Uma semana após a invasão da Ucrânia pela Rússia, ocorrida
no dia 24 de fevereiro, já são inúmeros os registros de possíveis crimes de
guerra cometidos pelo exército russo. As denúncias, que já chegaram ao Tribunal Penal
Internacional (TPI) e devem levar a uma investigação, partem de
pesquisadores e de líderes de nações ocidentais. As informações são do site independente de noticias A Referência.
O
primeiro líder do Ocidente a falar explicitamente em crimes
de guerra foi o primeiro-ministro britânico Boris Johnson. “O que
vimos do regime de Vladimir Putin no uso das munições que eles lançaram sobre
civis inocentes, na minha opinião, já se qualifica totalmente como crime de
guerra”, disse ele, segundo a rede Bloomberg.
A
primeira-ministra da Lituânia, Ingrida Simonyte, fez acusação semelhante em
entrevista ao jornal The Washington Post, ao afirmar que “o que Putin está
fazendo é apenas um assassinato e nada mais. Espero que ele esteja em Haia”,
referindo-se à cidade que sedia o TPI.
Nos
Estados Unidos, dois legisladores anunciaram uma resolução que também acusa
Moscou de crimes de guerra. Uma das denunciantes é Victoria Spartz, que tem
descendência ucraniana e integra a Câmara dos Representantes. O senador Lindsey
Graham também assinou a resolução, que apoia a queixa de crimes de guerra ao
TPI, segundo a agência Reuters.
Na
terça-feira (1º), o governo do Canadá anunciou que
encaminhou ao TPI uma representação para que sejam investigados crimes de
guerra e contra
a humanidade cometidos por forças da Rússia. A corte já havia
manifestado a intenção de investigar, e a ação canadense tende a acelerar o
processo. De acordo com uma fonte que prefere não se identificar, isso poupará
meses de burocracia.
“Estamos
trabalhando com outros Estados-Membros do TPI para tomar essa ação
significativa como resultado de inúmeras alegações de crimes internacionais
graves na Ucrânia por forças
russas“, disse a ministra das Relações Exteriores do Canadá, Melanie Joly,
em comunicado. “O TPI tem todo o nosso apoio e confiança. Apelamos à Rússia
para que coopere com o tribunal.”
Bombas
de fragmentação
As
acusações referem-se essencialmente a ataques contra a população civil,
inclusive com relatos de bombardeios a hospitais e escolas. De acordo com a
ONU, foram registradas oficialmente as mortes de 249 civis, incluindo 15
crianças, com mais de 550 pessoas feridas. Os serviços de emergência
ucranianos, por sua vez, falam em dois mil civis mortos, mas não há uma
verificação independente desses números.
As
mortes de civis também levaram Elliot Higgins, fundador do site jornalístico
investigativo Bellingcat, a falar em crimes de guerra, segundo o jornal
britânico Guardian. Ele cita como provas vídeos cuja autenticidade
foi verificada e que mostram bombas de fragmentação sendo disparadas em áreas
ocupadas por civis.
Armamentos
de fragmentação, que espalham pequenos projéteis em uma ampla área, são
proibidos por mais de cem nações, incluindo Reino Unido, França e Alemanha, por
causa de sua falta de precisão. No entanto, Rússia e Ucrânia não assinaram o
tratado sobre o tema, introduzido pela primeira vez em 2008 e também rejeitado
pelos EUA.
A
Anistia Internacional denunciou que uma dessas bombas atingiu uma escola
infantil na cidade de Okhtyrka, cerca de 100 quilômetros a oeste de Kharkiv. Um
vídeo publicado no Twitter mostra o que seria o prédio atingido, onde
três civis teriam morrido, entre eles uma criança.
“Não
há justificativa possível para lançar munições de fragmentação em áreas
populosas, muito menos perto de uma escola”, disse Agnès Callamard,
secretária-geral da Anistia Internacional, que diz ter confirmado a veracidade
do vídeo e da informação.
Segundo
Higgins, na guerra da Ucrânia é possível verificar com mais precisão as
denúncias de abusos por parte das forças armadas. Ele destaca que “uma
comunidade de inteligência de código aberto” atua “desde o primeiro dia” do
conflito coletando e estudando evidências de vídeos e fotos.
São
cenas documentadas por telefones celulares e enviadas a pesquisadores
independentes, como o Bellingcat, que são capazes de estabelecer
geograficamente o local onde as imagens foram coletadas. Armazenadas, essas
evidências podem vir a ser úteis no futuro. “Pode chegar o dia em que tudo isso
acabe no tribunal criminal internacional”, disse Higgins.
Por
que isso importa?
A
escalada de tensão entre Rússia e Ucrânia, que culminou com a efetiva invasão
russa ao país vizinho no dia 24 de fevereiro, remete à anexação da Crimeia pelos russos, em
2014, e à guerra em Donbass, que começou naquele mesmo ano e se estende até
hoje.
O
conflito armado no leste da Ucrânia opõe o governo central às forças
separatistas das autodeclaradas Repúblicas Populares de Donetsk e Lugansk, que
formam a região de Donbass e foram oficialmente reconhecidas como territórios
independentes por Moscou. Foi o suporte aos separatistas que Putin usou como
argumento para justificar a invasão, classificada por ele como uma “operação
militar especial”.
“Tomei
a decisão de uma operação militar especial”, disse Putin pouco depois das 6h de
Moscou (0h de Brasília) de 24 de fevereiro, de acordo com o site
independente The Moscow Times. Cerca de 30 minutos depois, as primeira
explosões foram ouvidas em Kiev, capital ucraniana, e logo em seguida em
Mariupol, no leste do país, segundo a agência AFP.
Desde
o início da ofensiva, as forças da Rússia caminham para tentar dominar Kiev,
que tem sido alvo de constantes bombardeios. O governo da Ucrânia e as nações
ocidentais acusam Moscou de atacar inclusive alvos
civis, como hospitais e escolas, o que pode ser caracterizado como crime de
guerra ou contra a humanidade.
Fora
do campo de batalha, o cenário é desfavorável à Rússia, que tem sido alvo de
todo tipo de sanções. Além das esperadas punições financeiras impostas pelas
principais potencias globais, que já começaram a sufocar a economia russa, o
país tem se tornado um pária global. Representantes russos têm sido proibidos
de participar de grandes eventos em setores como esporte, cinema
e música.
De acordo com o presidente dos EUA, Joe Biden, as punições tendem a aumentar o isolamento da Rússia no mundo. “Ele não tem ideia do que está por vir”, disse o líder norte-americano, referindo-se ao presidente russo Vladimir Putin. “Putin está agora mais isolado do mundo do que jamais esteve”.
Russian missile hit kindergarten pic.twitter.com/mrbwzvwYWJ
— Олександр Мережко (@3TrAmvL026aJRar) February 25, 2022
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