OPINIÃO: Lula esquece, o País lembra

 


A história do PT produziu muitos fatos que jogam contra o partido e seus candidatos. Em toda eleição, há muita coisa a esconder e a tergiversar. Mas seria empequenecer a trajetória petista pensar que, na categoria de temas a serem evitados, estariam “apenas” os escândalos de corrupção do mensalão e do petrolão. Há também aparelhamento do Estado, apoio entusiasmado a ditaduras e governos que violam direitos humanos, tolerância a corporativismos e privilégios, confusão entre o público e o privado, sabotagem de políticas públicas responsáveis (apenas porque outros as propuseram), negligência com malfeitos internos do partido, campanhas de difamação contra adversários políticos, abundante difusão de desinformação e várias outras práticas que contrariam o discurso original da legenda, em defesa da ética e da renovação da política.

Trata-se de um longo passivo, que não surgiu agora e não está apenas relacionado à Lava Jato. Mas há um item, em toda essa longa lista, que se sobressai. É um assunto que Luiz Inácio Lula da Silva tem especial dificuldade de lidar. O líder petista pode até falar do apartamento triplex no Guarujá ou do sítio de Atibaia – temas naturalmente desconfortáveis, que escancararam ao País o modo como o ex-sindicalista, que sempre bradou contra os patrões, lida de fato com os empreiteiros camaradas –, mas não faz ideia de como abordar este assunto: Dilma Rousseff e seu trevoso governo.

É um tema difícil, tanto pela evidência do desastre que foi o período de Dilma Rousseff no Palácio do Planalto como pela responsabilidade direta de Lula no caso. O líder petista decidiu que Dilma Rousseff seria a candidata do PT à Presidência da República em 2010. Afinal, esta é a divisão de tarefas na legenda que se diz democrática: Lula decide, os outros obedecem. Segundo palavras do próprio Lula, a relação entre os dois é de criador e criatura.

O líder petista pode não ter nenhum interesse em lembrar, mas ainda estão frescos na memória do País os resultados produzidos pela criatura lulista: recessão econômica, crise social, inflação, desemprego, desorganização da economia, manipulação de preços e irresponsabilidade fiscal, que incluiu, entre outras manobras, as famosas “pedaladas”. Tudo isso não se deu ao acaso. Foi obra do voluntarismo de Dilma Rousseff, mas foi muito mais do que simples equívoco individual. Sem nenhum exagero, o governo de Dilma foi a gestão dos sonhos dos petistas, com a aplicação – sem freios, sem limites e sem diálogo – de todas as teorias, ultrapassadas e equivocadas, que o PT sempre defendeu e, pasmem, ainda defende.

O resultado ficou evidente para o País. Tão presente nas eleições de 2018, o sentimento antipetista não foi mera consequência de decisões da Justiça Federal de Curitiba. O problema foi muito mais profundo. Com Dilma Rousseff, a população experimentou o que é um governo com o PT pondo em prática suas teses e ideias. Pouquíssima gente quer isso de volta e, por saber bem a dimensão dessa rejeição, Lula deseja de todas as formas esconder Dilma Rousseff e seu governo.

A quem queira diminuir ou relativizar a ojeriza do eleitorado com a gestão de Dilma no Palácio do Planalto, basta lembrar o resultado das eleições de 2018 para o Senado em Minas Gerais. Mesmo com toda a militância do PT dizendo que Dilma Rousseff tinha sofrido um golpe – assim os petistas qualificam atos constitucionais do Congresso, quando não lhes agradam – e com a legenda investindo muitos recursos financeiros na campanha, a ex-presidente obteve dos mineiros um humilhante quarto lugar. Portanto, Dilma é um óbvio fardo eleitoral, mesmo para um veterano prestidigitador como Lula.

Questionado nessa semana sobre o papel de Dilma em um eventual novo governo do PT, Lula não teve dó de sua criatura, atribuindo-lhe a mais cabal irrelevância. “O tempo passou. Tem muita gente nova no pedaço”, disse, em entrevista à Rádio CBN Vale. Se o tempo passou para Dilma, passou também para Lula. O País precisa de gente com outra estatura moral, que não tenha de esconder seu passado nem suas criaturas.

Texto publicado originalmente pelo  O Estadão

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