Da Redação
Prof. Taciano Medrado
Olá caríssimo(a)s leitore(a)s
Uma
estudante universitária americana solucionou, em menos de uma semana, um enigma
matemático que ficou sem resposta por meio século. Após deparar-se com o
problema em um seminário, Lisa Piccirillo usou seu tempo livre para decifrar o
chamado "nó de Conway", proposto pelo inglês John Horton Conway.
Em 2018,
Lisa estava cursando doutorado na Universidade do Texas, nos Estados Unidos. Ao
conversar com o professor de matemática Cameron Gordon, ela comentou o que
havia descoberto alguns dias antes.
"Ele começou a gritar: 'Por que você
não está mais animada?'", lembra ela ao site de notícias científicas
Quanta ."Ele ficou louco", acrescenta.
Assim como Gordon lhe adiantou
naquele dia, a solução acabou sendo publicada em março pela prestigiada revista
"Annals of Mathematics".
"O problema do nó de Conway ficou sem
solução durante muito tempo e muitos matemáticos brilhantes se debruçaram sobre
ele sem conseguir resolvê-lo", diz o matemático Javier Aramayona,
pesquisador da Universidade Autônoma de Madri (UAM) e membro do Instituto de
Ciências Matemáticas (ICMAT) da Espanha.
O mais importante, segundo ele, foi
que Lisa conseguiu que "o resultado fosse publicado em uma das melhores
revistas de matemática e contribuiu significativamente para que ela
conquistasse uma posição permanente no MIT pouco mais de um ano após a
graduação".
O que é um nó matemático?
Para explicar o nó de Conway é
necessário entender em que consiste a topologia, o ramo da matemática em que
ele está enquadrado.
"A topologia está interessada nas propriedades que
persistem após deformar continuamente objetos geométricos (por exemplo,
torcê-los ou esticá-los), mas sem quebrá-los", explica Aramayona,
especialista nessa área. "Embora, do ponto de vista da geometria, um
quadrado seja muito diferente de uma circunferência, do ponto de vista da
topologia, ambos os objetos são indistinguíveis. De fato, podemos ver
facilmente como deformar um no outro se os imaginarmos feitos de argila de
modelagem" – Javier Aramayona, matemático.
Dentro da topologia está a
chamada teoria do nó, onde o objeto de estudo, o nó, tem certas semelhanças com
a vida real. "A ideia intuitiva que precisamos ter é imaginar uma corda
que amarramos e da qual colamos as pontas", explica a matemática
Marithania Silvero, do Instituto de Matemática da Universidade de Sevilha, Espanha,
à BBC News Mundo, o serviço de notícias em espanhol da BBC. "E o que
estuda a teoria dos nós? As deformações que podemos fazer nessa corda. Ou seja,
vemos como podemos torcer essa corda, envergá-la, esticá-la, comprimi-la... O
que não podemos fazer é cortar a corda. Isso é proibido", acrescenta.
O nó
mais simples, o trivial, seria como uma corda com as pontas presas juntas e
nenhum cruzamento. "Mas podemos imaginar nós com tantos cruzamentos e tão
complicados quanto quisermos", diz Aramayona, da UAM. "Qualquer tabela
de nós marítimos está cheia de exemplos de nós muito complicados",
acrescenta ele.
O
problema do nó de Conway.
Parte da fama do nó de Conway se deve ao próprio
autor, John Horton Conway. Morto em 19 de abril deste ano por covid-19, esse
matemático prolífico, influente e carismático, que trabalhou em universidades
prestigiadas como Cambridge (Reino Unido) e Princeton (Estados Unidos), era
"o egomaníaco mais amado do mundo", segundo seu biógrafo, Siobhan
Roberts.
"Arquimedes, Mick Jagger, Salvador Dalí e Richard Feynman em uma
pessoa", escreveu ele. Em 1970, Conway propôs um nó com 11 cruzamentos e,
desde então, os matemáticos tentaram, sem sucesso, responder se era possível ou
não fatiá-lo. Entretanto, ser fatiável não tem a ver com a possibilidade de
cortar o nó ao meio, mas sim com suas "fatias" distribuídas pelas
quatro dimensões do nosso mundo - na topologia, o tempo é considerado esta
quarta parte do universo.
"Nós matemáticos, quando temos que classificar
nós, estudamos diferentes propriedades que os nós têm. Uma dessas propriedades
é ser ou não ser fatia (slice)" – Marithania Silvero, matemática
O
pesquisador especializado em teoria dos nós reconhece que essa propriedade é
difícil de explicar sem recorrer a detalhes técnicos, porque abrange o espaço
de quarta dimensão (4D). "Por exemplo, uma esfera bidimensional é a borda
de uma bola tridimensional", diz ele.
"Da mesma forma", continua
ele, "se subirmos mais uma dimensão, podemos imaginar que um espaço
tridimensional seria a borda de um espaço quadridimensional". "Então,
dizemos que um nó é um slice se preenche a propriedade de ser a borda de um
disco quando o vemos dentro de um espaço de quatro dimensões".
Nesse
sentido, a importância do problema do nó de Conway assume outra perspectiva.
"Existem 2.978 nós com menos de 13 cruzamentos e havia 2.977 dos quais se
sabia se eram slices ou não", diz Silvero. "Qual era o único que não
se sabia? Bem, o nó de Conway." .
A resposta à famosa pergunta, conforme
explicado no título do artigo de Lisa na revista Annals of Mathematics, não
deixa margem para dúvidas: "O nó de Conway não é um slice".
Método engenhoso
Para encontrar a solução para esse problema antigo, Piccirillo substituiu o nó
de Conway por outro que ela inventou, no qual a propriedade slice era mais
fácil de estudar.
Esse outro nó "de sua invenção", diz Aramayona,
"tem a propriedade de ser cortado se e somente se o nó de Conway o
for" . Depois, ela usou uma série de técnicas que acabaram provando que
seu nó não era um slice e, portanto, não era o de Conway.
"Com o
resultado, encerramos a classificação dos nós com menos de 13 cruzamentos quanto
a serem slice ou não" – Marithania Silvero, matemática.
E acrescenta que a
engenhosidade da abordagem americana era "combinar a ideia de ela
construir um nó com o uso de técnicas que já existiam na teoria dos nós".
Parece simples, mas inventar esses nós relacionados é complicado. Embora não
tenha sido para Lisa. "Não me foi permitido trabalhar no problema durante
o dia, porque não considerava que era matemática de verdade. Pensei nisso como
lição de casa", disse ela à revista Quanta . "É algo que, digamos, é
familiar para mim", disse ela. "Então, fui para casa e fiz
isso", acrescentou.
Com informações da BBC
Para ler outras matérias acesse, www: professortacianomedrado.com
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