágicas', eu diria que temos que aposentá-las",
disse o ministro Alexandre. "No momento em que o TSE fixou que essas
palavras servem para configurar campanha antecipada, todo candidato passou a
andar com uma cola feita pelos seus advogados: fale tudo, menos isso. Ninguém
mais diz 'vote em mim'", criticou.
Para
ele, as palavras de Bolsonaro e Sóstentes Cavalcanti, somadas, e o
"conjunto da obra" substituem de forma muito clara o uso das tais
"palavras mágicas".
A
ministra Cármen Lúcia fez questão de destacar que a jurisprudência está
mantida: para propaganda antecipada, é preciso haver pedido de voto explícito.
Há apenas um novo direcionamento, no sentido de que é possível que um conjunto
de informações apontem para a ocorrência de tal pedido.
O
ministro Raul Araújo então manifestou preocupação pelo abandono de um critério
seguro e objetivo usado pelo TSE. "Pedido implícito de voto sempre haverá.
Sempre que alguém se apresente na fase pré-eleitoral, ele estará pedindo
voto", resumiu.
"Mas
nós fazemos referência ao que é objetivável no caso concreto", rebateu a
ministra Cármen Lúcia. "Por isso eu li as frases [de Bolsonaro e
Sóstentes]. Para mim, significam exatamente o pedido de voto. Não tenho dúvida
nenhuma. Aqui, não se trata de ilação", complementou.
A
corte já havia indicado essa mudança em caso recente, ao analisar um outdoor de apoio ao presidente, colocado por uma
cooperativa de agropecuaristas em Mato Grosso do Sul. A mensagem "juntos
com Bolsonaro" foi interpretada como pedido explícito de votos.
"Nesse
outdoor, há um pedido que nem é implícito. É uma forma indireta. 'Juntos com
Bolsonaro'. Juntos para quê? Não é para jogar bola. Não é para ir ao cinema. É
para as eleições", explicou o ministro Alexandre de Moraes, na ocasião.
Representação 0600229-33.2022.6.00.0000
Com
informações de Danilo
Vital é correspondente da revista Consultor Jurídico em
Brasília.
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